Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Menos gente na UTI, mais corpos no cemitério e a farsa do comitê de Bolsonaro

Há menos internados, mas Covid está mais letal, assim como o governo e cúmplices

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Em São Paulo, no estado e na cidade, o número de internados em UTIs de Covid praticamente parou de aumentar. Ficou estável no pico do horror, por ora. Mas o monte de cadáveres ainda não tem limite. A doença agora parece muito mais letal, cresce sem parar no país quase inteiro. Com tamanha disseminação do vírus, a próxima onda talvez seja a de criação de variantes que vençam as vacinas que existem, mas nem chegam ao país em número bastante. Seria a epidemia sem fim.

Enquanto isso, o que foi feito do “pacto”, do “comitê nacional” contra a Covid, a farsa funérea encomendada por Jair Bolsonaro a fim de desviar a atenção de seus crimes? O capitão da extrema direita continua a fazer campanha contra medidas de controle da doença, desde o dia do “pacto”.

O novo ministro da Justiça tomou posse fazendo uma saudação à bandeira da morte bolsonarista. Disse que “neste momento, a força da segurança pública tem que se fazer presente garantindo a todos um ir e vir sereno e pacífico” e “precisamos trazer de volta a economia deste país, precisa colocar as pessoas para trabalhar".

Nesta terça-feira (6), a Câmara passou o dia discutindo o projeto fura-fila dos empresários bolsonaristas, que pretendem comprar vacinas para suas empresas, alguns querendo que o governo pague por isso, por meio de desconto de impostos.

Cadê um conselho nacional de especialistas variados que elaborassem uma estratégia nacional de combate à epidemia? Cadê o acordo nacional de cooperação federativa para lidar com o vírus (União, estados, municípios)?

Não tem. Era tudo farsa. O comando do Congresso é cúmplice.

No salve-se quem puder, se multiplicam as medidas judiciais de associações profissionais, de empresas, de sindicatos etc. com o objetivo de comprar vacinas para si, o que desorganiza o plano nacional de prioridades (aliás, já avacalhado) ou um método qualquer de usar a vacina escassa do modo mais eficaz.

Ainda mais escandaloso, a insinuação de que empresas possam comprar e trazer vacinas em menos de um mês mostra que o governo é ainda mais inepto e criminoso do que já sabemos ou também que empresários querem passar a perna no público. Se sabem onde arrumar vacinas, por que não contam?

Como não há governo, não pode haver confiança em governança da epidemia ou em qualquer outra política. O país não terá Censo, o que desorganiza o sistema de estatísticas e planejamento. O país não tem Orçamento. Essa coisa que foi aprovada com esse nome, “Orçamento”, é um arranjo mutante entre centrão e governo, instrumento para facilitar a reeleição de parlamentares e presidente, com uma cláusula implícita de que Bolsonaro não será processado por mais um crime de responsabilidade, agora fiscal.

A epidemia parece mais mortífera, para voltar ao assunto principal. A desaceleração do número de internações em UTI pode ainda ser uma esperança de que, a seguir, o morticínio também perca velocidade. Ainda não foi o que se viu, como no caso de São Paulo. Ao contrário. A desaceleração nas UTIs é uma tendência desde o 21 de março. Mas o número de mortes em relação ao total de internados em terapia intensiva é, desde a semana final de março, o maior em toda a epidemia, em alguns dias o dobro da média que se viu até fevereiro deste ano. O vírus parece matar mais, mas nem sabemos bem o motivo.

Bolsonaro trata de se imunizar. Faz o acordo com o centrão, agora tenta refazer pontes com empresários —vai tentar jantá-los nesta quarta-feira, quando ouvirá de alguns o lobby pela vacinação privada. “Um país normal”.

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