Tem medo da panela de pressão? Especialistas ensinam a evitar problemas

Físico mostra como diminuir riscos, enquanto marcas apostam nos itens de segurança

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Gabriela Dourado
Fortaleza

Todo mundo já usou aquela frase clássica de indignação, questionando ensinamentos da escola ao perguntar quando é que, na vida, se vai usar todo aquele conhecimento. Pois saiba que prestar um pouco mais de atenção nas aulas de física poderia ajudar você a ter mais sucesso na cozinha, principalmente com a panela de pressão.

Isso porque o tão temido instrumento parece menos assustador quando se compreende o que acontece ali, entre aquele minúsculo e barulhento pino, e a água fervente que envolve seu alimento.

A advogada cearense Milena Gondim, 35, não tinha lá muita intimidade com a cozinha. Ganhou de presente da avó, assim que decidiu morar sozinha, uma reluzente panela de pressão, nova em folha.

Ilustração Panela de pressão Comida 1080x1920
Ilustração Luciano Veronezi

Em uma das primeiras vezes em que foi botá-la sobre o fogão, quase transformou a experiência em acidente. "Fui tentar fazer um doce de leite e coloquei a lata com rótulo e tudo. Além disso, deixei a panela mais de uma hora no fogo, esperando o pino apitar", relata.

O resultado foi uma mancha de doce de leite no teto do apartamento e uma panela danificada. "A panela não explodiu, mas a lata, sim. E o fundo ficou preto, sem uma gota de água. Apesar de tudo, o doce ficou uma delícia."

A possibilidade de produzir o doce em casa, aliás, fascina até chefs experientes. É o caso do francês Erick Jacquin.

"Uma coisa que me surpreende muito aqui no Brasil é as pessoas fazerem doce de leite na panela de pressão. Coloca leite condensado na panela. Eu acho extraordinário, maravilhoso, é a melhor coisa que se faz na panela de pressão", comenta um dos jurados do programa MasterChef.

A física ajuda a explicar por que o episódio com Gondim teve menos cara de doce e mais cara de travessuras. O professor Douglas Gomes, mestre em ensino de Ciências e Matemática pela Universidade Federal do Ceará, dá a ideia.

"Quando você vai cozinhar um alimento, o que o cozinha? A água. Então, o que vai fazer o seu alimento ficar cozido é a água que vai transferir energia térmica pra ele. Quanto maior a temperatura da água, mais rápida vai ser a transferência da energia térmica [o calor], e essa transferência acaba sendo favorecida se você conseguir essa água acima dos 100°C."

A panela de pressão permite cozinhar mais depressa —e o tempo, sabemos, tem sido cada vez mais valorizado. Jacquin, por exemplo, pondera que é um utilitário mais comum em residências, não tanto em cozinhas de restaurantes.

"Às vezes, eu uso em casa, porque em restaurantes temos equipamentos específicos. Mas ela é ótima para ganhar tempo", diz.

Mas, como a panela consegue essa rapidez no cozimento? Porque, atenção, ela aumenta... a pressão (o óbvio às vezes precisa ser dito). No entanto, é preciso tomar cuidado para que esta pressão não aumente até explodir, encenando o pavor de grande parte dos cozinheiros amadores.

Para que isso não aconteça, coloca-se a válvula principal de controle —aquele pino que Gondim esperou apitar.

"Chega uma hora em que a pressão aumenta tanto, chegando ao limite da panela, que esta válvula permite a saída do vapor. Com isso, pode-se até abaixar o fogo para economizar o gás, pois a água terá atingido, também, a temperatura máxima, chegando até a 120°C", observa o professor.

Em um país em que o gás de cozinha chega a custar R$ 135 por botijão, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP), tudo é válido na hora de economizar —e a panela de pressão também pode ser uma aliada do bolso.

Manutenção

Mesmo depois do incidente, Milena Gondim não se deixou vencer pela frustração da primeira tentativa, e hoje segue usando a panela presentada pela avó.

"Voltei a usar e hoje sou criteriosa com a limpeza. Pra uma pessoa com o meu perfil, que mora só e trabalha bastante, ela ajuda porque reduz muito o tempo de cozimento. E hoje até risoto faço na panela de pressão", comenta.

O doce de leite que voou para o teto da cozinha da advogada só foi parar ali porque o conteúdo da panela secou. E essa rapidez no cozimento, que fez a água desaparecer, tem até uma fórmula na física: p.v = n.R.T. É a chamada "equação de Clapeyron".

"Com ela, entendemos que o aumento da pressão dificulta a ebulição, permitindo que a água atinja maiores temperaturas. Ou seja, o aumento das partículas em estado gasoso faz o aumento da pressão", continua o professor Gomes.

Entretanto, como o período do Enem já passou e todos estão exaustos de cálculos e fórmulas, há maneiras mais práticas de compreender o funcionamento da panela -assim, dá para tomar os devidos cuidados e perder o medo.

A evolução do design de produtos, por exemplo, ajuda nesse processo de se libertar do trauma. Aqui, é mentira a antiga máxima de que panela velha é que faz comida boa. No caso das panelas de pressão, são as novas tecnologias as grandes aliadas de uma experiência saborosa e segura na cozinha.

"Hoje em dia é comum uma panela de pressão elétrica possuir vários sistemas diferentes de segurança, para assegurar ao máximo a qualidade e a confiança de uso", explica o coordenador de linha portáteis da Philco, Paulo Pelatti.

Entre sistemas elétricos e mecânicos das panelas da marca, estão, por exemplo, o termostato que liga e desliga, mantendo a temperatura em padrões seguros, e a trava de abertura que impede a abertura da tampa depois que o produto já atingiu a pressão de trabalho.

Por isso, limpar bem todas as válvulas da panela é parte essencial da segurança na cozinha. A prática é enfatizada pelos chefs e professores. "A manutenção da panela deve ser sempre feita e com muito cuidado", ressalta Erick Jacquin.

"Nunca jogue a panela quente debaixo d'água e mantenha as válvulas bem limpas, são elas que garantem a proteção", complementa Gomes.

Na hora da escolha, vale ficar atento aos selos de garantia. "A melhor panela de pressão é a mais segura. É importante que o consumidor leia as descrições acopladas nos produtos, confira se é atestada pelo INMETRO e se possui as travas de segurança", enumera Monalise Couto, designer de produto da marca Brinox.

"Geralmente, uma panela de pressão tradicional tem de quatro a cinco sistemas de segurança. No mais, tendo segurança, qualquer panela é indicada para qualquer pessoa."

Com essa lista de cuidados em dia, é possível ter uma experiência tranquila com a panela de pressão. Além disso, na hora de servir o prato, vale até usar um "doce de leite a la Clapeyron" —afinal, não há mal nenhum em o cozinheiro se vangloriar dizendo que se valeu até das lógicas da física no preparo de uma sobremesa.

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