Apreensão de carros abandonados cresce em SP; 58 são flagrados a cada dia

Quantidade de veículos removidos cresceu 55% neste ano, com 12 mil casos

Fillipe Mauro
São Paulo

Já faz parte da rotina do motorista Waldeci Mello, 46, trocar de calçada para desviar das carcaças de carros em frente à escola estadual Deputado Luiz Sérgio Claudino dos Santos, na Vila Itaberaba, zona norte de São Paulo.“Já vi até gente morando dentro de sucata. O pior é que há também acúmulo de água parada no verão, além do risco de a ferrugem machucar alguma criança”, diz Waldeci.

O problema não é só ali —está espalhado por bairros de todas as regiões de São Paulo, conforme dados da própria prefeitura, atualmente sob gestão Bruno Covas (PSDB).

Nos primeiros sete meses de 2018, a quantidade de veículos abandonados flagrados nas ruas e removidos por agentes municipais chegou a 12.157 —aumento de 55% em relação ao mesmo período do ano anterior, no começo do mandato de João Doria (PSDB), que deixou o cargo em abril para disputar a eleição estadual.

A atual média de 58 casos diários já supera a do último ano da gestão Fernando Haddad (PT), quando 47 carros abandonados eram retirados a cada dia das vias paulistanas.

Neste ano, a maior concentração de carros abandonados apreendidos nas ruas foi no Ipiranga (zona sul), com 1.402 casos de janeiro a julho, seguido por Vila Maria (zona norte), com 1.109, Butantã (zona oeste), com 810, e Mooca (zona leste), com 781. Segundo a prefeitura, os números se referem a solicitações atendidas após reclamações de moradores.

Na Brasilândia (zona norte), um vigilante de 26 anos diz se queixar há anos de um carro abandonado quase na frente de casa. A sucata já foi obstáculo até mesmo para uma ambulância no socorro ao avô dele, de 75 anos, que sofreu um AVC.“Passar a maca foi um sacrifício, tivemos que espremer pelo canto”, conta ele, que prefere não se identificar por temer represália de vizinhos.

No mesmo bairro, a radialista Juçara Zottis, 57, se preparava para levar sua mãe à missa numa manhã de domingo semanas atrás quando se deparou com um carro antigo largado na frente de casa.

Sem conseguir retirar seu próprio carro da garagem, resolveu chamar a polícia. “Disseram que ninguém tinha condição de guinchar a sucata e sugeriram que chamasse um táxi para sair de casa”. Mais tarde, ao descobrir de quem era a carcaça, ganhou uma resposta atravessada: “Ele me disse que a rua era pública”.

Pela legislação municipal, as subprefeituras estão autorizadas a apreender veículos que estejam abandonados em vias públicas por mais de cinco dias consecutivos.

Para verificar esse prazo, fiscais aplicam um lacre sobre as portas. Se o proprietário remover o selo dentro do prazo de cinco dias corridos, os fiscais não guincham, ainda que o veículo esteja em estado de sucata.

Já o carro guinchado fica então sob responsabilidade das subprefeituras, até que sejam recuperados por seus proprietários ou arrematados em leilão. Se não houver débitos, a subprefeitura é autorizada a vendê-lo como sucata.

A multa por abandono de veículos pode chegar a R$ 15.520 —sem contar os custos de remoção, que dependem das características do carro e da distância do pátio.

Na prática, porém, muitas sucatas costumam acumular dívidas, como multas e falta de IPVA e licenciamento, que tornam inviável sua recuperação pelo proprietário.

Em Santana (zona norte), onde as apreensões das carcaças estacionadas nas ruas subiram quase 60% em relação a 2016, a subprefeita regional Rosmary Corrêa diz que precisou montar uma força-tarefa para esvaziamento do pátio onde os veículos ficam.

“A primeira coisa que fiz foi tentar leiloar aquilo que ainda era utilizável e vender aquilo que já estava em estado de sucata. O problema é que vários veículos têm restrições por dívida, e aí não podemos fazer nada, ficam acumulados no galpão”, afirma Rosmary.

Há casos em que os donos retiram os lacres aplicados pela prefeitura antes da chegada dos fiscais, para evitar a remoção —medida que acaba driblando a fiscalização.

Além de deficiências na zeladoria urbana, especialistas citam a crise econômica como uma das hipóteses do abandono de mais veículos nas ruas. A prefeitura diz ter ampliado a fiscalização.

Segundo Joelson Sampaio, economista da Fundação Getulio Vargas, a crise é marcada por uma baixa expectativa de crescimento de receitas, deixando os custos de manutenção dos carros menos suportáveis no decorrer do tempo.

“Mesmo que um proprietário quisesse vender seu carro como sucata em um ferro-velho, ele também teria custos de logística com a remoção, provavelmente inviabilizando a relação custo-benefício”, afirma. O destino final, sem alternativas para um descarte, acaba sendo a própria rua.

O economista também ressalta a renovação da frota de automóveis do Brasil nos últimos anos. Dados do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) mostram que os carros brasileiros, hoje, têm idade média de aproximadamente nove anos, considerada mediana.

“Acaba sendo como uma pirâmide: quanto mais a frota se renova na ponta, mais carros antigos acabam empurrados para a base, exigindo meios melhores de destinação”, ele afirma.

Questionada sobre veículos abandonados na Brasilândia, a Secretaria Municipal das Subprefeituras disse que uma rua não ficaria bloqueada por “anos”, mas que a regional faria vistoria no local. 


O que fazer com um carro abandonado

Quem é responsável por remover os carros abandonados das ruas? 
A Prefeitura de SP. Você pode denunciar pelo telefone 156, nas subprefeituras ou pelo site 
sp156.prefeitura.sp.gov.br

Qual o prazo para remoção? 

Quando uma denúncia é feita, os fiscais da prefeitura põem um lacre no veículo. Se em até cinco dias corridos o proprietário não tomar providências, o automóvel é considerado abandonado e pode ser guinchado

Qual a multa para quem abandona um carro em via pública? 

Em São Paulo, a multa pode chegar a R$ 15.520

O que devo fazer se meu carro já não tem serventia? 

É preciso dar baixa no veículo, o que deve ser feito no Detran. Também é possível vendê-lo a um desmonte, que deve assumir a responsabilidade pelo processo, segundo o órgão de trânsito

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