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Doria deixa obras de corredores de ônibus de SP em marcha lenta

Tucano tira R$ 716 milhões de pistas exclusivas e prioriza recapeamento

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São Paulo

O prefeito João Doria (PSDB) retirou do Orçamento, em seus 15 meses de mandato, R$ 716 milhões que seriam destinados para construir corredores de ônibus em São Paulo —valor suficiente para implantar quase 30 km de novas pistas exclusivas.

O tucano, que deixará a prefeitura no começo de abril para ser candidato ao governo paulista, não começou a tirar do papel nem um quarto das obras prometidas, e projetos estratégicos estão emperrados —como na Radial Leste.

Esse cenário de investimentos em marcha lenta ocorre ao mesmo tempo em que a gestão Doria prepara novos contratos com as empresas de ônibus na capital paulista estimados em R$ 66 bilhões por 20 anos. O edital definitivo deve ser publicado em abril.

O novo modelo prevê uma reorganização controversa do sistema, que deve afetar a rotina de milhões de usuários.

Na prática, 25% das linhas sofrerão mudanças, a frota perderá 936 ônibus (redução de 7%) e a quantidade de baldeações vai aumentar 4%.

A gestão Doria diz que, mesmo assim, os serviços vão melhorar devido à reorganização do transporte, com queda de 5% no tempo de viagens.

O novo sistema, no entanto, foi projetado sem prever nenhum quilômetro a mais de faixas exclusivas do transporte coletivo, consideradas fundamentais por especialistas para melhorar a eficiência e dar agilidade aos ônibus.

METAS

No plano de metas divulgado no início da gestão, a prefeitura prometia entregar 72 km de corredores até 2020.

Para 2017, a prefeitura previa no Orçamento R$ 595 milhões para essas obras, mas gastou só R$ 43 milhões. Em 2018, dos R$ 542,5 milhões previstos, só R$ 8,7 milhões foram liquidados até agora.

Levantamento da Folha em publicações do Diário Oficial mostra que Doria já remanejou pelo menos R$ 716 milhões do previsto em construção de corredores de ônibus.

A SPTrans (empresa municipal de transporte) diz que os remanejamentos de verba são “prática comum no Orçamento municipal” e que “não acarretam prejuízo à implantação dos corredores”.

O dinheiro foi remanejado  em operações de crédito suplementar para as mais diversas áreas. A maior movimentação ocorreu em fevereiro, quando a prefeitura retirou R$ 192 milhões dos corredores e destinou à pavimentação e recapeamento de vias. Na sexta (23), a gestão autorizou a retirada de mais R$ 110 milhões para esse mesmo fim.

Na soma, isso representa 55% do recurso previsto no programa Asfalto Novo, uma aposta de curto prazo de Doria neste ano de eleições.

Outros remanejamentos incluíram a compra de materiais para farmácias e hospitais, obras para controle de cheias, limpeza urbana e até aumento de capital de empresas da prefeitura como a SP Turismo e a SP Urbanismo.

De 24 remanejamentos de verba da prefeitura identificados pela Folha, 22 foram com recurso que seria destinado a obras e instalações dos corredores de ônibus. As outras duas áreas que perderam dinheiro foram aquisição de imóveis e pagamento de serviços terceirizados.

2021

Importantes obras anunciadas na cidade estão paradas ou nem sequer começaram. Segundo a Folha apurou, devem ter pouco espaço no foco da prefeitura para 2018.

O corredor Radial Leste 1, por exemplo, está parado desde 2016, ainda na gestão Fernando Haddad (PT), após o Tribunal de Contas da União suspender o repasse de recursos federais. A SPTrans diz que trabalha no desenvolvimento de um novo projeto para a via, que liga a avenida Aricanduva ao parque D. Pedro 2º, no centro da cidade.

O corredor Leste-Aricanduva também está suspenso, desde a gestão anterior. A requalificação do corredor João Dias-Capelinha ainda está em captação de recursos com o BNDES, diz a SPTrans.

Em curso na cidade há só dois trechos do corredor Itaquera. Um, de 6 km, do terminal Carrão à praça Francisco Daniel Lopes, está previsto para ser entregue só em 2020. Outro, de 8 km, tem previsão de entrega só para 2021, junto do novo terminal de ônibus de Itaquera —ou seja, depois do fim da atual gestão.

Para Francisco Christovam, presidente do SP Urbanuss (sindicato de empresas de ônibus de SP), “é muito difícil melhorar o transporte sem construir corredores”.

“O que adianta ter veículo bom, sistema eficaz, gente capacitada, mas eu não tenho infraestrutura, meu ônibus fica no engarrafamento?”

Há hoje 12 corredores de ônibus na cidade, com 128,7 km de extensão. Em fevereiro, a atual gestão entregou o último trecho do corredor Berrini, com 3,3 km —menos de 5% do total prometido por Doria.

Pela promessa do tucano, nos corredores circulariam veículos no sistema de BRT (transporte rápido de ônibus), apelidado pelo prefeito de “Rapidão”, com embarque rápido, cobrança de bilhetes na plataforma do ponto de ônibus, áreas de ultrapassagem e via exclusiva. A ideia, no entanto, pouco avançou.

A construção de corredores de ônibus também emperrou em gestões anteriores. Haddad (2013-2016), por exemplo, prometeu fazer 150 km, mas entregou 42 km.

Sem a verba federal prometida e com contratos suspensos pelo TCU, apostou em 420 km faixas exclusivas, à direita das pistas, mais baratas. De 2009 a 2012, Kassab fez 11,8 km de 66 km propostos.

OUTRO LADO 

A gestão Doria diz manter a meta de implantar 72 km de corredores de ônibus até 2020 e afirma prever uma melhoria dos serviços com a nova licitação do sistema em São Paulo.

Em relação ao esvaziamento das verbas para essas obras no Orçamento, a SPTrans (empresa municipal de transporte) diz que remanejamentos são prática comum e que “as alterações são definidas pela Secretaria da Fazenda”.

“Esta alteração não acarreta qualquer prejuízo à implantação de corredores na cidade”, afirma em nota.
Segundo a SPTrans, a verba para construir corredores de ônibus estará mantida com recursos provenientes do Fundo Municipal de Desenvolvimento de Trânsito.

A gestão Doria diz que a licitação de ônibus “não prevê ampliação de corredores porque seu objeto é o serviço de sistema de transporte coletivo”. Ela afirma que “a nova rede projetada considera a infraestrutura já existente na cidade, e não obras futuras”.

A SPTrans diz que a mudança no sistema permitirá que ônibus cheguem a mais ruas da cidade e reduzirá o tempo de viagem, além de aumentar a oferta de assentos nos veículos com “com mais ônibus menores circulando nos bairros e mais ônibus maiores nas grandes vias”.

A Folha pediu entrevista com o secretário Sergio Avelleda (Transportes) para tratar desse tema e buscar mais detalhes dos argumentos da gestão, mas não foi atendida.

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