Descrição de chapéu Alalaô carnaval

Vizinhos da folia de SP 'fogem' de casa para escapar de blocos de rua

Prefeitura e Promotoria atuam para tentar disciplinar ocupação das ruas

Aposentada Mari Menda, vestida de camisa azul, carrega poodle no sofá de sua casa
A aposentada Mari Menda, 62, alugou uma outra casa para escapar da folia diante de seu apartamento - Eduardo Anizelli/Folhapress
Mariana Zylberkan
São Paulo

Seria mais uma tarde tranquila de feriado de Carnaval para a aposentada Mari Menda, 62, se as paredes de seu apartamento, na rua Augusta, no centro de São Paulo, não tivessem começado a tremer, no ano passado.

Ainda sentada à máquina de costura, em um quarto distante da janela que dá para a rua, ela começou a se sentir mal de nervoso. "Achei que estava maluca, mas na quinta vez peguei meus cachorros e desci para a rua. Para mim, o prédio ia cair."

O tremor era tanto que ela chegou a gravar com o celular o vidro de perfume que balançava sobre a estante.

O "terremoto" era provocado pelo som do trio elétrico comandado pela cantora Daniela Mercury, que descia a rua da Consolação a poucos metros da sua casa. "Tentei ligar na Defesa Civil, mas ninguém atendia. Foi um desespero sem fim. Não conseguia nem ficar na rua por causa da multidão."

Neste ano, Mari preferiu não arriscar e alugou uma casa em Itapecerica da Serra, na região metropolitana de São Paulo, para passar a semana de Carnaval. "Vou investir na minha saúde mental."

O retiro forçado de Carnaval, porém, não deve livrá-la do trio de Daniela Mercury, que está programado para descer a rua da Consolação no domingo pós-carnaval (18). "Posso até pegar febre amarela no meio do mato, mas pelo menos tenho certeza que vou ficar longe dos blocos", brinca Mari.

O sofrimento de paulistanos que moram no entorno dos trajetos por onde passam os megablocos tem crescido na mesma proporção do Carnaval de rua, que neste ano deve reunir mais uma vez milhares de pessoas.

Para tornar o período menos sofrido para quem se incomoda com a folia, associações de bairros têm se articulado com a prefeitura e o Ministério Público para tentar de alguma forma disciplinar a ocupação das ruas pela multidão carnavalesca.

MOBILIZAÇÃO

Tradicional epicentro de aglomerações em dias de festa, a Vila Madalena, neste ano, não terá desfile de blocos no quadrilátero entre as ruas Wisard, Girassol, Inácio Pereira da Rocha e Simão Alvares. A proibição, que inclui acesso controlado de foliões neste "miolo" do bairro, é comemorado como vitória pelos vizinhos que têm se mobilizado há quase quatro anos, desde a última Copa, quando o bairro foi tomado por multidões.

"Fui falar com o prefeito João Doria durante a campanha e ele me garantiu que não haveria mais Carnaval na Vila Madalena", diz Cássio de Freitas, presidente da associação de bairro.

A mudança, porém, foi resultado de inquérito proposto pelos moradores há dois anos no Ministério Público justamente para investigar a venda ilegal de bebida alcoólica e consumo de drogas nas ruas do bairro.

Ao inquérito foi anexado no fim do ano passado uma representação na mesma linha feita por moradores do entorno da praça Roosevelt, na região central.

A reclamação foi embasada por fotos de contravenções flagradas na praça e uma série de boletins de ocorrência registrada pelos vizinhos. Após reuniões com o promotor de Habitação e Urbanismo César Ricardo Martins, a prefeitura acatou os pedidos e decidiu fechar a praça com tapumes nos dias que tiver desfiles de blocos na região.

A permanência de foliões e ambulantes está proibida na praça Roosevelt durante os dias de Carnaval. "É uma forma de prevalecer o descanso frente às pessoas que insistem em ficar aqui de madrugada e desafiar as leis", diz a presidente da Associação do Bairro da Consolação, Marta Reigarás.

Assim como os integrantes da associação de bairro da Vila Madalena, Marta pretende passar o feriado em casa para ficar de olho se as novas regras serão respeitadas. Caso algo saia do controle, eles já se articularam com representantes da prefeitura e da Polícia Militar para exigir providências imediatas.

Na Vila Leopoldina, na zona oeste, moradores e comerciantes da rua Carlos Weber também recorreram à promotoria para tentar impedir o desfile do bloco Leopoldina, marcado para este sábado (3), na via. "Eles avisaram que vêm 10 mil pessoas. No ano passado, foi quase a metade disso e tivemos muitos problemas. O desejo dos moradores é que não saia", diz Umberto Sarti, da Associação Vila Leopoldina. O pedido não foi acatado.

O movimento articulado entre os moradores fez a prefeitura passar o comando dos desfiles de blocos para a secretaria das Prefeituras Regionais, –antes a organização ficava sob responsabilidade da pasta da Cultura.

A gestão diz que a descentralização possibilitou maior diálogo entre moradores e organizadores de blocos, além de organizar melhor a festa que fica maior a cada ano.

As representações motivaram a promotoria a estudar a possível criação de uma futura lei do Carnaval, que deve regulamentar normas como limite de decibéis emitidos pelos trios elétricos, entre outras medidas.

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