Cabos caídos tornam rua do centro de SP prova de 1.800 m 'com barreiras'

Fios soltos põem em risco pedestres e afetam serviço de internet na região

Thiago Amâncio
São Paulo

É por volta de meio-dia e um grupo de crianças sai da escola João Kopler em direção às suas casas, no Bom Retiro, região central de SP. 

Na alameda Nothmann, sob os trilhos do trem, os meninos têm duas opções para seguir: de um lado da calçada, um amontoado de lixo e entulho. Do outro, um emaranhado de cabos soltos.

Vão pelo lado dos fios, mas ainda precisam desviar dos obstáculos: recorrem à ciclovia e até às faixas de carros.

Logo atrás, um grupo de trabalhadores procura um lugar para almoçar. “Olha lá”, apontam, “consertam num dia, no outro os fios já estão todos no chão de novo”.

É assim que andam os que passam pelos 1.800 metros que separam o início da alameda Nothmann ao fim da rua Silva Pinto (sua continuação): desviando das barreiras de cabos soltos e caídos.

Sentado sobre a calçada em frente ao Sesc Bom Retiro, onde trabalha, o auxiliar de serviços gerais Roberto Carlos Silveira, 52, aponta o perigo da fiação livre. “É época de chuva, pode ter algum acidente. E se passa uma criança correndo, se enrosca e cai na rua?”, questiona.

Os postes de São Paulo são administrados pela Eletropaulo, concessionária de energia elétrica da capital, mas a fiação é dividida entre três grupos. Uma parte é exclusiva para iluminação pública, administrada pela prefeitura. Outra é da própria Eletropaulo, por onde passa a energia elétrica distribuída para casas, por exemplo.

A terceira faixa de espaço fica para companhias de telecomunicação. São mais de 30 grupos, segundo o vice-presidente da Eletropaulo Sidney Simonaggio, das empresas maiores às menores, que usam os postes para levar redes de telefonia, internet e TV a cabo, entre outras.

“Está esgotado o espaço, [as empresas] põem por cima mesmo. Isso é que traz essa condição caótica na ocupação compartilhada”, diz ele.

Já faz nove dias que o restaurante de Alessandro Soares, 40, está sem internet —segundo ele, desde que um caminhão do tipo cegonha rompeu cabos na esquina das alamedas Nothmann e Barão de Limeira. Os fios continuam caídos. “Os carros passam e arrastam ainda mais os fios”, afirma ele. “Falam que vão resolver, e nada.”

A Net, operadora de internet de Soares, diz que os cabos soltos na via não pertencem à operadora e que o serviço está normal na região. Houve ainda problemas com a Vivo à época do acidente. A empresa diz que a rede foi reparada e que a conexão está em pleno funcionamento.

Questionada sobre os fios caídos, a prefeitura disse que responsabilidade pelo poste é da Eletropaulo e que, quando há reclamação nas regionais, os agentes notificam a concessionária para fazer reparos.

ENTERRAMENTO

A gestão João Doria (PSDB) anunciou no ano passado parceria com a Eletropaulo para enterrar 65 quilômetros de cabos na cidade. A rua Silva Pinto está na lista e, de fato, em boa parte da via já não há mais fios expostos.

O que trouxe outro problema. “A gente reformou a calçada aqui. Do dia para a noite, no fim do ano passado, quebraram tudo para enterrar os fios. Mas nunca consertaram”, diz Rita Pereira, que trabalha em uma loja. 

Dos dois lados do quarteirão há pisos destruídos, cobertos apenas com cimento.

A prefeitura diz que as calçadas serão reconstruídas ao término do serviço, previsto para julho. Na região central, 30 km de cabos já foram enterrados em 14 ruas, o que permitiu a retirada de 101 postes, diz a atual gestão. Não há enterramento previsto na alameda Nothmann.

Sabino Pereira, que trabalha há quatro anos em uma ótica na alameda, é cético quanto ao enterramento.

É muito fio na cidade toda, é muito caro. Precisam organizar os postes, colocar os cabos em um local mais alto. É só chover ou bater um vento que cai tudo”, diz ele.

A Eletropaulo informou que vai enviar equipes para os endereços citados pela reportagem para verificar quem são os responsáveis pelas fiações e solicitar o reparo.

A empresa não pode aplicar sanções contra as companhias telefônicas que deixam fios soltos, diz Simonaggio, mas tem levado questões do tipo à Comissão de Resolução de Conflitos da Anatel e Aneel, agências reguladoras dos setores de telecomunicações e energia elétrica.

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