Edifícios históricos se tornam polos gastronômicos em São Paulo

Museus e prédios centenários aliam arquitetura e cultura a boas opções de bares e restaurantes

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

As sombrias volutas do centenário porão do Theatro Municipal de São Paulo recebem uma pálida e inesperada luz das mesas fulgurantes do novo Bar dos Arcos. Ali se apinham jovens de classe média alta dos bairros ricos da cidade com passantes da região que relaxam neste patrimônio histórico após o trabalho.

 
 

Mistura que alegra o criador da casa, Facundo Guerra, 45, artífice de uma tendência iniciada há 15 anos e que se intensifica: a de ocupar regiões antigas e imóveis históricos para entretenimento, bares e restaurantes.

Um movimento que não teve um plano calculado. “Quando comecei, não podia ir para Jardins, Vila Madalena, eram caros; a Augusta, no centro, era barata”. Foi lá, em 2005, que criou a boate Vegas, a primeira de mais de dez casas, seis delas ainda na ativa.

“E eu gosto é do centro. Desde que cheguei da Argentina, criança, morei em Santa Cecília, e percorria as ruas com meu avô e minha mãe que eram vendedores ambulantes”, lembra.

Para além de seus domínios, São Paulo assistiu à recuperação do edifício Altino Arantes (ex-Banespa), hoje centro cultural Farol Santander, com andares dedicados à gastronomia; à instalação, nos altos do Museu de Arte Contemporânea, do restaurante Vista; à migração, para um palacete do centro antigo, do cabaré Casa de Francisca.

Fora os planos do próprio Guerra, que inaugurou o clube de jazz Blue Note no Conjunto Nacional, recupera o antigo cine Ipiranga (como clube coletivo de jogos eletrônicos) e, mais ambicioso, planeja ocupar as catacumbas da avenida Paulista, que seriam a pista dos carros (com a superfície somente para pedestres) num projeto abandonado na década de 1970.

Ilustração de Daniel Almeida para matéria sobre restaurantes em museus
Daniel Almeida

NOVIDADES

Blue Note (2019)

Filial do famoso clube de jazz de Nova York, foi recém-instalado no histórico terraço que sediou o restaurante Fasano nos anos 1960, num emblemático edifício da Paulista. Tem shows musicais num espaço intimista e gastronomia rememorando um passado recente —drinques clássicos do mestre Derivan, jantares assinados pelo chef Daniel França Pinto (ex-Lola Bistro) com pratos dos anos 1960 e 1970.

Onde: Mantendo uma gritante modernidade 60 anos depois de construído, o Conjunto Nacional é um edifício de uso misto e perfeitamente integrado às ruas que o rodeiam. Projetado pelo arquiteto David Libeskind, então com 26 anos, foi inaugurado em 1958 e tombado pelo Condephaat em 2005; sua lâmina horizontal tem sido ocupada por lojas, cinemas, livrarias, restaurantes, enquanto a torre abriga escritórios e residências.

Av. Paulista 2.073, 2º andar; facebook.com/bluenotesaopaulo

 


Pipo (2019)

O restaurante do Museu da Imagem e do Som acaba de ser assumido pelo premiado chef carioca Felipe Bronze (do Oro), em sua primeira incursão paulistana. Como na matriz do Rio, o Pipo é um local mais informal; seus pratos são imaginativos e buscam retirar sutis sabores da grelha de carvão, mas são concebidos para serem compartilhados, e as mesas do terraço são ainda mais convidativas para uma refeição descontraída.

Onde: Apesar de sua importância por sediar um museu cada vez mais popular na cidade, o edifício do MIS está longe de ser uma atração em si. Antiga mansão de gosto duvidoso, desapropriada pelo Estado, ela foi cedida ao museu (que a ocupou em 1975), passando já por várias reformas para adaptá-la ao novo uso —numa delas a entrada foi deslocada para a lateral vizinha ao Museu Brasileiro da Escultura, aí sim uma vista para um projeto relevante (de Paulo Mendes da Rocha).

Av. Europa, 158, Jardim Europa; mis-sp.org.br


Bar dos Arcos (2019)

Instalado entre as colunas de pedra e arcos de tijolos, todos aparentes, do subterrâneo do histórico edifício, o bar tem mesas coletivas de tampo luminoso nos vãos do espaço sem tocar as paredes tombadas pelo patrimônio histórico, e música ao vivo com instrumentistas do teatro; ótimos coquetéis e comidinhas para compartilhar.

Onde: O Theatro Municipal foi inaugurado em 1911 com projeto de Ramos de Azevedo e dos italianos Cláudio Rossi e Domiziano Rossi. Inspirado na Ópera de Paris com traços renascentistas e barrocos na fachada e um interior luxuoso de mármores, cristais, mosaicos e obras de arte. Recebeu os grandes nomes da música e da dança e foi palco da Semana de Arte Moderna de 1922. A última reforma, em 2011, modernizou o palco, restaurou fachadas e recuperou vitrais e pinturas decorativas.

Praça Ramos De Azevedo, s/nº; theatromunicipal.org.br

 


Restaurante Vista/ bar Obelisco (2018)

Com uma vista única da cidade, permite apreciar de cima o magnífico conjunto arquitetônico do parque Ibirapuera. Com ambientação que dialoga com a época do modernismo brasileiro, especialmente nos móveis desenhados pelo escritório Prototyp&, o restaurante tem cardápio de pratos inspirado em receitas e ingredientes nacionais assinado pelo chef Marcelo Corrêa Bastos (Jiquitaia); e o bar, drinques criados pelos premiados bartenders Zulu e Jairo Gama.

Onde: Fica na cobertura do edifício do Museu de Arte Contemporânea da USP, projetado por Oscar Niemeyer como Palácio da Agricultura, parte do complexo do parque Ibirapuera, inaugurado oficialmente em 1954. De 1959 a 2008 foi sede do departamento estadual de trânsito; restaurado com alterações do arquiteto, em 2012 reabriu como museu.

Av. Pedro Álvares Cabral, 1.301; vistasaopaulo.com.br/restaurante


Bar do Cofre (2019) / Café do Farol (2018)

O complexo cultural e de lazer prevê vários pontos gastronômicos. O primeiro a nascer foi o Café do Farol, encarapitado no mirante do edifício (26º andar); tocado pelos cafés Suplicy, fica aberto durante o dia, desde a manhã, tem mesas ao ar livre com vista para a cidade (atração duvidosa, mas...), e serve um farto e concorrido brunch aos sábados e domingos. Este ano foi a vez do Bar do Cofre, no extremo oposto do edifício: fica no subsolo, dentro do antigo e fortificado cofre, que oferece uma ambientação inusitada e interessante —os bons drinques se devem à expertise do bar SubAstor.

Onde: Ao comprar o antigo Banco do Estado de São Paulo (Banespa), o banco Santander ficou também com sua antiga sede (edifício Altino Arantes), e a transformou no Farol Santander, um centro cultural e de lazer. Projetado pelo arquiteto Plínio Botelho do Amaral e inaugurado em 1947, o prédio é uma cópia empobrecida do Empire State de Nova York, mas sendo um dos mais altos da cidade, sua silhueta virou um marco de referência no skyline.

Rua João Brícola, 24; farolsantander.com.br


Balaio (2018)

Famoso pela cozinha sertaneja que serve no Mocotó, na zona norte da capital, o chef Rodrigo Oliveira traz para a avenida Paulista interpretações autorais da cozinha brasileira de várias regiões, servidas num ambiente de animação no andar térreo de um dos novos centros culturais paulistanos. No quinto andar há também um café.

Onde: A sede paulistana do Instituto Moreira Salles foi inaugurada em 2018, instalada num edifício construído especialmente para sediá-lo. O projeto arquitetônico, que combina transparência com certa imponência, é de autoria do escritório brasileiro Andrade Morettin.

Av. Paulista, 2.424; balaioims.com.br


Z-Deli IAB (2017)

A delicatessen judaica fundada em 1981 ganhou desde 2011 filiais dedicadas a sanduíches —tanto os de pastrami como nas delis novaiorquinas quanto suculentos hambúrgueres. Tocadas pelo chef Julio Raw, a mais recente ocupa o térreo do edifício do Instituto dos Arquitetos do Brasil, no centro. Desenhada por Gabriel Kogan e Guilherme Pianca, foi concebida em harmonia com a transparência do prédio com simpáticas referências (lambris, cadeiras de couro) aos restaurantes dos anos 1950.

Onde: Inaugurado em 1951, a sede do IAB São Paulo resultou da fusão dos três times de arquitetos (liderados por Rino Levi, Miguel Forte e Abelardo de Souza) melhores colocados no concurso organizado pela instituição em 1946. Tombado pela primeira vez em 1992, o edifício tem uma modernidade graciosa com seus caixilhos de vidro, seus blocos desalinhados, sua marquise ondulada e seu mezanino em tijolo e pastilhas de vidro.

Rua Bento Freitas, 314; zdeli.com.br


Casa de Francisca (2017)

Nascido num pequeno espaço com shows para quatro dezenas de espectadores, o clube musical e restaurante Casa de Francisca ganhou espaço generoso para um público três vezes maior, e mais conforto para os drinques e jantares ao longos dos shows. Durante o dia serve também almoço, com cardápio inspirado em cozinha trivial e afetiva.

Onde: No centro antigo da cidade, nas estreitas ruas nas proximidades da praça da Sé, foi construído em 1910 o Palacete Tereza Toledo Lara, de arquitetura eclética de fachada extravagante marcada por ornamentos e vitrais. Tendo abrigado loja de instrumentos, uma editora musical e a rádio Record, foi conhecida, nos anos 1940, como “a esquina musical de São Paulo”, tradição agora retomada com os shows da Casa de Francisca, que ocupou seu segundo andar depois que o edifício, tombado pelo patrimônio histórico, passou por grande reforma.

Rua Quintino Bocaiuva, 22; casadefrancisca.art.br

TRADICIONAIS

Café Martinelli Midi (1993)

Servindo bom café e pratos de bistrô, o lugar tem ambientação e mobiliário (incluindo peças autênticas) dos anos 1920, no térreo do edifício de 30 andares que foi o primeiro arranha-céu da cidade, inaugurado em 1929 com projeto do arquiteto húngaro William Fillinger.

Rua Líbero Badaró, 508; cafemartinellimidi.com.br


Prêt no MAM (2003)

Restaurante com pratos internacionais servidos em bufê, com vista envidraçada para o parque Ibirapuera e seu Jardim de Esculturas; o edifício para exposições, de 1959, foi desenhado por Lina Bo Bardi e Martim Gonçalves, e desde 1968 é sede do Museu de Arte Moderna.

Marquise do parque Ibirapuera; mam.org.br


Bar da Dona Onça (2008)

Um dos pioneiros do movimento de recuperação do centro da cidade, fica no térreo do icônico Copan, sinuoso edifício de uso misto projetado por Oscar Niemeyer e inaugurado em 1966. A chef Janaina Rueda serve pratos inspirados na cozinha trivial paulistana.

Av. Ipiranga, 200, cj. 27; bardadonaonca.com.br

 


Santinho - Instituto Tomie Ohtake (2011), Museu da Casa Brasileira (2013) e Theatro Municipal (2015)

Restaurantes com serviço de bufê e pratos baseados na culinária brasileira, a cargo da chef Morena Leite (Capim Santo). O edifício do Tomie Ohtake (2001) é de Ruy Ohtake. O restaurante tem ainda uma unidade no Museu da Casa Brasileira (av. Brigadeiro Faria Lima, 2.705), projetado nos anos 1940, como residência do prefeito paulistano Fábio da Silva Prado, por Wladimir Alves de Souza, segundo os traços do Palácio Imperial de Petrópolis, e uma no Theatro Municipal.

Av. Brigadeiro Faria Lima, 201 (Tomie Ohtake); restaurantesantinho.com.br


Caffè Ristoro (2013)

Guloseimas e pratos italianos servidos em agradáveis mesas no jardim do Museu Casa das Rosas, instalado na antiga residência da filha do arquiteto Ramos de Azevedo, cujo escritório a projetou em estilo francês e a construiu, sendo concluída em 1935.

Av. Paulista, 37; cafferistoro.com.br


Cantina do Museu (2017)

Tocado pelo mesmo chef do Hospedaria (também na região da Mooca), Fellipe Zanuto, o restaurante fica no Museu da Imigração, num edifício de 1887 tombado pelo Patrimônio Histórico, que ganha vida especialmente com os brunches do final de semana.

Rua Visconde de Parnaíba, 1.316; cantinasp.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.