Estrangeiro espera 2 anos por análise de pedido de refúgio no Brasil

Ele teve a família ameaçada e sofreu um sequestro-relâmpago após denunciar orçamentos

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São Paulo

Há dois anos o venezuelano Carlos Barroso, 34, aguarda uma definição do governo brasileiro sobre seu status de refugiado

Funcionário de uma TV estatal no país vizinho, ele teve a família ameaçada e sofreu um sequestro-relâmpago após denunciar orçamentos superfaturados e se negar a receber propina.

 

Decidiu deixar a Venezuela. Enviou os pais para o Equador e veio para o Brasil. Chegou em junho de 2016 e no mesmo mês fez a solicitação de refúgio na Polícia Federal. 

Em maio de 2017, ele conta que foi entrevistado pelo Conare (Comitê Nacional para os Refugiados), órgão do Ministério da Justiça que reúne diversas pastas e é responsável pela análise dos pedidos de refúgio recebidos pelo país. Após a entrevista, foi informado que teria um parecer em três meses. 

Passado um ano, a resposta ainda não veio e Carlos continua com o Protocolo de Permanência Provisória que recebeu ao solicitar refúgio. Embora permita a emissão da carteira de trabalho, CPF e acesso a serviços públicos, o documento não é sempre aceito. 

O RNE (Registro Nacional de Estrangeiro) só pode ser emitido após o status de refugiado ser aprovado pelo governo.

Para a professora de relações internacionais da USP Deisy Ventura, é inaceitável que o protocolo não seja aceito. “Falham as instituições que não reconhecem esse protocolo como documento. Falta preparo para lidar com essas situações”, afirma.

Carlos diz que já teve dificuldades ao tentar abrir conta em bancos públicos, entrar em prédios comerciais, procurar emprego, alugar um imóvel. A solução foi alugar direto com o proprietário, e o emprego como auxiliar de cozinha em um hotel foi intermediado por uma organização que trabalha com refugiados. 

Com a namorada, criou um projeto para vender comidas típicas da Venezuela e, quando tiver o RNE, pretende trazer os pais para São Paulo. “Seria muito bom, porque poderia pedir a reunião familiar”, afirma.

Segundo o Conare, o Brasil recebeu mais de 126 mil pedidos de refúgio nos últimos sete anos. Mais de 86 mil seguem em tramitação, segundo a PF. Com o aumento de pedidos, um maior rol de nacionalidades e de motivos de perseguição, o prazo médio para a análise é de cerca de dois anos.

De acordo com a coordenadora de programas da Conectas, Camila Assano, a demora faz com que o país prolongue a sensação de insegurança e desamparo de pessoas que sofreram perseguições e violações de direitos humanos.

“Se ela buscou refúgio é porque já estava numa situação vulnerável ”, diz.

No caso dos venezuelanos, que responderam por mais de 52% das 33.866 solicitações de refúgio recebidas pelo Brasil no ano passado, as especialistas apontam que o governo não tem tido vontade política para definir a questão.

“Do ponto de vista político e ideológico, o governo brasileiro tende a afirmar que a Venezuela não é mais uma democracia. Se é esse o entendimento, a gente deveria automaticamente conceder o status de refugiados para os venezuelanos”, diz Deisy. 

Segundo Camila, a Conectas e outras organizações têm se mobilizado para cobrar uma resposta sobre o caso. “É totalmente injustificável essa demora na concessão do refúgio, porque claramente o governo brasileiro já se conscientizou de que há uma crise [na Venezuela]”, afirma.

Sobre a situação de Carlos, o Ministério da Justiça afirma que a determinação da condição de refugiado é um processo complexo e depende de várias análises e variantes.

A pasta informa ainda que tem realizado forças-tarefas com instituições parceiras e aberto um chamamento a todos os solicitantes que tenham aberto processo antes de 2015, com o intuito de oferecer resposta aos casos mais antigos. 

Para isso, é preciso que o solicitante atualize os dados de contato para receber a notificação da entrevista complementar.

Atualmente, 15 funcionários atuam na realização das entrevistas de refugiados no Conare, que mensalmente realiza reuniões para deliberar sobre os pedidos de refúgio. Para verificar o andamento do processo, é preciso enviar um email para conare@mj.gov.br, informando o número do protocolo e solicitando a informação.

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