Ato contra previdência de SP tem confronto e professores feridos

Doria tenta aprovar mudança na contribuição de funcionários 

São Paulo

Um protesto de professores e outros funcionários municipais contra a reforma da previdência paulistana proposta pelo prefeito João Doria (PSDB) terminou em confronto com guardas-civis e PMs, além de manifestantes feridos na Câmara de São Paulo.

Em meio a debates inflamados e tentativas de obstrução do projeto, docentes foram atingidos dentro da Casa por spray de pimenta e uma série de golpes de cassetete de agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana). Com fratura no nariz, uma servidora foi levada ao hospital com seu rosto ensanguentado.

Já manifestantes que estavam do lado de fora do prédio lançaram pedras, quebraram vidros e tentaram invadir a Câmara depois do fechamento do acesso. Foram atingidos por bombas de efeito moral lançadas pela Polícia Militar.

O tratamento aos professores no Legislativo foi atacado em rede social pelo secretário da Educação da gestão Doria, Alexandre Schneider, para quem "é inaceitável que se cometam excessos dessa natureza". "Estamos em uma democracia. E ela pressupõe livre direito de manifestação."

O prefeito, por sua vez, que deve sair do cargo no começo de abril para ser candidato ao governo paulista, afirmou ter havido excessos das duas partes —guardas e manifestantes—  e enfatizou críticas à tentativa de invasão da Câmara.

"Nenhuma invasão se justifica. Invadir o legislativo não é um ato que mereça ser aplaudido. Não é um ato correto", afirmou. "O que não justifica nenhum tipo de violência, nem da parte que invade, nem da parte que é invadida."  

confusão ocorre num momento de resistência crescente ao projeto de reforma da previdência municipal, que motiva uma greve de professores desde quinta (8). 

A adesão ao movimento cresceu nesta semana e, nesta quarta (14), a própria prefeitura estimava que 82% das escolas ligadas à gestão direta estavam total (39%) ou parcialmente (43%) paralisadas.

O projeto de Doria prevê elevar a contribuição dos servidores com a justificativa de cobrir um déficit que poderia atingir R$ 20,8 bilhões em 2025.

O texto foi aprovado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara nesta quarta. Mas a tentativa de Milton Leite (DEM), presidente do Legislativo e aliado de Doria, de abrir sessões extraordinárias para deixá-lo pronto para votação em plenário na próxima terça (19) acabou fracassada.

Vereadores da própria base aliada do prefeito saíram da Câmara devido à confusão, e não houve quórum.

Com isso, a proposta ainda terá que passar pelas comissões de administração pública e de finanças, além de ser debatido em plenário antes de ser votado.

A gestão Doria estabelece 31 de março como prazo máximo para sanção do projeto.

Nesta quinta (15), está prevista audiência pública na Câmara para debate da proposta. O sindicato dos professores programou ato no local.

madrugada

A manifestação diante da Câmara reuniu uma multidão de servidores desde a manhã —parte acampou em frente ao prédio na madrugada. O Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo (Sindpeem) disse ter reunido 15 mil pessoas.

O Legislativo liberou a entrada de professores ao salão onde ocorria a sessão da CCJ e a um auditório externo. Após tumulto, porém, a GCM fechou a entrada, e manifestantes fizeram um cerco ao prédio e tentaram invadi-lo.

Um grupo que tentou entrar pelos fundos do edifício foi recebido com gás de pimenta por guardas-civis.

"Ficamos acuados, era um corredor apertado e em nenhum momento fizemos uso de força. Nunca tinha me sentido tão agredida", disse Juliana dos Reis Domingues, 36, diretora de uma escola municipal no Jabaquara (zona sul).

Membro da direção do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo, João Gabriel Buonavita, 32, queixou-se de truculência de guardas e policiais. “O primeiro conflito começou dentro da CCJ, quando a guarda agiu com truculência e uma funcionária saiu ferida. Na frente da Câmara, a GCM e a tropa de choque jogaram bombas e assustaram o pessoal que estava com familiares”, disse.

Buonavita relata ainda ter visto pessoas passando devido o uso de bombas de efeito moral e um servidor sendo atingido por uma bala de borracha. 

O vereador Cláudio Fonseca (PPS), presidente do Sindpeem, condenou a atuação da GCM e avaliou o efeito político do conflito para os planos de Doria. “Não sei para que serve isso se não for para dar um exemplo de intolerância por parte daqueles que querem aprovar a qualquer custo um projeto que retira direitos dos trabalhadores. É como se tivessem que ficar calados mesmo que tirem parte do salário deles”, disse. “O custo político de passar a reforma da Previdência com sangue é muito alto para um prefeito que quer disputar uma eleição para governador”, completa.

O líder do governo, vereador João Jorge (PSDB), disse que manifestantes atiraram uma garrafa de água e um sapato contra ele na Câmara.

 

"A segurança pública tem que fazer valer seu trabalho (...) senão apenas um lado vai chegando, agredindo, e as pessoas poderiam eventualmente sofrer alguma agressão física", disse Jorge.

Após empurra-empurra dentro do prédio, guardas que estavam com escudos desferiram golpes de cassetete contra os servidores.

Professor de carreira e funcionário do gabinete da vereadora Sâmia Bomfim (Psol), Bruno Magalhães, 33, diz ter sido atingido por dois tiros de bala de borracha ao tentar ajudar "professores idosos" a sair. Magalhães teve que tomar sete pontos na cabeça em uma unidade de saúde.

O defensor Carlos Weis disse que a Defensoria Pública vai solicitará imagens para pedir indenização às vítimas.

A PM afirmou que ficou só do lado de fora da Câmara e que a intervenção foi necessária devido ao tumulto, mas que ninguém foi detido. 

Questionada pela reportagem, a GCM não se manifestou. A Câmara Municipal informou, por sua assessoria, que eventuais excessos das forças de segurança serão apurados. 

 
 

REFORMA

O texto da reforma, em trâmite na Câmara, prevê a elevação da contribuição previdenciária de 11% para 14%, além da instituição de contribuição suplementar vinculada ao salário do servidor. Assim, o desconto poderá chegar a 18,2%, segundo a prefeitura. A prefeitura defende que, sem a alteração, a sustentabilidade da previdência municipal é inviável.

Um projeto de lei de mudança no sistema fora encaminhado à Câmara pelo ex-prefeito Fernando Haddad (PT) em 2015. Após protestos, Haddad retirou o projeto em agosto de 2016, mas o reencaminhou no fim daquele —o último do seu mandato. Doria mandou em dezembro passado um novo texto ao projeto e pretende votar na próxima semana.

Por causa do projeto, o Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo) estima que 60% dos funcionários públicos municipais aderiram à greve –a entidade ainda faz um balanço das repartições fechadas na cidade.
 
Dentre elas, figuram as prefeituras regionais de Freguesia do Ó, Campo Limpo, M’Boi, Parelheiros, São Mateus, São Miguel Paulista, Pinheiros e Ermelino Matarazzo.

Segundo o sindicato, também houve paralisação de funcionários de unidades vigilância em saúde, centros de controle de zoonoses e postos de saúde, além de alguns hospitais municipais terem operado com quadro reduzido. 

A Secretaria Municipal de Saúde afirmou que a paralisação se limitou a alguns médicos em poucas unidades de saúde, "sem prejuízo ao atendimento da população". A pasta negou que profissionais de hospitais tenham parado. Além disso, informou que 700 agentes de controle de endemias aderiram à greve 30% do quadro municipal.

Mas a maior adesão é do sindicato dos professores. Segundo a própria gestão Doria, o funcionamento de 93% das escolas municipais foi afetado.

Guilherme Seto, Fabrício Lobel e Antonio Mammi
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