Amigo torcedor, amigo secador, é diferente quando você grita "bicha"ou "viado" e quando você comete a injúria racial de berrar "macaco"ou "preto fedido". Será? Existe alguma diferença sim, vamos tentar entender. Sempre lembrando, óbvio, do mantra greco-corintiano de Sócrates: só sei que nada sei.
Só sei que vivemos um momento histórico com estas discussões no futebol. Repare. Como não existe um só jogador assumidamente gay no Brasil, a provocação de "bicha", como se tornou onda contra o Rogério Ceni, por exemplo, é um manifesto que reforça o preconceito e a homofobia no geral, mesmo não atingindo o boleiro. Excesso de correção? Os ativistas do LGBT não acham.
Por não ter um alvo direto em campo, seria apenas mais um dos tantos xingamentos, como o clássico fdp? Insulto que no Nordeste é traduzido para "fi de rapariga", a bela e até poética variação da língua portuguesa.
Os gritos racistas são bem mais cruéis, creio. Cadê a democracia racial? Você está atingindo covardemente, pela cor da pele, quase sempre a maioria dos atletas em campo. Nada simbólico ou filosófico. É porrada direta. Ali, na cara, o sol por testemunha.
Pisa na bola o Rei Pelé quando diz que o goleiro Aranha não deveria ter parado o jogo contra o Grêmio. Como na música de Caetano Veloso, "e Pelé disse love, love, love". Pelé, simplesmente por ser Pelé, é a maior bandeira negra dos esportes. Não é obrigado a ser um combatente Malcolm X, um poeta Solano Trindade ou um Mano Brown da vida, mas é chato que permaneça nessa eterna retranca.
O crime do Olímpico é um momento histórico do futebol brasileiro. O manifesto divulgado pelo Corinthians ontem diz o seguinte: "Pelo fim do grito de bicha' no tiro de meta do goleiro adversário. Porque a homofobia, além de ir contra o princípio de igualdade que está no DNA corinthiano, ainda pode prejudicar o Timão".
Seja obedecido ou não pela fiel, seja você contra ou a favor, é outro grande momento da crônica de costumes deste Brasileirão. Só sei que o Ceni é o mesmo atingido com esse grito, uma vez que não temos, assumidamente, nenhum gay no futebol brasileiro.
O grito leva para o estádio o mesmo eco preconceituoso das ruas, mas o goleiro tricolor, cujo time recebeu a alcunha de bambi dos adversários, jamais teria motivos diretos para protestar e paralisar uma partida.
A não ser que, por uma política de solidariedade, combatesse o retumbante brado homofóbico.
Compreenderam? Também não. Digo, queria fazer apenas um lançamento à moda Gerson, o canhotinha de ouro, para o debate.
Só sei que vivemos um grande momento político de discussões no futebol, apesar de alguns dos principais candidatos à Presidência da República fujam, como o diabo da cruz, de discutir, por exemplo, o casamento gay.
Quem diria, na sua pior fase técnica, o ludopédio tupiniquim encara grandes temas e heranças malditas.
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