Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Sem ainda poder dar o golpe, um Bolsonaro acuado recua para recuperar forças

Sabemos pouco do que se passa no bunker do presidente, como ficou outra vez evidente

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Ouviu-se muita conversa sobre golpe nestes dias. O temor é compreensível, até porque sabemos pouco do que se passa no bunker de Jair Bolsonaro, como ficou outra vez evidente nesta semana.

De mais certo é que há golpeamentos desde o início deste governo e outra vez agora. Tanto que mesmo Fernando Azevedo e Silva, ex-ministro da Defesa, e os comandantes das Forças Armadas puseram um limite à arregimentação bolsonarista da tropa para campanhas de intimidação e à sua tentativa de obter apoio para alguma intervenção ilegal.

Ainda assim, essa operação bolsonariana tem mais de contra-ataque ou manobra diversionista do que de ofensiva. Claro que Bolsonaro mostra os dentes, periodicamente. Se a ameaça golpista colar, colou. Se há reação, diz que a mídia inventou tudo e vai em seguida posar para a foto com os Poderes, “em harmonia”. O essencial da operação, porém, parece outra coisa.

Bolsonaro atira a fim de cobrir uma operação de retirada, de recuo, de reorganização de tropas para conflitos mais adiante.

Acossado pelo país e pelo Congresso, Bolsonaro nomeou dois amortecedores para a Saúde e para o Itamaraty. Os novos ministros não devem ter autonomia para reparar a ruína, mas não devem ser tão brucutus, ineptos e lunáticos quanto seus antecessores. Recuo número um.

Acossado pelo centrão, nomeou para a Secretaria de Governo (Segov) uma representante de Arthur Lira, presidente da Câmara, e do consórcio PP-PL. A Segov administra cargos, emendas, abertura de créditos suplementares e outros azeites do poder. Na Casa Civil, colocou um general, Luiz Ramos, maleado pela relação com parlamentares. Recuo dois: mais centrão no Planalto.

Nesse chilique com os militares, de quem quer subordinação criminosa, Bolsonaro acabou levando chumbo de volta. Por ora, recuo três. Braga Netto assumiu a Defesa dizendo lá que quer “continuidade” e paz.

Na Justiça, de fato Bolsonaro colocou um delegado da Polícia Federal amigo dos filhos governantes; lá quer manter seu “sistema de informações”. Mas gente da PF difundiu o rumor de que não quer intervenções que dirijam ações policiais contra inimigos do governo. Na Advocacia-Geral da União, o presidente recolocou um colaboracionista de suas ações “legais” contra inimigos.

Tanto pelas sabotagens de Bolsonaro quanto pela desordem inepta do ministério, o centrão faz o que quer na economia, como a aprovação desse Orçamento escalafobético, obra de líderes governistas. Vai haver algum acordo. Caso não se dê jeito nessa besteirada grossa, pode haver paralisia do governo ou rolo legal sério, no limite no STF, o que ameaça o arranjo centrão-Bolsonaro.

Bolsonaro faz fogo para proteger seu recuo. Até um projeto de Mobilização Nacional seus aliados mais grotescos tentaram aprovar no Congresso. Em suma, trata-se da emenda de uma lei, de incluir epidemias entre os motivos de um tipo de governo de exceção, uma espécie de estado de defesa com calamidade. Barraram na última hora.

Não se sabe o que será do novo comando militar, é verdade. A incerteza é preocupante porque, embora se digam “institucionalistas”, algo acontece com os generais-de-Exército, pois numerosos deles se tornam bolsonaristas quando deixam o Alto Comando. O que se passa? No brinde da despedida, tomam uísque envenenado com sulfato de bolsonariol? É dispensável lembrar a politização explícita desde 2018, quando Villas Boas formalizou a recriação do partido militar.

Mais preocupante é o que Bolsonaro pode aprontar no próximo golpeamento ou quando se sentir acuado de novo. Insuflar motins policiais ou de jovens oficiais do Exército? Versões renovadas de Aragarças, Jacareacanga, Riocentro? Uma invasão do Capitólio?​​

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