SP não aplica nenhum multa por uso ilegal de agrotóxico desde 2002
Segundo órgãos que fazem o controle do agrotóxico no Brasil, todos os programas existentes são de caráter informativo, para orientação.
O Estado de São Paulo, fiando-se na legislação em vigor, não aplica nenhuma multa desde 2002, mesmo a quem é reincidente nas infrações relacionadas a esses produtos.
"A fiscalização é infrutífera e aleatória. É quase uma ficção", afirmou à Folha o engenheiro agrônomo Marco Antônio de Moraes, que atua na Coordenadoria de Defesa Agropecuária de SP há 23 anos.
Segundo a Secretaria de Agricultura do Estado, uma minuta de projeto de lei, que ainda não tramita no Legislativo, permitirá a aplicação de multas, caso um dia seja aprovada.
A pasta ressaltou que denuncia os infratores ao Ministério Público.
Para a Anvisa, as análises que resultam em multa deveriam ser feitas em programas de Estados e municípios, e o rito "implica em procedimentos que oneram a rotina dos já sobrecarregados laboratórios".
O Instituto Adolfo Lutz, do Estado de São Paulo, embora citado pela Anvisa, não tem capacidade laboratorial para analisar resíduos de agrotóxicos.
Em ofício à Defensoria Pública, o diretor-geral do instituto, Helio Caiaffa, diz que isso deve começar a acontecer somente a partir do ano que vem.
DEMORA
Enquanto nos gabinetes de Brasília decisões sobre o controle dos agrotóxicos são postergadas, ingredientes químicos proibidos no exterior são pulverizados sobre os vegetais nas lavouras do país.
Desde 2008, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) abriu 14 processos de reavaliação toxicológica de ingredientes de agrotóxicos. A lista é de produtos que oferecem riscos à saúde, segundo os estudos.
Entre as possíveis consequências, há itens como "carcinogênico" (pode causar câncer) e "suspeita de desregulação endócrina".
Passados sete anos, sete dos 14 processos de reavaliação ainda não terminaram.
Cinco foram concluídos com a proibição dos produtos. Dois, com restrição de uso.
Nas amostras pesquisadas no ano passado em São Paulo, a Anvisa detectou substâncias em processo de banimento em alimentos como alface, uva, tomate, morango, cenoura, pepino e beterraba.
"Quando falamos em agrotóxico, falamos em veneno. O descontrole deles causa prejuízo para a saúde", diz Luiz Claudio Meirelles, pesquisador da Fiocruz.
ISENÇÃO DE IMPOSTO
Para críticos da atuação governamental no setor, as políticas públicas adotadas atualmente, além de desconexas, acabam estimulando a produção e o consumo de agrotóxicos nocivos à saúde e ao ambiente.
Pelas leis vigentes, há isenção de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para os agrotóxicos e redução de 60% na cobrança de ICMS. A importação e a venda interna das substâncias também são isentas de PIS/Pasep e Cofins.
Por outro lado, os produtores de orgânicos não contam com esse incentivo fiscal.
"Nos últimos 15 anos, a importação de agrotóxicos subiu por volta de 1.000%. O Brasil é atualmente o maior importador mundial", afirma Victor Pelaez, professor do Departamento de Economia da UFPR (Universidade Federal do Paraná).
Ele é um dos autores do artigo "A (des)coordenação de políticas para a indústria de agrotóxicos no Brasil".
O estudo mostra que, de 1.500 produtos aguardando registro da Anvisa no ano passado, 20% tinham ingredientes prestes a serem banidos pela União Europeia.
Para ele, o resultado traz, além de um alerta sanitário, a ameaça de um risco econômico para o país.
"Produtos brasileiros, com restos de agrotóxicos proibidos, terão dificuldades de entrar na Europa", afirma o estudioso.
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