Bilhete ligado a bandido levou PM a suspeitos de roubar caixa eletrônico

Carta escrita por pessoa ligada a um dos criminosos indicava o plano do grupo

Rogério Pagnan Luís Freitas
São Paulo e Campinas | UOL

Policiais fazem perícia em veículo branco à noite
Policiais fazem perícia em um dos veículos usados pela quadrilha - Denny Cesare/Codigo19/Folhapress

A ação da Polícia Militar de Campinas (a 93 km de São Paulo) que deixou sete mortos e um homem preso na noite desta quarta (28) foi desencadeada após uma carta de parente de um dos criminosos ser deixada na porta de um batalhão.

Segundo integrantes da cúpula da segurança paulista ouvidos pela Folha, a carta, escrita em papel de caderno por uma pessoa ligada a um dos criminosos, indicava o plano do grupo em participar de roubo a banco ou caixa eletrônico na cidade de Joanópolis (a 112 km de São Paulo). Dizia das armas e dos carros que seriam utilizados.

O mais importante para a polícia foi a indicação da estrada de terra por onde o comboio pretendia passar e, justamente, onde a PM montou a ação contra o grupo. E, também, detalhes da provável data do ataque: noite do último dia de fevereiro.

A equipe do Baep (batalhão de ações especiais da PM) abordou a quadrilha na estrada municipal Dona Isabel Fragoso Ferrão, que liga a rodovia Dom Pedro I (SP-065) ao distrito de Joaquim Egídio, por volta das 21h30 de quarta-feira (28).

O autor da carta diz que fazia a denúncia porque preferia ver o parente ser preso a ser morto, já que sempre foi um homem bom, mas, de um tempo para cá, havia se envolvido no mundo do crime. Primeiro, com o tráfico, recentemente em roubos a banco. 

Também dizia que o homem estava muito violento pelo constante uso de drogas.

Como a pessoa não diz o nome do criminoso, não é possível saber se ele está vivo ou não. Essa carta, segundo a Folha apurou, foi encontrada há dois dias no batalhão do Baep.

A Folha apurou que a PM de Minas também monitorava o mesmo grupo. Os policiais mineiros informaram que aguardavam uma ação desses criminosos na cidade de Extrema. 

A Corregedoria da PM paulista acompanha o caso. 

MORTES

Os policiais montaram um cerco na estrada municipal Dona Isabel Fragoso Ferrão para interceptar a quadrilha. Na operação, havia 72 policiais militares em 18 viaturas.

A polícia disse que fez a sinalização para que os veículos parassem, mas que os suspeitos começaram a atirar. "Nós tentamos fazer a abordagem para parar os carros e fazer a revista, como de rotina, mas fomos recebidos a tiros, e tivemos que revidar. Chamamos o socorro depois da ação, mas todos morreram no local", afirmou o tenente-coronel e comandante do Baep, Marci Elber Maciel Rezende da Silva, em entrevista coletiva na tarde desta quinta.

Os carros onde estavam os suspeitos eram roubados. O patrulhamento identificou três carros --uma Renault Captur, um Fiat Strada e um Volkswagen Jetta-- trafegando em um comboio pela Dom Pedro I. No momento do cerco,  apenas dois carros --a Captur e a Strada-- chegaram ao local, em alta velocidade.

O tiroteio aconteceu próximo à ponte sobre o rio Atibaia, a cerca de 200 metros do acesso à rodovia Dom Pedro. O local, que tem apenas propriedades rurais, foi escolhido pela quadrilha justamente para não chamar atenção.

Na troca de tiros, sete suspeitos foram baleados e morreram no local. Um dos suspeitos foi preso horas depois. Nenhum policial se feriu.

Foram mortos Bruno Alves de Souza, 27, Marcos Paulo Correia de Melo, 24, Davirlan Tenório dos Santos, 34, Itamar Gomes de Lima, 29 e Ronaldo Antunes. As outras duas vítimas não foram identificadas.

Todos os suspeitos mortos tinham passagem pela polícia por crimes como tráfico de drogas, roubo, receptação e porte ilegal de armas. Ronaldo Antunes, inclusive, escapou do presídio Ataliba Nogueira, em Campinas, cortando o alambrado da unidade, em 2003.

Segundo a polícia, provavelmente dois homens conseguiram escapar do tiroteio --um deles foi localizado e preso durante a manhã. Alessandro Bernardo, 34, estava em um terreno próximo da estrada, com um colete à prova de balas. Ele estava com ferimentos na perna e mão direita. 

O suspeito foi apresentado no 12º Distrito Policial de Campinas e posteriormente levado ao Hospital das Clínicas da Unicamp. Até as 14h30 não havia informações sobre seu estado de saúde.

O criminoso preso disse aos PMs que, em Joanópolis, tinham dois alvos para serem atacados: as agências do Banco do Brasil e dos Correios.

O suspeito disse ainda que ele mesmo havia estado por duas vezes em Joanópolis para fazer estudo das rotas de fuga, já que ele seria responsável pela condução de um dos veículos na fuga. O preso afirmou também que apenas um dos comparsas sabia utilizar os explosivos, chamado por ele de bombista, e que era uma pessoa de Santa Barbara D'Oeste (140 km de São Paulo). 

O suspeito foi preso e apresentado ao 12º DP de Campinas. Na sequência, recebeu atendimento no Hospital das Clínicas da Unicamp.

Bernardo foi atingido por tiros na perna e na mão direita. Segundo a polícia, ele tem ficha criminal por receptação. Ainda resta pelo menos mais um integrante da quadrilha foragido, de acordo com a PM.

"Ainda não dá para saber ao certo quantos bandidos havia nesta ação porque não sabemos quantos deles havia no Jetta e se esse carro estava junto com os bandidos", disse o delegado em exercício da 1ª Delegacia Seccional de Campinas, Roberto José Daer.

O armamento apreendido, e que seria usado pela quadrilha, é pesado: um fuzil 556, duas metralhadoras ponto 40, uma metralhadora 9mm, duas espingardas calibre 12, duas pistolas calibre 45, duas pistolas calibre 9mm e um revólver calibre 38. Também havia munição, dois coletes balísticos, uma bolsa com explosivos e 13 detonadores, cerca de 26 cartuchos de emulsão explosiva, luvas, botas, tocas, lanternas, rádio para comunicação e duas máscaras.

A polícia desconfia que o grupo é o mesmo que agiu na cidade de Caconde (SP), em fevereiro, quando assaltantes explodiram quatro agências bancárias na cidade. "O que temos é que a intenção era promover uma série de ataques a bancos em Joanópolis. Pelo arsenal encontrado com eles, dá para dizer que são experientes e que já vinham atuando nesse ramo. Os indícios apontam que eles são organizados e especialistas neste tipo de delito". 

Até as 15h desta quinta, nenhum advogado havia se apresentado à polícia para defesa do suspeito foragido. A reportagem não conseguiu localizar familiares dos mortos --segundo a PM, eles seriam moradores do distrito do Ouro Verde, também em Campinas.

Os carros usados pelos criminosos foram apreendidos e levados para o 4º Distrito Policial de Campinas, responsável pelas investigações.  Os veículos Renault Captura e Fiat Strada ficaram marcados pela troca de tiros. No primeiro, dois disparos atingiram o vidro traseiro. No segundo, a porta do passageiro ficou danificada por ao menos dois disparos.

LETALIDADE

O número de pessoas mortas pelas polícias Civil e Militar no Estado de São Paulo chegou a 939 em 2017. 

Trata-se do maior índice já registrado pela SSP (Secretaria da Segurança Pública), que começou a contabilizar a letalidade policial anual em 1996. Somente na gestão Geraldo Alckmin (PSDB), entre 2011 e 2017, a letalidade policial aumentou 96%.

Já o número de policiais civis e militares mortos no Estado (60), em serviço e em folga, é o menor desde 2001. Sob a gestão do governador Geraldo Alckmin (PSDB), esta é a terceira vez em que uma ação da polícia termina com a suposta quadrilha inteira morta e nenhum policial ferido.

Nas duas primeiras ações, em 2002 e 2017, o governador elogiou os policiais envolvidos. Em 2002, na rodovia senador José Ermírio de Moraes, a Castelinho, que dá acesso a Sorocaba (100 km da capital), um ônibus que levaria 12 integrantes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) a um roubo, PMs da Rota interceptaram e mataram a suposta quadrilha.

No ano de 2014, a Justiça de São Paulo absolveu sumariamente todos os policiais envolvidos na ocorrência, que ficou conhecida como “Operação Castelinho”. Alckmin sempre elogiou a ação, afirmando que “em São Paulo, bandido tem dois destinos: prisão ou caixão”.

Em 2017, uma ação da Polícia Civil terminou na morte de 10 suspeitos de integrarem uma quadrilha de roubo a casas em áreas nobres da capital. Nenhum policial foi alvo de investigação. Alckmin também defendeu a ação.

“A polícia com esse trabalho de inteligência monitorou e fez a intervenção. Graças a Deus, nenhuma vítima foi atingida, nem policiais. Então, esse é o trabalho que tem que se feito, um trabalho de inteligência, para você tirar essas organizações criminosas, principalmente armadas com fuzil”, disse o governador.

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