CLEOMAR ALMEIDA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Um cenário de terra arruinada. Fios elétricos expostos, celas com grades frágeis, telhados destruídos, paredes perfuradas por presos e com manchas de fumaça de incêndio tomam conta do palco da rebelião em Goiás que deixou, no primeiro dia do ano, nove presos mortos e outros 14 feridos.

Após chefiar a vistoria no local na manhã desta quarta-feira (3), o presidente do TJ-GO (Tribunal de Justiça de Goiás), desembargador Gilberto Marques Filho, defendeu que o governo federal envie mais recursos aos presídios de todos os Estados, em sintonia com o discurso do governador Marconi Perillo (PSDB).

A vistoria foi determinada pela presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e do STF (Supremo Tribunal Federal), ministra Cármen Lúcia, em ofício enviado a Gilberto Marques um dia depois da rebelião na colônia agroindustrial do regime semiaberto de Aparecida de Goiânia, na região metropolitana da capital.

Crédito: Editoria de Arte/Folhapress

Presos de uma ala invadiram outras três para atacar os seus rivais. Elas foram interditadas pelo Corpo de Bombeiros e outros 153 presos foram transferidos a outras duas unidades do regime fechado do complexo prisional.

O presidente do TJ-GO disse que a responsabilidade de investimento em todos os presídios estaduais deveria ser da União, apesar de lembrar que, pela Constituição, é uma obrigação dos Estados. "Cabe à União assumir o sistema prisional porque é um problema que está no Brasil inteiro", disse.

Ele afirmou ainda que, em Goiás, o Judiciário, o Ministério Público e o Executivo atuam em conjunto para buscar mais recursos para o sistema carcerário. Em algumas cidades do Estado, juízes coordenam projetos de construção, ampliação e reforma de unidades prisionais.

O desembargador lembrou que, em 2015, enquanto ele era corregedor-geral de Justiça de Goiás, coordenou a vistoria em todas as unidades prisionais do Estado assim como a da colônia agroindustrial, que sofreu outro incêndio em 2014. "Essas inspeções já mostravam péssimas condições", afirmou ele. Em 2015, a Justiça Federal negou pedido da OAB-GO (Ordem dos Advogados do Brasil em Goiás) para a interdição da colônia.

Gilberto Marques sinalizou que as inspeções são realizadas independentemente de pedidos externos, como o da ministra Cármen Lúcia. "Andamos mais de 6.000 quilômetros. Onde tinha um único presídio, levantamos a situação caótica", afirmou. Ele disse que, na época, os dados das inspeções foram encaminhados ao STF e ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e aos governos federal e estadual.

DESVIO DE EXECUÇÃO

Integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-GO, o advogado Gilles Gomes, que também acompanhou a vistoria, disse que a saída é a interdição do local. Ele afirmou que há um "completo desvio de execução da pena no semiaberto goiano", já que, acrescentou, os "presos bloqueados" do regime não saem às ruas por não terem oportunidade de trabalho.

"Eles saem do regime fechado, mas continuam fechados no semiaberto", afirmou. Nessa condição, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária de Goiás, havia 768 presos no dia da rebelião.

Os presos que trabalham e voltam ao semiaberto à noite serão levados para outro local para dormir. "Ficou acertado com o governo do Estado que um novo local será destinado aos presos que vão ao semiaberto apenas para pernoitar", disse o procurador-geral de Justiça de Goiás, Benedito Torres Neto, que também acompanhou a vistoria. Ele sugeriu ao governo estadual que altere a lei de licitação estadual ou outra norma, para reservar uma cota para os presos do regime semiaberto trabalharem de manhã e à tarde, nas empresas contratadas pelo Estado.

Houve um forte esquema de segurança, com agentes do Gope (Grupo de Operações Penitenciárias Especiais) armados com fuzis. Juízes da Execução Penal, defensores públicos, promotores de Justiça e chefes do sistema prisional também participaram da inspeção.

Crédito: Divulgação Presos da Colônia Agroindustrial fazem rebelião; há mortos e feridos, ainda sem número confirmado
Colônia Agroindustrial, onde a rebelião ocorreu na tarde desta segunda-feira (1º)

OUTRO LADO

Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou que, em 31 de dezembro de 2016, Goiás recebeu R$ 31,9 milhões do Funpen (Fundo Penitenciário Nacional) para construir ou ampliar seu sistema prisional. No entanto, acrescentou, até o dia 22 de dezembro de 2017, o governo estadual havia executado apenas pouco mais de R$ 5,6 milhões, o equivalente a 18% do montante. Na última sexta-feira (29), o governo federal repassou quase R$ 18 milhões referentes ao Funpen do ano passado.

O recurso de 2016, segundo o ministério, deve ser destinado a projetos para construir uma unidade masculina de regime fechado com 388 vagas no município de Planaltina de Goiás, a 260 quilômetros de Goiânia. Para conseguir o montante, o Estado também informou ao governo federal que iria ampliar em 150 vagas o estabelecimento masculino de regime fechado no município de Anápolis, a 70 quilômetros da capital.

Este ano, no entanto, o governo foca na promessa de inauguração de cinco unidades prisionais, que estão nas cidades de Anápolis, a 60 quilômetros de Goiânia, Formosa, Novo Gama, Planaltina e Águas Lindas, no Entorno do Distrito Federal. Todas as obras tiveram início em 2013, mas ainda não há data marcada para a inauguração das unidades.

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