Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

Napoleões de hospício ameaçam Brasil da crise política e da depressão econômica

Descrédito de procuradores aumenta crise institucional e anima autoritarismos

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Um procurador-geral fantasia ou planeja o assassinato de um ministro do Supremo e considera cabível contar esse desvario ao público. Procuradores com altas responsabilidades fazem troça da morte de uma criança, neta do investigado-mor da República, Lula da Silva, entre outras vulgaridades teratológicas ou cruéis.

Os conluios e a politização da Lava Jato decerto causaram mais dano institucional. Mas arrivismos dinheiristas, piadas funéreas e delírios homicidas de procuradores dão o que pensar. De que gente é feito o Ministério Público?

A revelação do descalabro, seja moral, jurídico ou político, de qualquer modo contribui para a operação de revanche contra a Lava Jato. O movimento combina a reação de interesses corporativistas de políticos com a resposta de democratas à manipulação legal ou política de processos judiciais.

Nos tribunais ou no Congresso, o partido da Lava Jato sofre derrotas. A reação às extravagâncias desse movimento político-judicial, porém, não são sinal de restauração das funções do sistema político ou dos Poderes.

 

Por bem e por mal, a política da República de 1988 passou por um desmonte que se deveu, enfim e na prática, à Lava Jato. O acuamento do partido dos procuradores e do sistema de investigação em controle em geral não significa que o sistema está em obra de reconstrução. A Procuradoria é que entra no programa geral de demolição.

É um cenário favorável às piores tentações do bolsonarismo. O presidente e seu movimento têm as tintas de um cesarismo alucinado, para ser mais preciso de um bonapartismo, que não raro floresce nas paisagens com ruínas do descrédito de sistemas políticos.

O presidencialismo tende a favorecer lideranças carismáticas. Sistemas deslegitimados ou em “crises de representação” favorecem bonapartismos, uma versão autoritária do fenômeno. Há desprezo pelo Parlamento e por instituições independentes: servidores de Estado, órgãos de controle do governo ou aliados com ideias divergentes. Há um apreço pelo governo por decreto e louvação da política plebiscitária (isso ou aquilo, “nós, salvadores da pátria” contra “eles”). Exige-se adesão servil e bajulação do círculo próximo do poder.

Parece uma descrição do que é hoje o governo tentativo do país. Isto é, tentativo no sentido de que se trata ainda de um projeto, que tanto mais sucesso terá quanto maior o descrédito institucional, que por sua vez dá impulso à ideia de “revolução” bolsonarista: “quebrar o sistema”.

Para quê? Para a restauração mítica de um ideal que seria o do golpe de 1964, talvez, tradição, família e propriedade, o fim dessa velha ordem depravada e “socialista”, que daria lugar a um reino de fantasia reacionária.

Bolsonaro surfou em ondas anticorrupção e de reforma liberal. Mas ele mesmo jamais comandou movimento algum ou se identificou a esses programas. Jamais foi ligado a grupos sociais organizados, a grupos e quadros que pensassem o país, a grupos políticos.

O país passa mesmo por alguma espécie de revolução ou de reviravolta nas estranhas, um nó nas tripas que inclui a quase morte política da República de 1988, a depressão econômica e a mudança de relações socioeconômicas fundamentais (Previdência, trabalho, lugar do Estado etc.). Bolsonaro não parece se preocupar com a substância de nenhum desses problemas, mas com o desmonte da velha ordem, que quer acelerar com a criação do seu partido da Nova Era.

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