Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Rombo das Americanas ainda é incalculável e trabalhador vai pagar a conta

Empresa deve precisar de bem mais do que R$ 15 bilhões de dinheiro de acionistas

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A Americanas talvez tenha algo entre 40 mil e 44 mil funcionários. "Talvez", pois sabe-se lá o que é verdade naqueles documentos todos de prestação de contas. A companhia provavelmente estava no vermelho escuro fazia tempo, não dava resultados, afora para acionistas gordos e executivos. E daí?

Se tivesse tomado rumo faz cinco ou dez anos, quando pode ter começado a mumunha mandraque nos balanços, talvez a empresa pudesse ter a dimensão que tem hoje. Como seus resultados eram um folhetim fantástico, essa Americanas do tamanho de até outro dia era uma ficção.

Com a divulgação do trambique nas contas, com muito menos crédito, se algum, com desconfiança de fornecedores etc., para dizer a coisa de modo ameno, a empresa terá de ser desidratada ou liofilizada.

Entrada de unidade das Lojas Americanas em Brasília - Ueslei Marcelino - 12.jan.23/Reuters

Assim, muita gente vai para a rua, sabe-se lá se com algum direito trabalhista pago. A paulada vai atingir também alguns prestadores de serviços e locatários das lojas. Com estabelecimentos em pelo menos 900 cidades, o colapso da Americanas deve ter impacto em negócios locais, de vizinhança.

Uma parte da conta de assistência aos deserdados pela zorra total (para ser ameno) será bancada pelo dinheiro de impostos, que vai pagar seguro-desemprego. A conta vai bater também em resultado de banco público, em impostos que vão para o vinagre etc.

Se a empresa sobreviver, o massacre de trabalhadores e de gente miúda em geral que dela depende será tanto menor quanto mais dinheiro receber, obviamente dos grandes acionistas restantes, Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles. De quanto dinheiro se trata, enfim?

Nos últimos 15 dias, dizia-se que, segundo bancos credores, o trio de acionistas deveria colocar R$ 15 bilhões do bolso deles na companhia.

Um bancão diz que não é bem assim, basicamente porque não há lá como se calcular direito o tamanho do buraco nem qual a perspectiva que se quer dar a Americanas. A companhia gerava caixa? Por ora, nem isso dá para saber, diz o executivo do banco. O que se sabe sobre a viabilidade da operação, atual ou futura? Quão grande foi a degradação da marca; em quanto tal prejuízo vai afetar a confiança de clientes?

Antes de mais nada, como manter a empresa operando? Isso quer dizer, como obter crédito para comprar mercadorias e ter o que vender? É simples assim. Sem isso, não tem varejista. Que tipo de varejista seria essa, se a transfusão de sangue a mantivesse viva?

Qual poderia ser o tamanho da nova empresa depois de "profunda reestruturação"? Abandonaria lojas físicas? Venderia quais ativos? Quanto crédito (financiamento de suas compras) teria, a médio e longo prazos? A que preço?

Depois de negociado o tamanho do calote (abatimento de dívida), quanto das dívidas poderia vir a ser transformado em participação (ações) na empresa? Quem quereria assumir o risco, com qual administração?

A depender dessas definições e perspectivas (além do nível de condescendência de credores), a empresa pode precisar de R$ 15 bilhões, R$ 20 bilhões ou R$ 25 bilhões de seus acionistas maiores.

Enfim, essa é uma discussão entre teórica e especulativa. Nesta quinta-feira, a Justiça autorizou a apreensão de todos os documentos e comunicações da empresa nos últimos dez anos. Sabe-se lá que tipo de esqueleto, rombo, pedalada, crime ou formação de quadrilha pode aparecer. O show de horrores mal começou.

No mínimo do mínimo, na melhor das hipóteses, a empresa vai ser desidratada: sobrevive diminuída, com muito trabalhador chutado.

No mínimo do mínimo, a Americanas era uma baderna administrada por incapazes (a alternativa é que a companhia era uma baderna administrada por criminosos).

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