Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Mourão quer Brasil dentro da cerca do atraso eterno dos grileiros de Bolsonaro

Empresários criticam ruína ambiental; vice-presidente ignora mudança mundial

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O Brasil está com o filme queimado também porque bota fogo na Amazônia, o que causa repulsa a alguns financistas e pode provocar boicotes aos produtos de exportação brasileiros, diz o chavão sobre o vexame do país. É muito pior do que isso, porém.

A catástrofe da pandemia deve acelerar mudanças tecnológicas, investimento na reconstrução “verde” das economias e exigências de padrões sociais mínimos. Há indícios de tal evolução na Europa, na China e deve ser o caso dos EUA, se acordarem do pesadelo Trump.

O Brasil está em autodestruição acelerada faz sete anos. Dificilmente se cura até 2022. As mudanças no mundo rico podem tornar o país tão obsoleto quanto a vela e o cavalo depois da luz elétrica e do motor a explosão.

Empresários e banqueiros civilizados notaram o tamanho do problema, embora se limitem a enviar ao governo cartas diplomáticas de protesto, “notas de repúdio” mais aguadas do que as emitidas pelas “instituições” (Congresso e Supremo) contra ameaças golpistas de Jair Bolsonaro e de generais do Exército.

Na semana passada, escreveram a Hamilton Mourão para pedir, grosso modo, que se dê um basta à destruição da Amazônia e à ruína da reputação brasileira; para sugerir investimentos e planos de reconstrução da economia baseados em princípios ambientais.

Por ora, a resposta do vice-presidente foi dizer, em uma entrevista, que o governo do seu capitão não destruiu nada e que existe uma conspiração internacional dos “incomodados” para impedir que o Brasil cumpra seu “destino manifesto” de ser “a maior potência agrícola do mundo”, para o que tem “potencial extraordinário” por causa do “nosso povo”, “água, luz, terra fértil, espaço para avançar”.

Antes de mais nada, é besteira dizer que a agropecuária eficiente é “destino”. Certas vantagens naturais do país foram aproveitadas graças a pesquisa, investimento e crédito subsidiados pelo Estado. Mas passemos.

O que Mourão disse é: 1) Geopolítica de general de pijama no uísque depois da peteca na praia, velha e bisonha já nos anos 1980; 2) Ufanismo de liberal gagá já nos anos 1930; 3) Ignorância do que se passa no mundo.

A União Europeia, por exemplo, elabora dois planos de reconstrução, por causa da pandemia e do “green deal”. Envolvem avanço tecnológico, “produção leve” (menos indústria pesada), descarbonização até 2050, economia digital e “bons empregos”. Esse programa de desenvolvimento social e econômico pretende no fundo evitar que o povo se bandeie de vez para partidos extremistas e promover investimentos, moribundos no continente. O Estado deve redirecionar o desenvolvimento europeu, mais por precisão do que por boniteza.

Isso altera consumo, produção e relações econômicas internacionais. Deve restringir negócios com países “fora dos padrões” socioambientais, tecnologicamente primitivos ou francamente bárbaros como o Brasil e também diminuir a demanda de seus produtos (combustível fóssil, ferro e carne, digamos).

O “Relatório Mundial da Riqueza” de 2020 da consultoria Capgemini indica que os donos do dinheiro grosso (mais de US$ 30 milhões para investir) querem colocar quase metade de seus investimentos em “ESG” (negócios orientados por preocupações ambientais, sociais e governança “correta”). Parte é douração de pílula; parte não é.

Para mudar esse governo de grileiros da Amazônia, da educação, da ciência etc., empresários teriam de descer da cerca e mandar mais que cartas a Mourão. É questão de sobrevivência.

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