Duas índias de Mato Grosso, suspeitas de enterrar uma recém-nascida por quase sete horas, serão monitoradas por tornozeleiras eletrônicas após decisão judicial.
A criança foi enterrada no dia 5 de junho, minutos após o parto, em Canarana (a 838 km de Cuiabá), e foi resgatada por policiais após receberem uma denúncia. Eles escavaram cerca de 50 centímetros e encontraram a bebê.
O juiz Darwin de Souza Pontes, da Comarca de Canarana, decidiu, na última quarta-feira (20), que as indígenas Kutsamin Kamayura, 57, e Tapoalu Kamayura, 33, bisavó e avó da recém-nascida, respectivamente, terão de usar tornozeleira porque não foi possível cumprir a sentença definida anteriormente.
A polícia avalia que ambas quiseram enterrar o bebê pelo fato de o pai ser de outra etnia e a mãe, solteira. Kutsamin disse à polícia que enterrou a bisneta sem acionar polícia ou órgãos como IML (Instituto Médico Legal) por crer que ela estivesse morta.
Já a Promotoria, que as denunciou, afirma que a cova em que a recém-nascida foi colocada estava aberta antes mesmo do parto.
Pontes tinha decidido que elas ficariam presas administrativamente na sede da Funai (Fundação Nacional do Índio), em Gaúcha do Norte. Mas a falta de condições da unidade fez com que decidisse pelo uso das tornozeleiras.
O bebê é filho de uma indígena de 15 anos que, à polícia, afirmou que pretendia criar a recém-nascida.
O chamado infanticídio é comum no país em aldeias indígenas, especialmente entre os ianomâmis.
A morte de bebês, normalmente com até seis dias de vida, ocorre, na maioria dos casos, quando a criança nasce com alguma deficiência física. Mas há também mortes de gêmeos ou por suspeita de que a mãe seja adúltera ou tenha sido estuprada.
Neste caso, contudo, a polícia e a Justiça entenderam que o enterro da criança não teve elo com as tradições indígenas.
A bebê foi resgatada pela polícia e está internada na Santa Casa de Cuiabá. Antes disso, até ser encaminhada à capital, ela passou por outros hospitais. Seu estado de saúde inspira cuidados. A Polícia Militar informou que peritos foram acionados no dia da ocorrência para constatar o óbito e que foi surpresa ouvirem o choro da bebê conforme escavavam.
Kutsamin, segundo o interrogatório policial, é analfabeta, mas tem documento de identificação (RG), recebe benefício social e, apesar de expressar-se com dificuldade, entende a língua portuguesa.
Conforme o juiz, as declarações dadas à polícia indicaram que ela tinha conhecimento do crime praticado.
O juiz ainda baseou sua sentença em depoimento de uma enfermeira, servidora da Funai, que disse que os indígenas envolvidos no caso são integrados à sociedade, conhecem a “cultura dos brancos”, sabiam da gravidez da adolescente, discerniam o certo do errado e que tinham noção de que seria impróprio enterrar um recém-nascido.
A Folha não conseguiu contato com a defesa das indígenas nesta sexta-feira (22).
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