Zeca Camargo

Jornalista e apresentador, autor de “A Fantástica Volta ao Mundo”.

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Zeca Camargo

Faltava o Piauí

Era só os guarás darem seu show para tudo ser perfeito

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Toda vez que me convidam para um espetáculo da natureza, eu pergunto: combinou com a natureza? Lêmures em Madagascar, golfinhos nas Maldivas, elefantes na Namíbia... a experiência me ensinou a desconfiar de compromissos com as criaturas que habitam nosso planeta –inclusive as humanas.


Por isso, quando me disseram que o passeio do dia pelo estupendo Delta do Parnaíba terminaria com uma impressionante revoada de guarás, desconfiei. Alguém acertou com o empresário dos guarás?

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Dois indivíduos da espécie guará, no Paraná - Edgar Fernandez/Instituto Guaju

Mais de um piauiense me assegurou que seria como um relógio: 17h30, 17h40 no máximo, as aves estariam prontas para se aboletar numa ilhota não muito maior que um play de um bom condomínio. Chegamos pontualmente às 17h e esperamos.

A cena que eu estava prestes a ver fazia parte da minha primeira visita ao Piauí, no último fim-de-semana. Não, você não leu errado: Teresina, numa brincadeira que agora eu tenho que aposentar, era a única capital brasileira que eu ainda não conhecia.

Isso mesmo: 114 países nos meus itinerários, sem nunca ter passado por esses cantos do meu próprio país. Rio Branco? Já fiz noite de autógrafos lá. Boa Vista? Porto Velho? Ah, meus tempos de mochila. Manaus? Pergunte a Alanis Morissette onde foi nossa melhor entrevista. Mas Piauí que é bom...


Cito essas capitais porque elas sempre apareciam quando eu comentava minha lacuna geográfica. “Já bateu até ‘lá no Norte’, mas não foi ali no ‘coração do nordeste’?”. Pois é... eu ficava até sem jeito de responder com uma negativa.


Mas não mais! Convidado pela TV Bandeirantes para participar de um programa especial em comemoração ao aniversário de Teresina (169 anos na segunda-feira 16), aproveitei para passar então pela capital e, abusado, ainda fiz questão de ir ao enxuto litoral piauiense.


Com pouco mais de 60 quilômetros, ele é o menor do Brasil. Mas, o que não ganhou em alongamento foi largamente compensando pela natureza com beleza.


De Teresina mesmo, trouxe boas lembranças. Não, não falo do calor, que, conforme a fama, é excruciante, especialmente durante a noite. A cidade tem a bizarra capacidade de parecer mais quente sem a luz do sol do que ao meio-dia.


Mas me encantei com sua variedade gastronômica, do sushi à Maria Isabel, um arroz com carne de sol. Sem falar na boa vontade de um barman que, a meu pedido, arriscou misturar gin com cajuína para ver se dava certo. E deu muito!


Fui recebido também com um calor ligeiramente mais agradável do que o dos termômetros: o da gente de lá. Não foi à toa que o presente que trouxe para todo mundo foi a camiseta onde se lê: “Abraçado pelo Piauí”.

Mas a experiência maior foi mesmo no Delta. Navegar pelos igarapés do Parnaíba que se multiplicam antes de chegar ao mar foi simplesmente fantástico.


As praias, muitas delas desertas, são salpicadas de pousadas que só acrescentam ao visual. E esqueça aquela bobagem de que quem viu uma duna viu todas: as do Piauí têm charme próprio. Faltavam só os guarás darem seu show para tudo ser perfeito no passeio. E aí eles começaram a chegar.


Passaram próximo aos barcos de turistas ali ancorados na expectativa, como a nos esnobar: voaram primeiro a uma ilha mais distante e mais farta para, só depois de uns quinze minutos, aterrissar nas árvores na nossa frente.


E pronto! Quando os guarás pousaram seu vermelho escandaloso nos galhos para passar a noite lá, coloriram aquele espaço como uma tela pontilhista. E logo percebi que estava ali envergonhado de ter pensado que a natureza pudesse não colaborar para esse nosso encontro.

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