Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu Previdência Governo Bolsonaro

Chuva de verão, seca de inteligência

Passou o sururu, diz presidente, mas problema da coalizão política continua na mesma

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A turumbamba do governo com o Congresso passou, como chuva de verão, afirmou Jair Bolsonaro.

Depois do verão vem a estiagem. Na seca, um tempo crônico de vacas magras e de ministérios mais gordos na mão de militares, o que o presidente pode ou quer oferecer aos parlamentares?

Depois do sururu, o problema continua quase do mesmo tamanho. Trata-se de dividir poder, cargos e verbas; de impedir que as falanges bolsonaristas avacalhem parlamentares nas redes insociáveis.

Bolsonaro poderia aparecer com uma reforma ministerial e partilhar pedaços do governo, mas:

1) não quer, por enquanto, ao menos;

2) não pode fazê-lo, sem mais, sem desmoralização, pois a rejeição do que chama de "toma lá dá cá" é uma questão de honra para o núcleo puro do bolsonarismo;

3) ainda que conhecesse as artes de como fazer tal reforma, agora faltam-lhe meios. Entregou parte do ministério a militares. O que sobra é pouco, dada a fragmentação ainda maior do Congresso, partidos demais para uma dança de poucas cadeiras;

4) caso aproveitasse essa reforma para dar jeito em ministérios como Educação, Casa Civil, ou Turismo, teria de dividi-los entre condomínios de partidos e, de resto, colocar lá alguém de confiança. Entregar ministério de porteira fechada é de fato um risco letal. Difícil.

Em que termos vai se dar então a "nova articulação política" do governo? Dinheiro não haverá. A receita federal está perto da estagnação, despesas crescem de modo vegetativo. O investimento em obras será ainda mais talhado. Em breve, vamos ouvir queixas da construção civil, a infraestrutura vai ruir aos poucos, universidades e hospitais irão à míngua.

Ficar em bons termos com Rodrigo Maia, presidente da Câmara, ajuda. Isto é, dar-lhe salvo-conduto, proteção contra as falanges virtuais e poder de negociação em nome do governo: apoio para o serviço de premiê improvisado que Maia desde o início ofereceu.

Bolsonaro vai controlar seu núcleo puro, as falanges virtuais, seus filhos e assessores fundamentalistas?

Semana sim, semana não, a depender do tamanho do estrago e da pressão dos conselheiros militares, a turma volta para a casinha, para logo fugir de lá. O problema essencial, na verdade, é que Bolsonaro mesmo mora nessa casinha mal-assombrada.

Em termos materiais, o governo tem à disposição centenas de postos para distribuir ao parlamentariado. Difícil saber se essa solução de varejo vai satisfazer necessidades e ambições de pelo menos meia dúzia de líderes partidários com poder de fazer estrago.

Vários de seus liderados podem levar superintendências ou delegacias regionais disso ou daquilo, mas a soma dessas partes pode não dar em um todo articulado, votos de um partido.

Fazer "articulação política" apenas no puro varejão é uma experiência nova tocada por essa gente que até agora não demonstra capacidade alguma de coordenar governo.

Outro modo de organizar a massa é dar poder à "velha política", parlamentares mais capazes e experientes. Há gente no MDB, no PSDB e no DEM etc. disposta a prestar o serviço. Alguns já o fazem, em tempo parcial ou com emprego intermitente, como na reforma trabalhista.

Para que funcione, precisariam assumir posições de comando, de fato, dentro do Planalto. Seria preciso combinar com o general Santos Cruz e dar um chega para lá em Onyx Lorenzoni. Não foi possível apurar se o governo ao menos entende esse problema, quanto mais se quer resolvê-lo.

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