'Sommelier de comidas duvidosas', Braian Rizzo faz sucesso provando miojo e guaraná

Gaúcho de 32 anos tem quase 150 mil seguidores interessados em suas resenhas inusitadas

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São Paulo

Para que a humanidade possa evoluir, pioneiros se arriscam como cobaia e abrem caminhos —é assim na medicina, com os voluntários de testes de novas drogas, ou na corrida espacial, com astronautas que investigam planetas. A gastronomia também tem seu combatente: ele come miojo doce antes, para que os outros mortais conheçam os riscos da experiência.

Seu nome é Braian Rizzo. Gaúcho, 32 anos, ele atua no front da baixa culinária, aquela aparelhada de muito glutamato monossódico e gordura trans. Seu cargo oficial: "sommelier de comidas duvidosas", como diz sua biografia nas redes. As armas: uma década de experiência comendo besteira, e duas câmeras para registrar tudo.

Braian Rizzo, autodeclarado 'sommelier de coisas duvidosas', grava mais um dos vídeos que fazem sucesso na internet - Gabriel Cabral/Folhapress

Já são quase 150 mil seguidores no seu perfil do Instagram, confiantes nas avaliações que Rizzo faz de alimentos industrializados como refrigerantes, cereais, chocolates e sanduíches. Tudo começou em abril passado, com a primeira resenha gravada em vídeo —a prova de um miojo sabor chocolate, lançado em edição limitada pela Nissin.

O sommelier não só sobreviveu ao teste como ainda topou, já no dia seguinte, experimentar a versão "beijinho" do mesmo macarrão instantâneo, preparado com leite no lugar da água. Odiou, mas seguiu em frente.

Antes de expor a coragem em vídeo, Rizzo se sujeitava aos ultraprocessados apenas em fotografias. Postava os registros das comilanças nos stories do Instagram, e ali começou a perceber o interesse crescente dos seguidores em suas opiniões.

"Eu perguntava na legenda ‘e aí, será que provo?’. Uma das fotos que bombaram foi a do pastel burguer, que eu confrontei em 2020. Comi e passei muito mal, era muito gorduroso. Os stories bateram recorde, foi muito legal", lembra.

"Agora, que resolvi levar o projeto mais a sério, num formato mais promissor, pensei que tinha que provar o burguer de novo. Ainda é um absurdo de gorduroso, mas agora ele está bem melhor. Acho que aprenderam com meu feedback", ri o sommelier.

Pela observação dos números em sua conta no Instagram, ele acredita que o grande movimento migratório de seguidores vindos do Tik Tok para "a rede ao lado" tenha sido por conta de seu vídeo experimentando cerveja em pó, um pacotinho semelhante ao dos sucos instantâneos pronto para ser dissolvido em um copo com água —a produção rendeu mais de um milhão de visualizações.

"Eu já tinha uns 26 mil seguidores no Instagram que gostavam de outros conteúdos que eu faço. Tem meu podcast, tem livro. Mas levei uns 12 anos para juntar esse povo. E, quando postava as coisas de comida, os stories batiam quase 100% em audiência, com 20k de views."

Rizzo não tem qualquer relação formal com a gastronomia. Na faculdade, cursava marketing. Passou no vestibular em 2013, na cidade de Rio Grande (RS), onde nasceu e cresceu, mas no mesmo ano decidiu que se mudaria para São Paulo. O diploma ficou para depois.

"Quando cheguei aqui, sentia muita falta do x-coração, um lanche feito com coração de galinha. Lá no Rio Grande do Sul coração de galinha é um sabor de coisas, tem pizza de coração, salgadinho de coração. Minhas comidas favoritas são coisas com coração e, em São Paulo, vi que as pessoas não acham isso normal."

"Sempre fui gordo", resume Rizzo, um homem branco, de cabelos e barbas pretos e compridos, sempre usando óculos e portando uma expressão na divisa entre o desamparo e o pouco impressionado.

"Quando eu era jovem, a gente não tinha condição de pedir comida ou comer fora. Quando comecei a trabalhar, comecei a comer porcaria. Sempre fui comedor de coisas diferentes na minha vida pessoal", completa.

Os vídeos, de no máximo um minuto, são produzidos na casa de Rizzo, no bairro da Aclimação, em São Paulo. A comida da vez é escolhida com base em recomendações e pedidos dos seguidores.

Ele mesmo compra os produtos, embora diversas marcas já tenham entendido o potencial de divulgação que seu perfil tem e arrisquem enviar algumas ideias via correios.

"Eu tenho ignorado todas elas [as marcas], senão não vou poder falar que é ruim. Não quero que eles influenciem na minha opinião do vídeo. A menos que seja publicidade, que ainda vai rolar, mas não quero que o pagante seja a pessoa que criou o produto", explica.

Atualmente, ele publica três vídeos por semana, mas diz que já vem se programando para fazer atualizações diárias. As gravações são a parte menos complicada do trabalho: dois tripés seguram os celulares, um dele e outro, da namorada.

"A edição, que é o processo criativo, eu gravo sem saber o que vou falar. Tem alguns produtos, em que o rótulo tem algo legal escrito, ou os de produtos orientais, e esses eu deixo pra ver as figurinhas já gravando."

"Mas, na hora de trazer para o computador, eu começo a ver que piada posso fazer em qual trecho. Não escrevo um roteiro da produção. Quando o vídeo está editado, eu coloco a voz."

Na gravação do vídeo sobre o Guaraná Jesus, a garrafa 'explode' na mão de Rizzo - Arquivo Pessoal

"Com Jesus não se brinca, e com o Guaraná Jesus, muito menos", começa ele, por exemplo, ao mostrar a garrafa com o líquido cor-de-rosa mais famoso do Maranhão. "Ao abrir a garrafa, Jesus já me castigou", segue, tentando lidar com a explosão do guaraná diante das câmeras.

Na narração está um dos grandes diferenciais das resenhas de Rizzo para outras disponíveis na internet, de pessoas que também arriscam o estômago —com seu sotaque gaúcho e uma saraivada de observações bem-humoradas sobre o sabor e aparência das comidas, ele satisfaz e atiça o espectador que chega ali se perguntando "será que isso é bom mesmo?".

Spoiler: quase nunca é. Mas está tudo bem —especialmente por causa disso.

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