Temer articulou criação de Ministério da Segurança há 16 anos

Medida volta a ser proposta do presidente para tentar frear violência urbana

Wálter Nunes
São Paulo

Um material apreendido pela Polícia Federal na Operação Satiagraha, em 2008, sugere que o presidente Michel Temer (MDB) e um importante lobista de São Paulo tiveram juntos a ideia da criação do Ministério da Segurança Pública há 16 anos. Hoje presidente, Temer quer criar a pasta por meio de um projeto de lei em regime de urgência.

O material em questão é um conjunto de e-mails trocados entre o lobista Roberto Figueiredo do Amaral e interlocutores do PSDB e do PMDB nas vésperas da eleição de 2002. José Serra (PSDB-SP) era candidato à Presidência, apoiado pelo PMDB de Michel Temer.

Amaral, que na ocasião prestava consultoria para o banqueiro Daniel Dantas, dono do Banco Opportunity, guardou essas correspondências eletrônicas em um HD externo, que em dezembro de 2008 foi encontrado numa operação de busca e apreensão da Satiagraha. Durante anos, ele atuou para a empreiteira Andrade Gutierrez.

José Yunes (roxo), Michel Temer e Roberto Amaral
José Yunes (roxo), Michel Temer e Roberto Amaral - Reprodução

Embora Amaral não tivesse nenhuma ligação específica com a área da segurança, e-mails indicam que o lobista tinha influência em propostas da candidatura do tucano, assim como em governos ligados ao partido.

Amaral trata primeiro com o ex-embaixador Andrea Matarazzo e depois manda cópia dos e-mails para o advogado José Yunes e o então deputado federal Michel Temer. Yunes é amigo de Temer e foi seu assessor especial na Presidência, em 2016. 

As conversas aconteceram em 25 de fevereiro de 2002, um dia após José Serra lançar sua primeira proposta de governo na convenção nacional do PSDB, que foi justamente a criação da pasta da Segurança Pública.

O primeiro e-mail de Amaral, às 10h57, é endereçado a Andrea Matarazzo, a quem ele chama pelo apelido de “Conde”. Na conversa, Amaral anexa o link da notícia que diz que Serra, a quem ele se refere como “careca candidato”, havia lançado a proposta da criação do novo ministério e faz um desafio a Matarazzo. 

“Pergunte meu caro conde e embaixador ao careca candidato de quem foi a ideia do Ministério da Segurança. Ele, mendaz (mendaz é mentiroso granfino) como é, dirá que foi dele, mas, neste caso, uma testemunha há: Lulia – o impoluto – também conhecido como Michel Temer.” Com frequência Amaral tratava Temer pelo seu sobrenome do meio: Lulia. 

Às 11h09 do mesmo dia Amaral encaminha o mesmo e-mail para Michel Temer e José Yunes. Desta vez, porém, o lobista acrescenta um comentário dizendo que a ideia da criação do ministério foi dele, Amaral, juntamente com Temer. Ele diz que havia dito a Andrea Matarazzo para que comunicasse o presidente Fernando Henrique Cardoso que Temer havia sido o “que mais fez por esse governo”.

“A ideia nossa foi (Lulia e eu – o modesto). Se há uma pessoa que mais fez por este governo e menos reconhecimento teve esta pessoa foi Lulia. Vá correndo falar com o pres. É verdade.” A Polícia Federal não encontrou e-mails com as respostas de Michel Temer e José Yunes.

Em vários e-mails Amaral menciona o esforço do então deputado federal Michel Temer na costura que resultou na aliança entre PSDB-PMDB na eleição presidencial de 2002. 

A Operação Satiagraha, deflagrada em 2008, investigou negócios do banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, por suspeita de corrupção. O banqueiro chegou a ser preso e foi condenado em primeira instância, mas em junho de 2011 a 5ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou toda a investigação por considerar que a atuação de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) na operação da PF violou os princípios constitucionais da impessoalidade, da legalidade e do devido processo legal. O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luiz Fux, em 2015, manteve a decisão do STJ.

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