Esterilização de mãe de 8 foi consentida e mulher não se arrepende, diz OAB

Entidade afirma que a visitou na penitenciária feminina nesta terça

Marcelo Toledo
Ribeirão Preto

A mãe de oito filhos que passou por esterilização no interior de São Paulo após ação do Ministério Público consentiu com a realização do procedimento cirúrgico e não se arrepende. É o que afirma a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Mococa.

De acordo com a entidade, o presidente da OAB local, Fábio Ferreira dos Santos, e o vice, Victor Coelho Dias, foram até a penitenciária feminina de Mogi Guaçu na tarde desta terça-feira (12) para ouvir Janaina Aparecida Quirino, 36, presa desde novembro condenada por tráfico de drogas e que foi submetida à laqueadura quando seu oitavo filho nasceu, em 14 de fevereiro.

Penitenciária feminina do estado de São Paulo, em visita da Folha, em 2010 - Marlene Bergamo/Folhapress

Comunicado emitido pela OAB na noite desta terça informou que, no encontro, Janaina disse que estava ciente do procedimento a que seria submetida, consentiu de forma voluntária e não está arrependida.

Procurado pela Folha, o vice-presidente da subseção afirmou que a detenta “está bem”.

O processo de esterilização de Janaina se transformou em alvo de investigação e troca de acusações entre órgãos públicos.

Para a Defensoria, não poderia haver processo do tipo por iniciativa do Ministério Público, ainda que sob concordância de Janaina, e procedimentos relacionados a planejamento familiar são de livre decisão de homens e mulheres.

De acordo com Paula Santana Machado Souza, coordenadora-auxiliar do núcleo especializado de promoção e defesa dos direitos da mulher da Defensoria de SP, o fato de Janaina ter assinado documento dizendo que concordava com a cirurgia “não valida um processo que nem deveria existir”.

Em maio do ano passado, a Promotoria abriu processo para submetê-la a uma laqueadura. A sentença favorável, que obrigava o município a fazer o procedimento, foi dada em outubro.

No início de novembro, a Prefeitura de Mococa recorreu ao TJ (Tribunal de Justiça) contra a decisão e, nele, a advogada do município Rosângela de Assis disse ter citado que a ação apresentava violação de direitos contra a mulher.

No mesmo mês, Janaína foi condenada por tráfico e levada para Mogi Guaçu grávida de seu oitavo filho, para cumprir pena em regime fechado.

O bebê nasceu em fevereiro e, no mesmo dia, antes que o recurso do município tivesse sido julgado, ela passou pelo processo de esterilização.

Em maio, três meses após a laqueadura, o TJ (Tribunal de Justiça) reverteu a decisão de primeira instância e extinguiu o processo. Conforme o voto do desembargador Leonel Costa, houve violação da lei, pois é proibida “a esterilização cirúrgica em mulher durante os períodos de parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada necessidade”.

O juiz do caso, Djalma Moreira Gomes Junior, disse por meio de um texto que Janaina consentiu com o procedimento sem oferecer resistência e que ela foi ao cartório e “expressamente manifestou ciência e concordância com a pretensão de laqueadura”. 

No processo, há laudos do Creas (centro de assistência social) e de uma psicóloga em que Janaina diz concordar com o procedimento, além de certidão do cartório informando que ela compareceu e concordava com a cirurgia.

Ainda segundo o juiz, a família é acompanhada há muitos anos e, dos oito filhos, três do primeiro casamento estão sob guarda do pai, um deles internado por dependência química. Dos outros cinco com o atual marido, três foram adotados, o bebê está em processo de adoção e uma adolescente encontra-se em abrigo social.

A Folha não conseguiu contato com o promotor Frederico Liserre Barruffini, autor da ação –está em férias, segundo funcionários.

A Corregedoria do Ministério Público instaurou uma reclamação disciplinar para investigação do episódio, revelado pelo colunista da Folha Oscar Vilhena Vieira no último sábado (9), e informou que o procedimento foi realizado com base em decisão judicial. O TJ disse que a Corregedoria vai apurar a conduta do juiz no caso.

A atuação do médico que esterilizou Janaina na Santa Casa de Mogi Guaçu também resultará em investigação. O Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo) vai instaurar sindicância para apurar o caso, que leva em média de seis meses a dois anos para ser concluída e tramita em sigilo. Se for considerado culpado, a pena vai de advertência à cassação do registro.

Colaborou Sarah Mota Resende 

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