Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

Os impostos de Bolsonaro e do PT

Será impossível baixar imposto nos próximos anos; resta saber quem pagará a conta

As ideias do economista-chefe de Jair Bolsonaro (PSL) sobre impostos recolocaram o assunto na roda da eleição, de modo estrepitoso.

Dada a ruína do governo, será um debate inevitável e conflituoso logo depois de fechadas as urnas. A não ser em planos de governo suicidas, será impossível baixar a carga tributária nos próximos 
quatro anos.

Mesmo que o governante desconverse e diga que “não vai aumentar impostos”, alguma receita tributária extra será necessária. De outro modo, a dívida pública vai continuar a crescer sem limite, até a estratosfera sufocante.

O aumento deve vir, a princípio, do cancelamento de isenções (reduções em tese temporárias ou especiais de impostos). Pelo menos, essa será a primeira tentativa de qualquer governo prudente.

Paulo Guedes, o economista de Bolsonaro, fez barulho em particular porque mencionou a possibilidade de que se volte a cobrar a CPMF. “Pop” por ser tão conhecida quanto impopular, a CPMF é o recolhimento de parcela de qualquer movimentação financeira. Mas há outras engenharias ou conversas moles em curso.
Como os candidatos não expuseram com clareza o que pretendem fazer, ainda não é possível discutir custos, benefícios e a racionalidade de cada programa. Mas seguem dicas elementares para dar uma pensada no assunto.

1) O governo federal terá um déficit primário de uns R$ 150 bilhões neste ano, o equivalente a uns 2,2% do PIB. Dada a receita, é o dinheiro que falta para cobrir despesas como aposentadorias, Bolsa Família, saúde, obra, material de escritório, água, luz, o que seja. É o que falta mesmo sem contar a despesa com juros, que anda pela casa de 4,9% do PIB ao ano;

2) Como não tem dinheiro de imposto para cobrir o rombo, o governo faz dívida, pega empréstimos “no mercado”, pagando quase 10% de juros ao ano (para empréstimos até 2021, por exemplo). Assim, a dívida cresce sem parar. É como entrar no cheque especial: é mortífero;

3) Em tese, a CPMF poderia dar um jeito em parte do buraco. Quando era cobrada com a alíquota gorda de 0,38%, nos anos de 2002 a 2007, rendia 1,35% do PIB ao ano. Em termos de dinheiro de hoje, daria uns R$ 91 bilhões por ano. Mesmo assim, não dá nem para cobrir o déficit primário, que dirá o gasto com juros. De qualquer modo, a CPMF é um imposto de péssima técnica econômica e socialmente iníquo;

4) É fácil perceber, então, o tamanho do buraco. Ideias de reduzir a carga tributária são ruinosas. Circulou no PT a ideia de isentar de Imposto de Renda o cidadão que ganha até cinco salários mínimos. O governo então teria de encontrar umas três ou quatro dezenas de bilhões de reais em outra fonte de renda;

5) Embora seja possível repensar quem paga a conta do déficit, “mais ricos pagam mais”, estamos em situação em que quase ninguém pode pagar menos. Isto é, seria preciso aumentar impostos, mas evitando que eles recaiam sobre os menos afortunados, tributando dividendos, por exemplo;

6) Dá para cortar despesa? Sim, alguma. A que mais cresce é a da Previdência, mais de R$ 30 bilhões ao ano;

7) O resultado de mexidas em impostos é um tanto imprevisível. Quanto maior a mexida, maior o risco de causar bagunça na economia e não se arrecadar o necessário, o que seria dramático no Brasil destes tempos. Até o xerife cruel do Robin Hood não conseguia levar todas as moedas que o rei queria. Mas o mundo é muitíssimo mais complicado do que filme da Sessão da Tarde.
 

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