Sul-africano coordenava do Rio esquema em 40 países de tráfico de drogas e armas
Passava das 23h30 de 19 de maio de 2012 quando um casal e sua filha de cinco anos desembarcaram no aeroporto internacional do Galeão, no Rio. À primeira vista, apenas mais um empresário em férias com a família.
"Trouxe a família para conhecer a cidade", disse um descontraído Paul Calder Le Roux, 43, aos fiscais.
Na verdade, Le Roux voltava ao Brasil para consolidar o que havia começado em novembro de 2011: montar no Rio a base da "multinacional" presente em 40 países e especializada em tráfico de cocaína, armas, explosivos e pela venda de medicamentos controlados via internet.
A chegada do sul-africano Le Roux ao Brasil deflagrou uma operação com policiais do Brasil, EUA, Austrália e Hong Kong, para a prisão de um criminoso internacional.
Foram dois anos de investigações até sua prisão, em setembro de 2012 na Libéria, África Ocidental. A variedade de negócios irregulares de Le Roux lhe rendeu o apelido de "Senhor do Crime".
Levado a Washington, (EUA) onde corre o processo, Le Roux fez um acordo com a Justiça, levou à prisão colaboradores na Austrália, Hong Kong, Filipinas e Estados Unidos e trocou a pena de morte por 25 anos de prisão.
Com seus depoimentos foram abertos processos que correm em segredo de Justiça também no Brasil, Austrália, Hong Kong e Filipinas.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
BARBITÚRICOS
Nos documentos aos quais a Folha teve acesso e que constam do processo nos EUA, os agentes do departamento antidrogas relataram que Le Roux montou a RX Limited e abriu contas bancárias em diversos países para a venda, via web, de medicamentos controlados.
O esquema conta com médicos americanos, contratados para legitimar os pedidos de pessoas que, sem receita médica, compram psicotrópicos e barbitúricos. Alguns como Ultram ou Fioricet, proibidos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), chegaram a ser vendidos para o Brasil.
Ao suspeitar que era investigado, Le Roux, que vivia em Washington e em Manila (Filipinas), mudou-se para o Brasil. A primeira viagem aconteceu em outubro de 2011. A segunda em fevereiro de 2012. Três meses depois, retornou com a família e ficou até agosto de 2012.
Seu nome já era investigado por policiais pelo mundo sob suspeita de ser fornecedor de armas para milícias em países africanos, mas o negócio irregular nos Estados Unidos chamou a atenção das autoridades de diversos países.
FACHADA
No centro do Rio, ele abriu uma empresa de fachada, a Rainbow Force, para desenvolver programas de computador sob encomenda.
Apesar de ativa na Receita Federal, ela nunca chegou a funcionar. Tanto Le Roux como pessoas de seu grupo nunca chegaram a ir ao local. O sul-africano comprou dois apartamentos de luxo na Barra da Tijuca, zona oeste.
Em um deles, no condomínio Waterways, viviam com ele a mulher (a filipina Cindy Cayanan), a criança e uma babá. Após a prisão do marido, a mulher voltou às Filipinas.
No condomínio Barrabella, fazia reuniões e via a amante, uma jovem desempregada e sócia da Rainbow, com quem tem um filho.
Três israelenses cuidavam dos negócios de Le Roux no Rio. Em dois meses eles trouxeram para o país, sem declaração à Receita, US$ 1 milhão.
SANDÁLIAS
Entre fevereiro e agosto de 2012, Le Roux foi observado pelos investigadores em shoppings e locais públicos no Rio de Janeiro, sempre de bermuda e sandálias.
Abriu contas bancárias no Rio, pagou propinas a policiais e agentes da guarda costeira do Equador e negociou com traficantes colombianos.
De um shopping na Barra, articulou a partida de dois barcos do Equador, cada um com 200 quilos de cocaína. Um iria para as Filipinas e outro para a Austrália.
Para evitar interceptações telefônicas, Le Roux e os israelenses usaram telefones via satélite para contratar dois cidadãos tchecos para levar as cargas. Os dois se hospedaram no Rio
antes de seguirem para o Equador.
A carga para as Filipinas chegou ao destino. Na rota para a Austrália, o iate Jereve, de 13 metros de comprimento, naufragou durante uma tempestade perto da costa da ilha de Tonga, Pacífico Sul. O carregamento era avaliado em R$ 240 milhões.
Graças aos depoimentos de Le Roux, foram apreendidos US$ 3,5 milhões em contas em Hong Kong. No Brasil, os israelenses que deram apoio a ele estão sob investigação por colaboração com o tráfico.
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