Conselho pode votar nova política de drogas sem debate público

Texto apresentado em dezembro emula projeto de lei que tramita desde 2013

 

Jovem fuma um cigarro de maconha durante uma marcha pela legalização da droga
Jovem fuma um cigarro de maconha durante uma marcha pela legalização da droga - Leonardo Benassatto-5.jun.17/FramePhoto/Folhapress

Fernanda Mena FERNANDO TADEU MORAES
São Paulo

O Conad (Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas), principal colegiado sobre o tema no Brasil, ligado ao Ministério da Justiça, pode votar nesta quinta (1º) resolução que reproduz princípios e diretrizes de um projeto de lei que tramita no Congresso desde 2013 e é alvo de controvérsia na comunidade científica.

Tanto a resolução proposta ao Conad como o PL 37, hoje no Senado, são de autoria do então deputado federal e hoje ministro de Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra (PMDB-RS), que se diz "militante do projeto de enfrentamento das drogas" e entrou no Conad em 2016.

Na única reunião do conselho de 2017, em 19 de dezembro, Terra propôs aos colegas um texto pronto de resolução que não estava na pauta. Não houve debate desde então.

Assim como o PL 37, seu texto propõe uma política nacional contrária à legalização de qualquer substância ilícita e focada em programas de abstinência e na avaliação de resultados dos tratamentos para dependentes químicos.

Se aprovado, as diretrizes devem ser seguidas pelo governo -embora haja potencial conflito com a legislação.

"O que está se colocando na resolução são coisas que a lei [o PL] tinha, mas que o Conad desconhecia", afirma Terra, que avalia a política atual como ideológica e focada em redução de danos -estratégia que visa diminuir os efeitos danosos do abuso das drogas, sem pregar abstinência.

Terra diz que sua proposta está baseada na ideia "de tratar da questão da abstinência e envolver instituições que estavam marginalizadas, como comunidades terapêuticas".

Comunidades terapêuticas são instituições, em geral religiosas, que oferecem internação a dependentes químicos. Inspeção feita em 2017 em dez Estados pelo Ministério Público Federal encontrou internações forçadas e indocumentadas, problemas de higiene e suspeita de trabalhos forçados nesses locais.

"Há comunidades terapêuticas boas e ruins. Elas têm de ser avaliadas e seguir protocolos", defende Terra.

TRÂMITE

O Conad -responsável por acompanhar a política de drogas- tem 28 cadeiras, ocupadas pelo titular da Secretaria Nacional de Políticas de Drogas, representantes de ministérios, conselhos de classe e grupos da sociedade civil.

Para o médico e pesquisador da Fiocruz Francisco Inácio Bastos, recém-empossado para a vaga da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a resolução "deveria seguir sua tramitação original via projeto de lei". "Aprovar esse tipo de coisa num conselho é complicado porque ele não representa a sociedade como um todo."

Para Luís Fernando Tófoli, professor de psiquiatria da Unicamp e membro do Conselho de Políticas sobre Drogas de SP, "não tendo conseguido aprovar o projeto de lei até hoje, o ministro tenta agora uma manobra para tentar ganhar o jogo". Terra diz que sua proposta "pode ser modificada antes de ser votada".

Para Bastos, "existe no Brasil uma politização e polarização de um ou outro tipo de terapêutica. Em outras partes do mundo elas convivem".

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