Pão sem sova economiza suor, tempo e sabão dos padeiros

Americano elaborou receita com dobras que permite pães rústicos com massa de alta hidratação

Tomás Chiaverini
São Paulo

Durante anos como padeiro aprendiz, o texano radicado na Califórnia Chad Robertson buscava um “pão com alma antiga”. Um pão elementar, base do sustento de gerações, mas que, ao mesmo tempo, ecoasse as mãos do padeiro que o forjou. 

A primeira vez que chegou perto de encontrá-lo foi ao provar uma fornada que um de seus mentores na França, Daniel Colin, havia preparado para o pai. Era um filão de respeito, com casca escura e grandes buracos no miolo. 

“Esse é o pão que eu sempre faria para mim”, disse o padeiro francês ao notar o interesse do pupilo. “Mas os clientes nunca o comprariam”. 

Robertson levou algum tempo, mas provou que aquilo não era bem verdade. Desde 2002, ele vem fazendo fama em San Francisco com seu pão de alma antiga, que reflete não apenas as mãos, como também a rotina do padeiro.

Quando começou, trabalhando sozinho e sem maquinário, Robertson percebeu que uma massa com alta hidratação era mais fácil de se manusear em grandes quantidades. 

Também notou que a segunda fermentação, que ocorria por algumas horas no ambiente calorento das padarias, podia ser mais longa, contanto que a temperatura ambiente estivesse mais baixa. Abriu as janelas da cozinha, e deixou os pães crescendo da noite para o dia. Resultado: pão fresco para o jantar, torradas no café da manhã, e noites inteiras de sono para o padeiro.

Por fim, Robertson descobriu que poderia substituir a sova, trabalho braçal extenuante e enfadonho que ajuda a organizar cadeias de glúten —torna a massa mais elástica— e facilita o aprisionamento do gás carbônico que resultará nos alvéolos (buracos) do pão. Ele propôs dobras periódicas da massa no curso da primeira fermentação. 

A descoberta economizaria tempo, suor, sabão para limpar a cozinha, e tornaria mais fácil a vida de padeiros pelo mundo afora —Robertson tem padarias em San Francisco, Los Angeles e Seul.

Esses processos são detalhados pelo padeiro no belo livro “Tartine Bread” (sem edição no país), que visa ensinar padeiros amadores a obter seus pães com alma antiga. 

A receita do country bread (pão de campanha, numa livre tradução), é deliciosamente esmiuçada, além de revista e adaptada por padeiros amadores e profissionais. 

Uma versão dela, testada e aprovada, pode ser conferida na página 4 desta edição.

 

HISTÓRIA DO ALIMENTO
Bom pão leva tempo e paciência, ensina a parede riscada a giz de uma padaria de SP. É preciso esperar a ação de leveduras que liberam açúcares, depois transformados em ácidos, álcool e gases, que fazem crescer a massa.

Egípcios entenderiam a mensagem 6.000 anos atrás, ao dominar a fermentação. Antes, havia um pão achatado, duro e seco.

Foi levado à Europa por comerciantes gregos, por volta de 250 a.C., e  virou o principal alimento da Roma Antiga. Com o fim do império e das padarias, a produção caseira se disseminou.

O hábito se manteve tão forte que, na Segunda Guerra, tropas italianas contavam com uma padaria móvel. 

No Brasil, só se popularizou depois do século 19. 

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