Grupo faz quebra-quebra, atinge carros e assusta comércio no centro de SP

Ao menos 11 carros foram depredados; um funileiro foi cercado e agredido

Dhiego Maia
São Paulo

 

Um grupo de 20 pessoas munidas de pedras, paus e até coquetel molotov promoveu um quebra-quebra na tarde desta sexta-feira (23), no bairro Campos Elíseos, no centro da capital paulista.

O ataque ocorreu pouco antes das 15h em um trecho da rua Conselheiro Nébias, entre a avenida Duque de Caxias e a rua General Rondon. Ao menos 11 carros que estavam estacionados no local, conhecido por concentrar comércio especializado no reparo de veículos, foram depredados.

Comerciantes entrevistados pela Folha disseram que os envolvidos podem ser usuários de drogas saídos da cracolândia, hoje estabelecida também no centro de SP. Um empresário da rua que não quis se identificar disse que a ação foi rápida e organizada.

“Estou há 30 anos aqui e nunca tinha visto isso. Eles estavam tão preparados que carregavam um coquetel molotov caseiro”, afirmou. Um vídeo ao qual a reportagem teve acesso mostra um grupo de policiais militares em motos perseguindo os suspeitos.

Um deles não consegue escapar do cerco, cai no chão e leva uma série de chutes dos militares. O suspeito foi detido na sequência. Outro PM joga sua moto em cima de outra pessoa que fugia após os atos de vandalismo.

A Folha procurou a PM, mas ela ainda não se manifestou sobre o comportamento de seus agentes nesta ocorrência.

ABAIXEM AS PORTAS

 
Outro que presenciou os atos de vandalismo foi Marcelo de Almeida, 48, funcionário de uma loja de compra e venda de carros. Ele disse que, antes de o grupo entrar na rua, dois homens saíram à frente gritando: “Abaixem as portas”.
 
“Estavam armados com facas, paus e um deles carregava uma bolsa com pedras. Eles saíram destruindo todos os carros que conseguiram”, disse Almeida.Para-brisas e vidros laterais dos veículos ficaram estilhaçados.
 
No meio do tumulto, o funileiro Edvan Silva Santos, 37, foi cercado por quatro deles enquanto abaixava pelo lado de fora a porta do comércio onde trabalha. Ele contou à reportagem que levou vários socos e chutes e que o pior só não aconteceu porque um dos envolvidos na quebradeira pediu para o grupo parar de agredi-lo. “Um gritou: ‘Esse aí não. Ele é trabalhador’.”
 
“Levei vários socos na costela. É isso que um homem, que levanta todos os dias às 5h da manhã para trabalhar, ganha.”
 
Fábio Fortes, integrante do Conseg (conselho de segurança) de Higienópolis, Santa Cecília e Campos Elíseos, diz que o episódio evidencia a insegurança da região e as dificuldades do poder público em lidar com a situação dos usuários de crack. "A prefeitura erra [com as ações na cracolândia] em não perseverar. Todos os prefeitos deixam a situação piorar para depois dizer que melhoraram. Havia expectativa de melhora mas não teve manutenção do processo", diz.
 
Quatro dos 11 carros danificados no tumulto estavam sob a guarda da funilaria onde Edvan trabalha. Entre eles, uma BMW Alpina, que teve um dos vidros laterais quebrado. O prejuízo, estima o funileiro, pode chegar a cerca de R$ 4.000.
 
O quebra-quebra durou poucos minutos. Ao cruzar a avenida Duque de Caxias, o grupo se dispersou.
 
Por volta das 15h30, o clima ainda era de apreensão entre os comerciantes, que voltavam aos poucos à rotina normal. Além de carros da PM, que passaram a circular pela região com maior frequência depois do episódio, homens da Cavalaria da corporação estiveram no local para reforçar a segurança.
 
Em nota, a PM (Polícia Militar) informou que, acionados após a confusão, "os policiais foram hostilizados e, por isso, houve a necessidade de intervenção". Segundo a PM, usuários de drogas teriam iniciado o tumulto durante ação de limpeza realizada pela prefeitura.

conflitos

Reportagem da Folha do início deste mês mostrou que moradores e trabalhadores da região dizem que há um clima diário de tensão na cracolândia, com recorrentes lançamentos de bombas pela polícia e ataques com pedras e tijolos pelos viciados. Usuários e agentes de saúde dizem ter uma espécie de “operação sufoco”, para cansar usuários e fazê-los sair de lá, o que a prefeitura nega.
 
Carros quebrados e lojas fechadas na rua Conselheiro Nébias, no centro de São Paulo, após quebra-quebra promovido por grupo
Carros quebrados e lojas fechadas na rua Conselheiro Nébias, no centro de São Paulo, após quebra-quebra promovido por grupo - Eduardo Anizelli/Folhapress

Os confrontos costumam acontecer durante a limpeza das ruas, com jato d’água, instrumento usado pela prefeitura para impedir que traficantes montem barracas e outras estruturas fixas no local. As limpezas ocorrem, em geral, de manhã e de tarde.

Os dois lados se acusam e afirmam que só reagem a agressões iniciadas antes. Segundo a prefeitura, “a guarda só atua, usando armamento não letal, em proteção aos seus agentes e outros trabalhadores, quando estes são atacados pelos usuários”. 

Já a PM afirma que “em diversas ocasiões houve agressões com pedradas, tijolos e diversos tipos de material que os usuários e traficantes arremessaram contra os agentes, que, para se defenderem ou para protegerem transeuntes, tiveram que intervir seguindo os protocolos nacionais e internacionais de controle de distúrbios civis”.

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