Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Descrição de chapéu juros

Trabalhador a preço de liquidação é problema para Bolsonaro

Inflação e desemprego caem até outubro, mas emprego precário é problema para governismo

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O índice de infelicidade é uma medida muito simplesinha de mal-estar econômico, mas diz alguma coisinha sobre o prestígio dos governantes. É a soma da taxa de inflação com a taxa de desemprego, uma ideia do economista americano Arthur Okun (1928-1980).

Em geral, também a popularidade de presidentes brasileiros varia com esse índice de infelicidade ou sofrimento ("misery index").

O índice de sofrimento econômico começou a cair por volta de março e deve baixar ainda mais. Parece plausível que a popularidade de Jair Bolsonaro (PL) tenha saído do fundo do poço, a partir do início do ano, por causa do aumento do número de pessoas com algum trabalho.

Como qualquer outra explicação simplesinha, o recurso apenas ao índice de sofrimento dá em besteira grande. Mas não convém desprezar as manhas e os efeitos da inflação e do emprego na conversa política.

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Trabalhadores fazem fila para disputar vagas em hotéis e restaurantes em São Paulo - Zanone Fraissat/Folhapress

Apesar de saírem do fundo do poço, a avaliação e a votação de Bolsonaro melhoraram muito pouquinho até agora, mesmo com menos padecimento econômico e com o anúncio do Auxílio Brasil mais gordo. Não quer dizer que inflação menor, mais emprego e o dinheiro dos benefícios na mão não possam levar mais votos para Bolsonaro.

Do ponto de vista da campanha bolsonarista, é suicídio eleitoral esperar para ver, porém. Algo precisam aprontar. A persistência da liderança folgada de Lula da Silva (PT) pode provocar uma debandada de candidatos e aliados. Mais do que perder apoios de políticos, que podem não contar grande coisa no mundo de redes sociais, Bolsonaro pode ver o desaparecimento de outros candidatos a presidente e seus votos, votos que garantam ao menos que sobrevenha um segundo turno.

Antes dos estelionatos eleitorais, previa-se inflação de 10% ao ano até às vésperas do primeiro turno. Agora, prevê-se 8%. A taxa de desemprego e o número de pessoas ocupadas melhoram muito mais rápido. Isso em um ambiente em que a força de trabalho e o nível de ocupação (pessoas em idade de trabalhar que têm emprego) voltaram às médias de 2012 a 2019. A taxa de desemprego no final deste ano pode ser a menor desde 2014.

Mas o nível de preços, ainda mais em coisas básicas como comida, está em patamar horrível. O valor real do salário médio é ainda o menor da década. Pelo menos até 2021, o massacre do trabalho foi muito maior para os 30% mais pobres.

Por onde quer que se olhe, salário médio, dos mais pobres ou por custo unitário do trabalho (salário médio por unidade de produto, em reais ou em dólar), o trabalhador está a preço de liquidação. Talvez, por isso, empresas contratem mais (pode ter havido ainda redução de outros custos do trabalho com a reforma trabalhista).

Nos dois meses até o primeiro turno, há pouco tempo para melhoria extra significativa no emprego e baixa maior na inflação, ainda que o salário agora despiore rapidamente. Em dezembro de 2021, o salário médio real caía a 11% ao ano; em junho, a 5%. A partir de agora, chegam também contas de luz menos salgadas e vai pingar o Auxílio Emergencial. O esfriamento da economia ficou para o final do ano.

Por fim, note-se o óbvio: a campanha para valer, violenta, começa apenas em fins de agosto. Vamos ver ainda o conflito religioso e outras "guerras culturais", a conversa com a massa de eleitores que mal viveu sob Lula, a expectativa do que vai ser o futuro da renda dos pobres, a mentira digital e quem sabe até massa e violência na rua. É quase sempre difícil antecipar o mote final, decisivo, das campanhas.

Este colunista volta no final de agosto para ver esse sururu tétrico. Até lá, férias.

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