'Não é uma peça de defesa', diz repórter autor de livro sobre o caso Isabella

Em 'O Pior dos Crimes', Rogério Pagnan aponta falhas no processo que condenou pai e madrasta da garota

Débora Sögur Hous
São Paulo

Para o repórter da Folha Rogério Pagnan, “O Pior dos Crimes” não é uma peça de defesa nem de acusação. “Meu livro é um trabalho jornalístico, que defende o bom jornalismo, sem se apoiar apenas em declarações.”

Como parte do lançamento da obra, Pagnan participou de uma conversa com o advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho, realizada na última segunda (26), no teatro Eva Herz, no Conjunto Nacional, região central de São Paulo.

Isabella foi morta em 29 de março de 2008, aos 5 anos, depois de ser atirada da janela do apartamento do pai, Alexandre Nardoni, e da madrasta, Anna Carolina Jatobá. O casal foi julgado em 2010 e cumpre pena em Tremembé; ele, condenado a 31 anos, segue em regime fechado, enquanto ela, condenada a 26 anos, está em semiaberto desde julho do ano passado. 

Pagnan diz ter escrito o livro porque o julgamento não respondeu a muitas perguntas que permaneceram em sua cabeça. O repórter não defende a inocência de ambos, mas considera o processo que os condenou inconsistente e as provas frágeis.

Na cobertura do caso desde o início, ele chegou a ser convocado a depor como testemunha de defesa dos Nardoni, após publicar reportagem em que o pedreiro de uma obra vizinha afirmava ter visto alguém fugindo pelo local na noite do crime.

“O jornalista Rubens Valente [repórter da Folha em Brasília, que assina a orelha do livro] me disse uma vez que, quando uma pessoa repete todo o tempo que é inocente, você precisa pelo menos parar para ouvi-la, ainda que não acredite no que ela fala. É um dos princípios fundamentais da isenção jornalística.”

Para o repórter, faltou isenção na cobertura, e a pressão pelo furo e pela audiência, aliada à confiança exagerada dos jornalistas em policiais e promotores, resultou em erros graves de apuração.

Como exemplo, menciona uma reportagem da revista Veja que apontava a existência de imagens de Alexandre Nardoni batendo na filha diante de várias pessoas no dia do crime. As informações, vazadas por policiais da delegacia que trabalhava no caso, eram falsas.

“Ainda que a Veja tenha desmentido a história, muitas pessoas acreditam até hoje que isso tenha ocorrido. Quando uma mentira é disseminada, reverter essa situação é muito difícil.”

Augusto Botelho, advogado e conselheiro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), também criticou o excesso de confiança da imprensa em quem faz o papel de acusador. “Ouvir o lado do acusado não implica defendê-lo, possibilita que ele se defenda.”

CASAQUINHO BRANCO

O livro começa lembrando o caso de uma australiana que foi condenada por matar a filha num acampamento em 1980. A mãe jurava inocência e contava que o bebê havia desaparecido na noite que um dingo —espécie de cão selvagem— rondava a barraca da família.

Em 1986, a polícia achou um casaquinho branco do bebê na toca de vários dingos, que ficava próxima ao acampamento onde a família estava quando a criança desapareceu.

Pagnan não descobriu nenhum casaquinho branco no caso dos Nardoni, mas encontrou uma informação que não existe no processo e que poderia, segundo ele, sustentar uma nova versão do crime. “Quem ler o livro poderá julgar.”

O AUTOR

Rogério Pagnan, 47, é repórter da Folha desde 2000. Ganhou o Prêmio Folha de Reportagem de 2012 e o Prêmio Latino-Americano de Jornalismo de Investigação de 2017, organizado pelo Instituto de Prensa y Sociedad (IPYS) e pela ONG Transparência Internacional.

 

O Pior dos Crimes — A história do assassinato de Isabella Nardoni
AUTOR: Rogério Pagnan
EDITORA: Record (336 págs)
QUANTO: R$ 26,50 (Google Play), R$ 38,90 (Livraria da Folha)

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