Blocosfera: Primeiro de todos os desfiles foi iniciativa solitária

Porta-bandeira Cleusa Carlos Vaz e o mestre-sala Sérgio Neris Ferreira dos Santos (Serginho) comemoram o título da escola de samba Vai-Vai pelas ruas de São Paulo em fevereiro de 1986
Porta-bandeira Cleusa Carlos Vaz e o mestre-sala Sérgio Neris Ferreira dos Santos (Serginho) comemoram o título da escola de samba Vai-Vai pelas ruas de São Paulo em fevereiro de 1986 - Silvestre P. Silva - 14.fev.1986/Folhapress
Lira Neto

Foi o primeiro desfile das escolas de samba de toda a história. Nos jornais da época, contudo, quase não existem registros prévios a respeito do furdunço.

No início daquele fevereiro de 1932, a imprensa carioca praticamente ignorou a notícia que vinha correndo de boca em boca, pelas vielas, becos, morros e subúrbios do Rio de Janeiro.

No domingo de Carnaval, 23 agremiações, com seus ritmistas e passistas anônimos, iriam tomar conta da praça Onze a fim de disputar quem era mesmo bom de batuque e de samba no pé.

Ao longo do dia, quando se constatou que milhares de pessoas, provenientes dos quatro cantos da cidade, estavam se deslocando de modo frenético ao local, as Redações começaram também a despachar repórteres e fotógrafos para lá.

O que a praça Onze mostrou ao carioca excedeu qualquer previsão, noticiou, dois dias depois, o Jornal do Brasil. Constituiu ineditismo o encantador espetáculo, fez coro o Diário Carioca.

Embora já existissem havia algum tempo (o bloco Deixa Falar, do bairro do Estácio, considerado o precursor do gênero, foi fundado em agosto de 1928), as escolas de samba nunca tinham desfilado juntas, em uma competição.

Antes disso, cada uma fazia o próprio cortejo, embora muitas tivessem em comum a popular praça Onze como ponto de convergência. Ao longo do caminho, arrastavam os foliões das respectivas comunidades, ganhando adesões enquanto serpenteavam pelas ruas.

INICIATIVA SOLIDÁRIA

A ideia de reuni-las em um campeonato de samba partiu da iniciativa solitária de um jornal nanico, o Mundo Sportivo. Dedicado à cobertura futebolística, o periódico ficara sem assunto ao final do certame carioca de 1931, quando os atletas saíram de férias até depois da Semana Santa do ano seguinte.

Não havia enredo determinado, coreografias fixas ou fantasias padronizadas. Carros alegóricos, nem pensar. Tudo isso era coisa dos ranchos carnavalescos que desfilavam lá na sofisticada avenida Rio Branco.

Entre as escolas, o que estava em julgamento naquele primeiro desfile era mesmo a ginga dos passistas e a inspiração dos partideiros, que tinham de compor versos de improviso, alternando-se ao estribilho fixo dos sambas cantados em coro pelas chamadas pastoras.

A grande campeã, sagrada pelo júri do Mundo Sportivo, foi a Estação Primeira, que jamais havia descido do morro da Mangueira para o centro da cidade. O jovem compositor de um dos dois sambas apresentados pela vencedora chamava-se Angenor de Oliveira. No morro, todo mundo o conhecia mesmo pelo apelido de Cartola.

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