Descrição de chapéu Cracolândia

Vitrine do governo de SP, prédios populares são saqueados na cracolândia

Gestão aponta ação premeditada de traficantes, com usuários de drogas

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Janela quebrada em apartamento no condomínio dá vista para o fluxo de usuários de drogas
Janela quebrada em apartamento no condomínio dá vista para o fluxo de usuários de drogas - Marcelo Justo/Folhapress
São Paulo

Um grupo formado por dezenas de pessoas invadiu as obras do complexo Júlio Prestes, conjunto de prédios populares na região da cracolândia, no centro de São Paulo, depredou e roubou objetos, em um prejuízo na casa das centenas de milhares de reais e um atraso de pelo menos um mês na entrega dos edifícios à população.

O saque aconteceu na madrugada de segunda-feira (23), depois de um confronto entre frequentadores da região e guardas civis da prefeitura.

Para acessar o canteiro de obras, é preciso passar por segurança e catracas em uma entrada pela avenida Duque de Caxias. As obras ocupam todo o quarteirão entre a avenida e a rua Helvétia, onde se concentram usuários de drogas.

Houve duas invasões aos prédios, que são vitrine do governo de SP. Por volta da meia-noite, um grupo conseguiu derrubar o tapume mais próximo da rua Helvétia, e de 30 a 50 pessoas conseguiram invadir as obras, mas foram contidos pelos seguranças —são 14 no total, para todo o complexo.

No meio da madrugada, houve uma segunda invasão, cuja quantidade de pessoas a Secretaria Estadual de Habitação, responsável pelas construções, ainda não conseguiu estimar.

Eles roubaram cabos de energia, deixando a obra sem luz e sem câmeras de segurança. Entraram na torre mais próxima da rua Helvétia, quebraram vidros e levaram quase tudo de metal que viam pela frente: de grades de proteção até pia, tudo o que fosse de alumínio. Destruíram até o forro do telhado e invadiram boa parte dos apartamentos até o sexto andar —são 17 andares no total, com dez apartamentos em cada um deles.

Ao todo, os invasores depredaram e saquearam três das cinco torres em construção na quadra, onde fica a antiga rodoviária da capital.

Eles levaram três centros de medição de energia —a substituição de cada um é avaliada em até R$ 30 mil, entre compra do equipamento e mão de obra, segundo a coordenação da obra. Também roubaram três quadros de telecomunicações, que conectam os interfones dos apartamentos, avaliados em R$ 25 mil cada um. 

Destruíram também caixa-d’água e levaram quatro bombas que serviam para levar água aos apartamentos, avaliadas em R$ 5.500 cada uma. Cortaram ainda tubulações de gás e água.

Em alguns apartamentos, roubaram até o aquecedor de gás. O que não conseguiam roubar era depredado. Uma das torres ainda estava sem energia nesta terça (24), o que obrigava trabalhadores a subir até 17 andares de escada.

A secretaria de habitação ainda calcula o prejuízo, mas, segundo Andra Robert, secretária-executiva de parcerias público-privadas da pasta, foi “considerável” —a conta deve ser repassada aos cofres públicos, por isso o prejuízo será auditado. Os invasores entraram já equipados, com marretas, pé-de-cabra e serras, o que indica que a situação foi premeditada, diz Andra, “para confrontar o estado”.

Para ela, a ação deve ter sido planejada por pequenos traficantes da região e, na confusão, envolveu também usuários de drogas que frequentam a região —“naturalmente, os dependentes químicos acabam entrando, até para se protegerem”, afirma.

“Parecia que o mundo estava acabando”, disse um pedreiro sobre o cenário encontrado na manhã seguinte. Ele afirma que semanas antes um grupo já havia invadido as obras, por volta das 18h, quando ainda havia trabalhadores na área. “Me juntei a outros pedreiros, pegamos pau e pedras e botamos eles para correr”, conta.

Um dos prédios deveria começar a receber moradores nesta semana. Ele foi inaugurado no fim de março, quando Geraldo Alckmin e João Doria (PSDB) correram para entregar obras antes de renunciarem aos cargos de governador e prefeito para concorrerem nas eleições em outubro.

Com as depredações (os invasores quebraram vidros e levaram grades de ferro deste edifício), a entrega deve ser atrasada em até um mês, diz a secretaria. A última torre seria entregue em agosto e também pode atrasar.

Ao todo, serão construídos cinco prédios na quadra, de frente à praça Júlio Prestes, com 914 apartamentos, de um e dois quartos (41 m² e 51 m²), sorteados entre famílias com renda entre R$ 810 e R$ 4.344.

Na quadra ao lado, há mais dois prédios, com 216 apartamentos destinados para a mesma faixa de renda, além de outros 72 unidades que serão vendidas no mercado, para famílias com renda de R$ 4.344 até R$ 8.100.

Haverá ali também creche, mercado, lojas e a Escola de Música de SP. Em uma quadra próxima, a prefeitura tem feito desapropriações com o intuito de construir uma unidade do hospital Pérola Byington.

A invasão coloca em xeque o plano das administrações estadual e municipal de SP de revitalizar a região, já que precisam garantir segurança aos novos moradores.

Para Andrat, a segurança virá justamente com os novos moradores. “A revitalização da área não será intimidada por essa ação covarde, não podemos nos amedrontar. É uma situação delicada, mas acreditamos piamente que trazendo moradia, tomando para si aquele espaço público, criando uma identidade de vida, é que nós vamos conseguir vencer essa batalha”, afirma.

Recentemente, a cracolândia voltou a ser palco de confrontos entre policiais e usuários. Depois da invasão, frequentadores da região saquearam lojas e atearam fogo a um carro. Nesta semana, o prefeito Bruno Covas (PSDB) afirmou que “essas manifestações mostram uma certa indignação dos traficantes pela ação firme e enérgica que a prefeitura tem feito em parceria com o governo do estado”.

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