Pressão faz base de Doria adiar votação de reforma da previdência

Vereadores pedem debates e mudanças no projeto; professores estão em greve

Servidores municipais durante passeata em São Paulo
Servidores municipais durante passeata em São Paulo
Servidores municipais durante passeata em São Paulo - Diego Padgurschi - 15.mar.2018/Folhapress
Guilherme Seto
São Paulo

A pressão dos servidores públicos nas últimas semanas surtiu efeito, e os vereadores da base aliada de João Doria (PSDB) decidiram adiar a primeira votação do projeto de reforma da previdência.

Prevista inicialmente para a semana que vem, ela será postergada pelo menos até a outra semana. Nesse ínterim, a base aliada tentará conseguir mais votos (são necessários 28 dos 55 para a aprovação), sugerirá alterações no projeto de lei mandado pelo Executivo e promoverá mais eventos públicos para discutir o tema. Atualmente, calcula-se que pouco mais de 20 vereadores apoiem a reforma da previdência, que precisa ser aprovada em dois turnos antes de seguir para a sanção do prefeito.

Alguns vereadores que em 2017 apoiaram a maior parte dos projetos de Doria têm se mostrado contrários ao texto da reforma da previdência municipal. É o caso de Cláudio Fonseca (PPS), Celso Jatene (PR), Camilo Cristófaro (PSB), Eliseu Gabriel (PSB) e Police Neto (PSD), entre outros que ainda não tornaram públicas suas posições para não se indisporem com o prefeito, que deve deixar o cargo no início de abril para disputar a eleição ao governo do estado pelo PSDB. Doria está no cargo há 15 meses.

"A proposta apresentada pela gestão Haddad [PT] era absolutamente superficial. O texto sugerido pela gestão Doria [PSDB] carece de sustentação jurídica e constitucional", disse Police Neto (PSD), que ressalta, contudo, que está acompanha o debate à distância, enquanto faz curso na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.

"Precisa de mais debate. Da forma como está, penaliza-se muito os servidores que recebem muito pouco. A discussão precisa ser feita ao longo do tempo, não pode ser de uma vez", diz Eliseu Gabriel (PSB).

Líder do governo na Câmara, o vereador João Jorge (PSDB) afirma que já solicitou ao presidente da Câmara, Milton Leite (DEM), que o projeto não seja colocado na pauta da Casa na semana que vem.

"É uma demonstração de sensibilidade do governo diante das manifestações dos servidores e dos próprios vereadores durante a semana, que foram importantes. Se foi sentida a necessidade de mais debates e de divulgação, é o que vamos fazer. Vamos perder uma semana de tempo, mas vamos ganhar com debates e divulgação", disse.

Um grupo de seis vereadores da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, que aprovou o projeto na quarta-feira (14), solicitou às secretarias da Fazenda e de Gestão que avaliassem a retirada da alíquota complementar de 5% do projeto de lei.

Liderados pelo vereador Eduardo Tuma (PSDB), eles pedem mais divulgação do projeto de reforma por parte da gestão Doria. Os funcionários públicos têm se queixado de falta de diálogo e de transparência.

"Os próprios vereadores pediram para o Executivo fazer divulgação mais ampla do projeto de reforma e, atendendo os requerimentos feitos em audiência pública na CCJ, pedimos também para avaliar a possibilidade de cortar os 5% da alíquota suplementar", diz Tuma.

"O que vai acontecer é que haverá um montante de milhões a menos e vai demorar mais para diminuir o deficit. Fizemos um pedido de estudo da retirada da alíquota. Não é só para inglês ver", completa.

Também apoiador da solicitação, João Jorge (PSDB) diz que a alíquota de 5% é o principal entrave atualmente para os vereadores. "O resto está praticamente pacificado".

Relator do projeto, Caio Miranda (PSB) acredita que a prefeitura deveria se dedicar mais a divulgar o projeto. Ele é um dos signatários da solicitação. "Acho que o governo está com prioridade total com o projeto, e isso está interferindo no processo. A velocidade não está permitindo que as pessoas entendam. Estão recebendo muita informação direcionada. Eu defendo a reforma porque o sistema atual é injusto e perverso. Custa muito para o servidor e para o munícipe", diz.

"Tem que haver esforço do Executivo de se reunir com os servidores, fazer cartilha, mandar para a Câmara, porque senão fica como se fosse vontade da Câmara o projeto", completa.

Há uma semana, em entrevista à Folha, o presidente da Câmara, Milton Leite (DEM), principal aliado do prefeito no Legislativo, disse que o "checklist" apontava para um número suficiente de votos naquele momento para aprovar o projeto em primeiro turno, o que indica que a pressão feita pelos servidores municipais tem surtido efeito sobre parte dos vereadores.

Secretário de Gestão de Doria, Paulo Uebel diz que a alíquota complementar de 5% é indispensável para o projeto, e que sua retirada não é cogitada no momento. "A nossa proposta precisa dessa alíquota. Se tirá-la, vamos deixar de resolver R$ 330 milhões de deficit por ano. É um valor significativo. Queremos que o projeto seja aprovado na íntegra", afirma.

Sobre o pedido de mais debates, Uebel ressalta que o tema tem sido discutido desde 2016, durante a gestão Haddad, e que afirma que "não importa quantos anos de debates, os sindicatos não vão mudar de opinião".

O dia 31 de março é o prazo máximo estabelecido pela gestão Doria para sanção do projeto de lei.

Na próxima semana, a Prefeitura de São Paulo começará uma campanha em canais de TV para tentar angariar apoio de servidores a favor da reforma da previdência e para também ajudar a conter o desgaste de vereadores com a eventual aprovação do projeto.

GREVE

Os servidores públicos fizeram duas grandes manifestações em frente à Câmara Municipal ao longo da semana. Na primeira delas, na quarta-feira (14), diversos saíram feridos após confusão com a Guarda Civil Metropolitana e a Polícia Militar. 

Na segunda, na quinta -feira (15), o clima foi tenso, com dezenas de milhares de servidores presentes, mas sem incidentes violentos. Segundo levantamento da própria prefeitura, mais de 90% das escolas municipais têm funcionários em greve.

O texto da reforma, em trâmite na Câmara, prevê a elevação da contribuição previdenciária de 11% para 14%, além da instituição de contribuição suplementar vinculada ao salário do servidor. Assim, o desconto poderá chegar a 18,2%, segundo a prefeitura. A prefeitura defende que, sem a alteração, a sustentabilidade da previdência municipal é inviável.

Um projeto de lei de mudança no sistema fora encaminhado à Câmara pelo ex-prefeito Fernando Haddad (PT) em 2015. Após protestos, Haddad retirou o projeto em agosto de 2016, mas o reencaminhou no fim daquele —o último do seu mandato. Doria protocolou em dezembro do ano passado um novo texto ao projeto. 

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