Descrição de chapéu

Impressão digital é chave que não se perde, e proteção de dados requer rigor

Com incidentes de privacidade semanais, assunto não é algo menor

A impressão digital é a chave que nunca se perde. Está atrelada ao nosso corpo e nos identifica de modo particular. Hoje em dia é com a digital que se desbloqueia o celular, a conta do banco é acessada e se entra na academia. O uso da digital foi trivializado.

Movimentação no Poupatempo da Sé, no centro de SP, um dos principais pontos para tirar RG - Diego Padgurschi /Folhapress

Todavia, a digital é diferente da chave, facilmente trocada. Por isso os critérios de segurança para quem detém esses dados devem ser mais rigorosos, especialmente no Brasil, que ainda não tem uma lei geral de proteção de dados.

O governo de São Paulo criou o Sistema Estadual de Coleta e Identificação Biométrica Eletrônica. Ele foi lançado para reduzir a burocracia, aumentar a economia e combater fraudes. Os motivos podem ser os melhores, mas a sua execução pode encontrar problemas que, caso não sejam sanados, podem gerar o efeito oposto.

Quais são as garantias que possui o cidadão de que os seus dados serão usados apenas para a finalidade com a qual foram coletadas? Como garantir que não haverá repasse para terceiros com finalidade comercial? E quais são os procedimentos para evitar vazamentos de dados?

O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) enviou carta ao governador na qual levanta dez perguntas sobre o sistema. Dentre elas estão a indicação das bases legais que permitem o tratamento de dados e a sua reutilização entre "todos os órgãos e entidades da administração pública direta e indireta".

Ainda, a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo (Imesp) passou a atuar como entidade de certificação de digitais, oferecendo ao comércio a possibilidade de conferir, mediante remuneração, as impressões digitais coletadas pelos usuários do sistema com aquelas já armazenadas.

Além de preocupações sobre a base legal para a Imesp desempenhar essa função, vale lembrar que, no plano federal, corre no Congresso o PLS 330/2013. Ele cria regimes de tratamento diferentes entre o setor privado e o setor público.

Quando os dados forem tratados pelo Estado, o cidadão perde uma série de direitos como a conservação de dados e a sua identificação apenas enquanto cumprir a finalidade de sua coleta, a transparência no tratamento de dados e o consentimento.

Esse é o cenário no qual a certificação de biometria está inserida. Em tempos de incidentes de privacidade semanais, não se pode mais tratar o assunto como algo menor.

Por isso a ausência de informações técnicas sobre segurança e a aparente liberdade com a qual dados pessoais serão trocados preocupa. 

A digital é sua, mas caso não sejam superados os questionamentos sobre segurança, finalidade e base legal, ela também poderá ser de quem mais quiser.

Carlos Affonso Souza

Professor da Uerj e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro

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