Chefe da Polícia Civil deixa cargo e ataca novo governador de São Paulo

Delegado-geral fala em interferência externa, em recado a Márcio França

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Delegado-geral da Polícia Civil, Youssef Abou Chahin, em entrevista coletiva no DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa)
Delegado-geral da Polícia Civil, Youssef Abou Chahin, em entrevista coletiva no DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) - Marivaldo Oliveira - 20.out.17/ Codigo19/ Folhapress
 
São Paulo

​O chefe da Polícia Civil de São Paulo, Youssef Abou Chahin, pediu demissão do cargo e, em carta de despedida, mandou um recado indireto ao governador Márcio França (PSB) em que aconselha aqueles que querem interferir na instituição a prestarem concurso para delegado.

"Aliás, se quiserem aproveitar, o concurso foi autorizado e as inscrições encontram-se abertas", escreveu Chahin, que era delegado-geral do governo Geraldo Alckmin (PSDB) desde janeiro de 2015 e decidiu se aposentar.

A mensagem com críticas à interferência externa na Polícia Civil —e na qual França não chega a ser citado nominalmente— foi enviada por ele a um grupo de policiais logo após a renúncia do tucano.

O posicionamento ocorreu antes mesmo do interesse manifestado pelo governador de fazer mudanças na pasta da Segurança Pública. França será candidato nas próximas eleições, buscando se manter no comando do estado.

Em sua carta, Chahin critica os subordinados "sem competência reconhecida" que buscam padrinhos para ocuparem cargos de interesse e afirma que vê objetivos "escusos" nesses profissionais.

O então delegado-geral diz que nos anos como chefe da Polícia Civil, na gestão Alckmin, conseguiu barrar tais movimentos políticos e conseguiu "o inédito apoio total à independência funcional da Polícia Civil Bandeirante".

"Meu objetivo seria dirigir uma Polícia Civil de Estado e não de governo, visando, obviamente, retirar as influências externas da instituição e prestigiar os policiais comprometidos com a administração pública", afirma ele.

Sobre os motivos que o levaram a deixar o cargo, Chahin afirma na carta que tomou a decisão porque França declarou a intenção de "escolher os cargos de confiança".

Por isso, diz, ele disse que deixava o governador "totalmente à vontade para montar sua equipe de trabalho" —e disse desejar "todo êxito" para a nova administração.

Pessoas próximas a Chahin dizem que a decisão dele de deixar o cargo buscou antecipar eventual retaliação por parte do novo governador —devido a pedidos que não teriam sido atendidos no período em que França era vice. 

O governador nega qualquer interferência na polícia, defende a independência da instituição e diz que Chahin saiu do cargo por decisão própria, para se aposentar. "Não posso ter feito interferência política porque nem deu tempo ainda", disse França.

Nos últimos dias, ele chegou a cogitar uma mudança drástica na organização das polícias paulistas, com maior separação entre Militar e Civil. A primeira continuaria atrelada à pasta da Segurança Pública, enquanto a segunda iria para a da Justiça.

A ideia era defendida por entidades de delegados. Após resistência interna e de órgãos da sociedade civil, França decidiu estudá-la melhor.

CÚPULA

Procurado pela Folha, o ex-delegado-geral não quis comentar a carta. Disse que está aposentado da Polícia Civil. Chahin se tornou delegado-geral em 2015 a convite do então secretário da Segurança, Alexandre de Moraes, e permaneceu na gestão do atual, Mágino Alves Barbosa Filho.

A saída dele por enquanto é a única mudança na cúpula da Segurança na nova gestão Márcio França —permanecem nos cargos tanto Mágino quanto o comandante da PM, Nivaldo Restivo, e o superintendente da Polícia Científica, Ivan Miziara.

Pessoas ligadas ao ex-delegado-geral dizem que, como vice-governador, França teria sido tentado indicar policiais para cargos de prestígio.

O atual governador negou à Folha essa informação. Ele disse que jamais fez qualquer indicação de cargo na Polícia Civil na sua histórica política e que nunca teve contato com o então delegado-geral. "Eu nunca nem falei com ele [Chahin]. É mentira. Ele pediu demissão antes de eu assumir", disse. "Se tive contato com ele, foi uma vez em Santos, que ele é meu vizinho de frente. Ele tem uma casa enorme lá, com piscina."

"Aliás, eu tenho uma tradição histórica, desde que eu fui deputado, prefeito, nunca me menti com um delegado, nunca indiquei nenhum delegado, nunca indiquei nenhum policial civil". 

França disse, ainda, que desconhece os motivos que levaram o delegado-geral a pedir demissão. "O que o Mágino me disse é que ele queria se aposentar por motivos particulares, porque parece que é um moço muito bem de vida. Mexe com coisas privadas."

O novo governador de São Paulo disse que São Paulo tem uma tradição "de as polícias tocarem as polícias", com autonomia, e que isso vai continuar. "Da minha parte, está garantida a absoluta isenção."
Disse, porém, que os pedidos de políticos também não serem desprezados.

"Neste momento, tem delegado que é deputado. Não tem motivo para que a pessoa não seja ouvida, né? Ou seja, de algum jeito, sempre vai haver pessoas pedindo coisas. Agora, não tem que ser regra. Mas também não tem que ser excluído. As pessoas que são eleitas não são marginais. São pessoas eleitas, tem que ter respeito pelas pessoas."

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