Combate a mosquito com aplicação de inseticida despenca na gestão Doria

Recuo no ataque ao Aedes caiu 42% em 2017, com 162 mil casas atendidas em SP

Artur Rodrigues
São Paulo

A aplicação de inseticida contra o mosquito que transmite doenças como dengue despencou no último ano, sob a gestão de João Doria (PSDB). O número de residências que passaram pelo processo de prevenção é o menor dos últimos quatro anos.


A colocação do produto nas casas dos paulistanos é um dos principais meios de controle do Aedes aegypti. Essa prática diminuiu 42% no último ano. Em 2017, a prefeitura aplicou inseticida em 162,7 mil residências, contra 281,3 mil no ano anterior, segundo dados municipais obtidos via Lei de Acesso à Informação.

O número de imóveis que passaram pelo procedimento é o menor desde 2013, ano em que as equipes da prefeitura fizeram a aplicação em 100,1 mil pontos.

Além da dengue, o Aedes é o mosquito transmissor de doenças como zika e chikungunya. Há a preocupação de que o inseto também possa vir a transmitir febre amarela em áreas urbanas, embora não haja registros disso até o momento.

Doria deixará a prefeitura nesta semana, após somente 15 meses no cargo. Esse é o prazo exigido pela legislação para que o tucano possa se candidatar ao governo do estado. Em abril, ocorre tradicionalmente o pico de casos de dengue na cidade de São Paulo. 

Agente da prefeitura vistoria possível criadouro do Aedes aegypti, na zona sul de São Paulo; caiu uso de inseticida - Marco Ambrosio/Futura Press/Folhapress

FOCO

A prefeitura diz que a aplicação de inseticida é feita de maneira focada, com base em dados epidemiológicos que, nos últimos anos, apresentaram queda.

O município afirma ainda que o ano começou com diminuição nos casos de dengue. No primeiro bimestre, foram 122 casos autóctones, contra 324 no mesmo período de 2017 —a diminuição vem ocorrendo em todo o país.

Assim como a aplicação dos produtos químicos, os gastos em prevenção também minguaram. As despesas com vigilância em saúde, que incluem combate ao mosquito, tiveram redução de 9% na cidade no ano passado —passaram de R$ 86 milhões em 2016 para R$ 78 milhões, pouco mais da metade do previsto no Orçamento.

Funcionários do setor de vigilância dizem que a verba mais curta reflete em sucateamento da estrutura, com falta de carros para os agentes circularem pela cidade fazendo o trabalho de prevenção, apontado por especialistas como de grande importância.

Além da colocação de inseticida, o procedimento consiste na busca de focos de proliferação do mosquito e orientação da população — em caso de emergência, há lei municipal que permite até a entrada forçada em imóveis. 

PREVENÇÃO

Professor de infectologia da Santa Casa e membro da Sociedade Brasileira de Dengue e Arbovirores, o médico Marco Aurelio Safadi afirma que o poder público não pode baixar a guarda em relação ao mosquito.


O combate ao inseto, diz o professor, deve ser feito em várias frentes. "O uso de inseticida é fundamental. A redução na aplicação pode significar que está havendo relaxamento no controle dos vetores", diz o médico Safadi. 

O infectologista Carlos Magno Fortaleza, da Unesp, também fala sobre a importância de um trabalho combinado à orientação da população para eliminar os criadouros do inseto.

"Esse tipo de aplicação de inseticida, ao redor do foco, é um aspecto importante do controle. Mas não é o mais importante de todos, porque tem se percebido que o mosquito rapidamente desenvolve resistência aos inseticidas que são utilizados, principalmente quando são utilizados repetidamente", afirma. 

Divulgado no ano passado, um estudo realizado na Austrália, que combinou a aplicação de inseticida à informação de pacientes infectados pela dengue, conseguiu uma redução de 86% no número de casos.

O programa previa que, após a confirmação do diagnóstico, um enfermeiro ou agente de saúde ligaria para o paciente e tentaria descobrir os lugares onde ele passou mais tempo nos dias que antecederam o início dos sintomas. Locais associados a múltiplos casos recebiam aplicação de um inseticida com efeito de longa duração. 

Na capital paulista, a prefeitura afirma utilizar dados entomológicos (de insetos) para guiar os locais que receberão aplicação de inseticida, inclusive larvicidas biológicos com maior efeito residual.

OUTRO LADO

A gestão João Doria (PSDB) afirmou que as aplicações de inseticida são feitas de maneira estratégica e de acordo com indicadores. 

"Como no último ano observou-se uma queda no número de casos autóctones de dengue, chikungunya e zika, consequentemente o número de aplicações também diminuiu", diz nota enviada pela prefeitura. 

Segundo dados do município, no ano passado houve 860 casos autóctones da doença, sem nenhuma morte. Em 2016, foram 16.283 registros, com oito óbitos.

A administração municipal informou que usa dois tipos de inseticida, os químicos e os biológicos. "Em pontos estratégicos, além das inspeções de rotina, são realizadas aplicações programadas de larvicida biológico para controle dos criadores de difícil eliminação mecânica", afirma a prefeitura. 

As equipes também atendem a pedidos e denúncias feitas pela população, como solicitações de eliminação de focos em um terreno baldio. 

A administração informou ainda que todos os registros de arboviroses —doenças como a dengue— ​​ são investigados com prioridade. 

"Quando constatados os casos, as áreas de residência ou estadia dos criadouros passam a receber ações de eliminação e controle de vetores adultos, que incluem a aplicação especial de inseticidas", afirma a nota.

Os larvicidas, segundo o município, são o método mais eficaz para evitar a proliferação do mosquito e são menos tóxicos aos seres humanos. A prefeitura também cita "a importância do apoio da população na eliminação de criadouros do mosquito Aedes aegypti, responsável pela transmissão da dengue, chikungunya e zika, além de ser um potencial transmissor da febre amarela urbana".

Sobre a queixa de funcionários da vigilância sanitária, a gestão disse que substituiu parte da frota por uso de aplicativo de compartilhamento de veículos. No entanto, informou, "a frota destinada às áreas estratégicas de vigilância em saúde, bem como a fiscalização e o transporte de material biológico, foi mantida".

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