Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu petrobras

Entenda as mentiras de Bolsonaro sobre o preço do botijão de gás

Presidente promete cortar valor pela metade usando dados falsos e medidas impossíveis

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Jair Bolsonaro disse que o preço do botijão de gás vai cair pela metade, “pode ter certeza, se Deus quiser”.

Se Deus quiser baixar o dólar para R$ 2,70, pode ser. Mas Deus também teria de garantir que o preço do gás no Golfo do México parasse de aumentar.

Se o “Mito” subsidiar o gás de cozinha, também dá, mas só para os muito pobres. Com uns R$ 8 bilhões por ano dá para cortar pela metade o preço do botijão de 13 kg para uns 15 milhões de famílias que recebem Bolsa Família, se essas casas consumirem um botijão por mês. O governo de Bolsonaro poderia tentar arrumar esse dinheiro, que por ora não tem, mas não sabe trabalhar e nem está muito interessado.

Essa conversa é maluca, pois é um diálogo com Bolsonaro, um mentiroso dos mais perversos e ignorantes. Mais uma vez, isso que por convenção se chama de presidente da República atribuiu o preço alto do gás ao imposto estadual, ao ICMS. Mentira.

O peso do ICMS no preço final médio do GLP flutua em torno de 13,7% desde 2016, quando a Petrobras começou a mudar sua política de preços em geral. Desde que mudou a política de reajuste do preço do gás de cozinha, o peso do ICMS anda em torno de 14,1%. Foi em agosto de 2019 que a petroleira passou a adotar o preço internacional, grosso modo, também para o GLP. Na política do final do governo de Michel Temer, calculava-se o preço por meio de médias de 12 meses, com reajustes trimestrais.

Durante o governo Bolsonaro, a parte da Petrobras no preço final do gás passou de 36,4% para 50,9%. Em parte menor, a fatia da petroleira ou possíveis importadores aumentou porque a margem bruta das empresas distribuidoras curiosamente caiu, em termos absolutos e relativos; em parte ínfima, porque foram zerados impostos federais. “Margem bruta” é o que fica com as distribuidoras, não é “lucro” (pois as firmas têm custos). As distribuidoras vendem o gás para as empresas que fazem o botijão chegar ao consumidor final (a “revenda”).

Logo, se Bolsonaro desse cabo do imposto estadual, o preço até cairia, de uns R$ 93, na média nacional, para uns R$ 80 (também na média). Mas ele não pode talhar o ICMS, nem o Congresso pode; os estados não vão abrir mão do dinheiro, sem mais. Para o preço “cair pela metade”, teria de exigir também que as empresas de distribuição e revenda trabalhassem de graça. Em suma, essa conversa toda é mais uma patranha imbecil de Bolsonaro.

Depois de quase três anos de mandato, “técnicos” de seu governo tentam reinventar um fundo de compensação das variações excessivas de preço, talvez por meio de um imposto ou algo que o valha. Funciona assim: se o preço do combustível sobe, o governo diminui esse imposto regulatório; se cai, o governo aumenta o imposto, recolocando o dinheiro no caixa (o mecanismo vale para qualquer tipo de fundo).

É fácil perceber que esse arranjo evita variações de preços apenas dentro de certos limites. Não muda seu patamar. A fim de mudar o preço, é preciso tirar dinheiro de uns e dar a outros: algum subsídio, via dinheiro da receita de impostos, ou tirando dinheiro da Petrobras, o que dá besteira.

Além do mais, como o mecanismo de compensação não existe, o governo teria de arrumar uns bilhões apenas para baixar um pouquinho preço do GLP. De onde vai sair o dinheiro? Seria uma solução ruim, de resto, porque baratearia também o consumo dos mais ricos. Melhor dar subsídio dirigido a pobres. Melhor que subsídio, porém, é aumentar a transferência de renda, o que Bolsonaro também não consegue fazer —não ligou para o assunto, aliás, até sua popularidade cair.

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