Igreja acusada de maus-tratos vira ré em caso de trabalho escravo

Ação civil pública pede dissolução da entidade e de colégio; pastores não comentam

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São Paulo
Culto no templo da igreja Rhema, localizada em Franco da Rocha, Grande São Paulo
Culto no templo da igreja Rhema, localizada em Franco da Rocha, Grande São Paulo - Adriano Vizoni/Folhapress

Igreja acusada de submeter fiéis —inclusive menores de idade— a trabalho forçado, o Ministério Evangélico Comunidade Rhema virou réu em ação movida pelo Ministério Público do Trabalho.

A ação civil pública, ajuizada pela procuradora Andrea da Rocha Carvalho Gondim, processa a igreja, os pastores que a fundaram —Juarez de Souza Oliveira e sua mulher, Solange da Silva Granieri Oliveira— e o colégio ligado à Rhema.

A procuradora pede que igreja e colégio sejam suspensos preventivamente e depois dissolvidos definitivamente, por desvio de finalidade. 

Segundo Gondim, os depoimentos colhidos na investigação apontam para trabalho não remunerado mediante pressão psicológica e coação.

O casal Oliveira e seu filho, advogado deles, não falaram.

No processo, afirmam a existência de trabalho não remunerado no colégio, mas dizem que os fieis que participavam eram voluntários e negam exploração e coação.

A procuradora diz que não é possível falar em trabalho voluntário: “As ameaças de castigo e exclusão da comunidade são claras. Trabalho escravo não é só o acorrentado, mas o que tira a livre autodeterminação”.

A ação civil pública foi necessária, segundo Gondim, porque a direção da igreja se negou a assinar termo de ajustamento de conduta para regularizar a situação de seus funcionários e indenizar as perdas passadas.

O trabalho irregular, segundo a ação, acontecia também em empresas de diretores da igreja (uma serralheria, uma fábrica de moldura e um salão de cabeleireiros). 

Os empresários “se utilizariam dos ‘pecados’ dos fiéis como desculpa para não pagamento ou atraso de direitos trabalhistas”.

Na ação da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, fiéis descrevem terem sido forçados a trabalhar também para a Word of Faith, igreja localizada em Spindale, nos Estados Unidos.

A Procuradoria afirma haver sinais claros de ligação entre a Rhema e a Word of Faith e pedem que se investigue financiamento de qualquer tipo entre as igrejas, “porque ninguém abriria mão da própria autonomia em nome de um pastor de outro país, se não houvesse benefício mútuo, inclusive financeiro”.

A ação cita casos de alunos que terminaram o ensino médio e foram impedidos pelos pastores de entrar na faculdade porque deveriam antes prestar trabalho voluntário na igreja dos EUA.

As empresas americanas Two Mille Supply, Plastic Oddites, Inter e Integraty são citadas por explorar a mão de obra gratuita dos membros.

Castigos frequentes

Depoimentos colhidos pelo Ministério Público falam em alunos proibidos de frequentar aulas e castigados com golpes de régua de madeira nos quadris, dados pela própria pastora Solange.

Os alunos do período matutino, segundo os depoimentos, “eram escalados para capinar ou trabalhar em outros reparos do local à tarde e até mesmo em mutirão noturno” e “as crianças eram ensinadas a não argumentarem nem questionarem”.

A investigação aponta que o colégio Rhema tem 25 professores, dos quais apenas 3 são registrados.

Embora os fiéis trabalhassem de graça, há registro de pagamentos de salários para pastores e diretores da igreja, com valores que vão de R$ 3.000 a R$ 5.000.

A ação também cita a transferência para os pastores de dois terrenos que haviam sido comprados pelo coletivo dos fieis, à revelia deles. A operação foi revelada pela Folha no ano passado.

Sala de aula do colégio da igreja Rhema, em Franco da Rocha, Grande São Paulo
Sala de aula do colégio da igreja Rhema, em Franco da Rocha, Grande São Paulo - Adriano Vizoni/Folhapress
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