Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire
Descrição de chapéu petrobras

Na pior crise do petróleo desde 2008, Petrobras segura reajuste

Com alta do mercado de petróleo, decisão influencia na inflação e tem efeito político

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Faz 50 dias que a Petrobras não aumenta o preço de gasolina e diesel. Nesse tempo, o barril de petróleo do tipo Brent ficou 36,8% mais caro. Em reais, em uma conta de guardanapo, o barril encareceu 26,4%, pois o real se valorizou e não voltou a levar tombo maior mesmo com a guerra.

Não é assim que petroleira faz contas para definir o preço de acordo com a paridade internacional (que depende do custo de gasolina e diesel nos mercados produtores relevantes para o Brasil etc.). Mas dá para ter uma ideia do problema, se a estatal estiver mesmo decidida a manter sua política de preços.

Está? A decisão vai influenciar a inflação, talvez o tamanho da alta de juros que ainda está por vir e tem efeito político, é óbvio. O assunto se torna ainda mais enrolado quando se nota que os preços de trigo, milho, soja e carnes também vão subir um tanto mais também por causa da guerra na Ucrânia.

FILE PHOTO: A worker paints a tank of Brazil's state-run Petrobras oil company in Brasilia, Brazil September 30, 2015. REUTERS/Ueslei Marcelino/File Photo ORG XMIT: FW1 - Reuters

Em tese, a Petrobras teria um argumento sensato para não mexer por ora nos seus preços, que é justamente a alteração causada pela guerra e a incerteza a respeito do que vai acontecer. Mas tem problemas práticos e políticos para enrolar muito.

O conflito começou no dia 21 de fevereiro, quando Vladimir Putin anunciou que mandaria "missões de paz" para o leste da Ucrânia. Desde a sexta-feira, 18, o preço do Brent aumentou 22,4%. Até agora, portanto, esse é o custo extra da guerra para o petróleo, que, no entanto, tem variado muito, até para baixo, nestes dias de tumulto e horror. Neste ano, o Brent já ficou 47% mais caro.

A Petrobras pode dizer que o momento é incerto, mas não parece razoável acreditar que tão cedo o barril vá ficar mais barato. A guerra ainda vai durar. Se o conflito armado viesse a ser interrompido, as sanções econômicas contra a Rússia permaneceriam. Mesmo que essas retaliações não abarquem negócios com energia ou comida, as limitações financeiras, legais e administrativas impostas a empresas e bancos da Rússia tiram parte do petróleo russo do mercado.

Não há outros sinais de alívio no horizonte. Estados Unidos e aliados disseram nesta semana que vão liberar a venda de 60 milhões de barris de petróleo de suas reservas estratégicas. Mas isso não dá 10 dias de exportações russas de petróleo. Não é ninharia, decerto, mas não salva o mercado do tumulto.

A OPEP, o cartel do petróleo, aliás aliado ao menos comercial da Rússia, manteve a política de aumentar a exportação em 400 mil barris por dia, a cada mês, 12 milhões por mês, pois (o que está difícil de acontecer, pois vários países estão com dificuldades de produzir mais, em particular na África).

O mercado financeiro do Brasil fez festinha na Quarta-feira de Cinzas da guerra, pois ainda entra dinheiro de fora na Bolsa e as commodities brasileiras estão em alta. Além do mais, mesmo nos EUA a tormenta em Bolsas e juros esteve contida —a guerra vai levar os bancos centrais dos EUA e da União Europeia a elevar a taxa básica de juros deles em ritmo mais lento.

No entanto, a questão monetária e política de fundo permanece: não há motivos para acreditar em queda mais rápida da inflação tão cedo —ao contrário. A carestia de guerra vai bater diretamente nos preços mais visíveis e dolorosos: comida e combustíveis. A baixa ligeira da eletricidade em abril ou maio não vai servir de refresco, a não ser que Putin diga "desculpaê, foi mal, a guerra acabou". Improvável.

Em resumo, inflação vai ser um assunto que vai ficar mais quente: vai bater na política de preços da Petrobras, vai resultar em mais blablá e ideias daninhas no Congresso, deve afetar uns pontos do prestígio de Jair Bolsonaro.

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