Yascha Mounk

Cientista social, é professor associado na Universidade Johns Hopkins e autor de "O Povo contra a Democracia".

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Desta vez, Trump não tem mensagem clara para contar quem ele é

Embora esteja no poder há quatro anos, republicano recorre a 'Make America Great Again' novamente

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A mensagem na qual Donald Trump baseou sua candidatura à Presidência em 2016 foi agressiva e simplista. Mas isso só tornou mais difícil para “liberais do bem”, como eu, compreendermos sua força.

“Make America Great Again” (tornar a América grande outra vez) prometeu um reinício grandioso. Todas as coisas que preocupavam muitos de seus patriotas, da estagnação nos níveis de vida até o influxo acelerado de imigrantes, acabariam em pouco tempo.

E, como outros pagariam por isso –o México custearia o muro na fronteira; lobistas, grandes empresas e políticos corruptos pagariam pelo aumento de prosperidade—, não haveria ônus para os eleitores.

A maioria dos americanos, e mesmo a maioria dos apoiadores de Trump, sempre encarou sua mensagem com uma dose de ceticismo. Sabiam que Trump é um político que adora se gabar e que não haveria como ele cumprir todas as suas promessas.

Boné com o slogan 'Make American Great Again' queimado durante protesto antirracismo em Tulsa
Boné com o slogan 'Make American Great Again' queimado durante protesto antirracismo em Tulsa - Lawrence Bryant - 20.jun.20/Reuters

Mas muitos, mesmo assim, acharam que deveria haver alguma verdade no que ele dizia. Confrontados com uma alternativa na qual não confiavam, decidiram dar uma chance ao vendedor de Nova York.

Mas se a mensagem original de Trump era muito mais poderosa do que reconheceram muitas vozes do mainstream, o discurso que oferece aos leitores para se reeleger é bem mais incoerente do que essas mesmas vozes reconhecem.

Mesmo no início do ano, já estava claro que Trump não havia cumprido a grande maioria de suas promessas. Então chegou a pandemia, um número estarrecedor de americanos morreu, e a economia entrou em queda livre.

Quando possível, os presidentes que tentam se reeleger perguntam aos eleitores se estão em situação melhor do que quatro anos antes, com a esperança de ouvir uma resposta afirmativa. Mas, dado o estado lamentável em que a América hoje se encontra, isso é evidentemente uma impossibilidade para Trump.

Por isso mesmo, o presidente há meses procura uma nova mensagem. Por algum tempo sua favorita parecia ser a malfadada “Transição para a Grandeza”, um slogan mais adequado a uma empresa de porte médio que acaba de demitir um quarto de sua força de trabalho do que para um populista confiante.

Reconhecendo que suas novas propostas não agradavam a seu próprio público, Trump, como um roqueiro envelhecido, acabou decidindo requentar seu maior sucesso.

Embora ele próprio já esteja no poder há quatro anos, e apesar de boa parte do eleitorado o culpar pelos problemas do país, ele está recorrendo ao “Make America Great Again”.

Em 2016, Trump demonizou Hillary Clinton de modo tão eficaz que muitos americanos votaram tanto contra ela quanto a favor dele. Assim, se Trump conseguisse levar os americanos a ter medo de Joe Biden, a incoerência de sua própria mensagem talvez não tivesse tanta importânca.

Por sorte, ele também está se saindo muito mal nesse esforço.

Trump adora atacar Biden tachando-o de “Sleepy Joe” (Joe dorminhoco), um político senil que não estaria à altura das árduas responsabilidades do Salão Oval.

Ao mesmo tempo, porém, também tenta retratá-lo como um esquerdista radical que odeia a América e quer acabar com os subúrbios. Essas duas mensagens não combinam.

Os ataques de Trump a Kamala Harris, a companheira de chapa de Biden, sofrem da mesma falta fundamental de clareza ou disciplina.

Trump adora atacar a senadora, retratando-a como uma radical perigosa da Califórnia. Ao mesmo tempo, porém, seus apoiadores também criticam o histórico dela como procuradora-geral desse estado, porque ela teria sido insuficientemente crítica do sistema de justiça criminal.

Biden hoje lidera por margem muito maior do que Hillary quatro anos atrás. Como aprendemos, é um erro grande desconsiderar Trump antes do dia da eleição.

Ainda é possível que ele se arraste de volta à primeira posição, de alguma maneira. Em vista dos danos que ele infligiria ao país e ao mundo se conquistasse um segundo mandato, seria um erro enorme sermos complacentes.

No entanto, a razão para apostarmos em Biden neste ponto não é apenas porque os americanos estão furiosos com Trump pela maneira com que ele lida com a pandemia.

Nem porque eles anseiam uma trégua do drama diário do qual o presidente se alimenta nem porque as pesquisas de opinião parecem muito negativas para o presidente. É que, diferentemente de quatro anos atrás, Trump não tem uma história clara para contar quem ele é e o que fará pelo país.

Tradução de Clara Allain

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