Nomeado por Doria, novo comandante da Guarda é réu por desvio de dinheiro

Segundo Procuradoria, Carlos Braga atuou em desvio de mais de R$ 200 mil de recursos públicos

Guilherme Seto Paulo Gomes
São Paulo

Nomeado no mês passado comandante geral da Guarda Civil Metropolitana pela gestão João Doria (PSDB), Carlos Alexandre Braga é réu sob a acusação de desvio de dinheiro público e falsificação e uso de documento público falso.

O inspetor também responde a ação civil pública por improbidade administrativa. Ele é acusado pelo Ministério Público Federal de ter participado de esquema de desvio de mais de R$ 200 mil de verbas federais por meio de convênio fraudulento entre a associação que ele presidia e a Prefeitura de Paraguaçu Paulista (422 km de São Paulo).

O atual comandante geral da GCM, Carlos Alexandre Braga (direita) ao lado do prefeito João Doria (PSDB), de seu predecessor, Adelson de Souza e do secretário da Segurança Urbana, José Roberto Rodrigues de Oliveira
O atual comandante geral da GCM, Carlos Alexandre Braga (direita) ao lado do prefeito João Doria (PSDB), de seu predecessor, Adelson de Souza e do secretário da Segurança Urbana, José Roberto Rodrigues de Oliveira - Reprodução/Facebook

O comandante da GCM paulistana ainda não apresentou sua defesa no processo. Questionada, a Prefeitura de São Paulo ressaltou não ter havido ainda condenação (leia mais abaixo). Caso seja considerado culpado nos termos em que foi denunciado pela Procuradoria, Braga poderá pegar de 6 a 24 anos de prisão —ainda que a pena máxima seja improvável levando em conta os valores envolvidos. Além disso, poderá ter seus direitos políticos suspensos por até cinco anos e ter que pagar multa de até duas vezes a quantia supostamente desviada.

 

Capacitação

Em 2007, Braga era presidente da Associação das Guardas Municipais do Estado de São Paulo, que naquele ano venceu licitação da Prefeitura de Paraguaçu Paulista para elaborar medidas relacionadas à segurança urbana, incluindo um curso de capacitação para guardas.

A proposta de preço da associação foi de R$ 222.560. O prazo entre a publicação do aviso de licitação e a vitória da associação foi de menos de um mês. Isso gerou reclamações de outros interessados, que não tiveram tempo hábil para providenciar a documentação necessária, e levantou suspeita da Procuradoria de uma "tomada de preços direcionada".

A partir da assinatura do contrato, conforme a denúncia, os réus passaram "a simular a realização de um curso de capacitação de guardas municipais (...) com vistas a desviar os recursos obtidos dos cofres federais". O contrato foi assinado em novembro de 2007. Menos de um mês depois, segundo nota fiscal de serviços obtida pelo Ministério Público, a associação declarava ter ministrado 500 horas-aula do curso de capacitação e 173 horas-aula de oficinas comunitárias.

O texto da ação civil aponta as incongruências nestes números: em 20 dias úteis, "somados os cursos teóricos e as oficinas comunitárias, obtém-se a marca absurda de 33,65 horas-aula por dia." No 14 de janeiro seguinte, uma nova nota fiscal da AGMESP registra mais 400 horas-aula do curso de capacitação e outras 140 horas-aula de oficinas —com 31,76 horas-aula por dia.

"O curso de capacitação tinha carga horária quase que equivalente à metade de um curso de direito. Nada obstante, de acordo com as notas fiscais de serviço emitidas pela AGMESP, teria sido concluído em apenas 60 dias úteis", diz a ação civil. Ela é assinada pelo procurador da República em Assis Leonardo Augusto Guelfi, que também apresentou a denúncia segundo a qual 1.680 horas-aula teriam sido simuladas, enquanto só 40 horas teriam sido ministradas. O curso, de acordo com a Procuradoria, não passou de "um teatro armado para desviar recursos federais".

Listas em branco

Três guardas de Paraguaçu Paulista deram depoimentos no inquérito policial em que dizem ter recebido diversas listas de presença em branco para serem assinadas. Eles disseram não ter feito mais do que duas semanas de aulas, com cargas de "no máximo três horas por dia". "Os guardas eram obrigados a assinar as listas de presença sem terem assistido a qualquer aula do curso", diz a denúncia, citando a suposta falsificação de documentos.

A ação é movida pela Procuradoria porque em 2006 a Prefeitura de Paraguaçu Paulista celebrou convênio com a União para investimentos em segurança, tendo recebido R$ 226.359 do governo federal. De acordo com a denúncia, Braga e outros réus "desviaram, continuadamente, em proveito próprio e alheio, recursos federais (...) oriundos do Ministério da Justiça".

A Procuradoria também diz que a oferta de curso da AGMESP se destinava a 50 guardas, sendo que havia só 35 guardas no município. Entre os nomes que constavam nas listas de presença, ao menos quatro não fariam mais parte dos quadros da cidade.

O inspetor Braga recebeu elogio público do secretário da Segurança Urbana da gestão Doria, José Roberto Rodrigues de Oliveira, por meio do "Diário Oficial" do último dia 24, por sua atuação no comando da guarda durante o Carnaval. Braga está na guarda desde 1987, tendo se formado e pós-graduado em direito. Ele também fez cursos da Swat (polícia de elite norte-americana) nos Estados Unidos.

Além de presidente da AGMESP, é filiado ao PTB e foi secretário de Segurança de Cosmópolis (115 km de São Paulo) de 2010 a 2016.

Outro lado

A gestão João Doria (PSDB) afirma não haver decisões da Justiça que pudessem ter inviabilizado a nomeação do inspetor Carlos Alexandre Braga ao comando da GCM (Guarda Civil Metropolitana). "Não existe nenhuma decisão judicial condenatória que impeça Braga de exercer funções públicas", diz nota enviada pela Secretaria Municipal de Segurança Urbana.

"O processo judicial citado se refere a fatos que teriam ocorrido em 2007, no município de Paraguaçu Paulista, e se encontra na primeira instância, ainda sem condenação", completou a pasta.

O inspetor, segundo a pasta, já exerceu antes na Guarda Civil Metropolitana as funções de comandante regional, operacional, superintendente e subcomandante.

A reportagem questionou qual é a defesa do comandante diante das acusações de desvio de mais de R$ 200 mil de recursos da União, falsificação de documento público, uso de documento falso e improbidade administrativa, mas não obteve resposta. Pediu também uma manifestação do comandante Braga sobre a denúncia, porém também não foi atendida.

Colaborou DAVID LUCENA, de São Paulo

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