"Desculpe. Acordei e tomei um banho, mas não estava achando o pente", disse Lysias. A cabeça luzia sem um fio de cabelo. A piadinha era para justificar à enfermeira o pequeno atraso para a aplicação de uma injeção nele, em tratamento de um câncer.
Os mais próximos tinham o privilégio de se deixarem cativar não só por seu bom humor, mas também pelo paladar, já que nas horas de lazer ele gostava de cozinhar. Cada parente tinha o seu prato predileto de Lysias: moqueca capixaba, torta capixaba, paella.
Enquanto cozinhava, tomava um vinho e escrevia poemas. Foram tantos que a família os encontra até mesmo rabiscados no verso de contas de luz. Pretendem reunir o material e as receitas para lançar um livro póstumo.
Nascido e criado na mineira Caratinga, foi o nono de 12 filhos de um casal de educadores —o pai é o fundador do que hoje é a Rede de Ensino Doctum. Lysias seguiria a carreira, atuando como professor de ciências contábeis, coordenador de curso e diretor de expansão da Doctum.
Desde pequeno, se botava algo na cabeça, ia até o final. Quando criança, décadas antes do tratamento do câncer lhe tirar os cabelos, tinha-os compridos, encaracolados e bagunçados. A irmã mais velha uma vez lhe disse que ele não faria nada sem penteá-los, e ele ficou gritando o dia inteiro, em protesto.
Não gostava de ficar parado. A intensidade com que vivia resultou em algumas precocidades. Foi pai aos 19. Aos 36, já era avô. Aos 53 teve um problema cardíaco e precisou trocar uma válvula do coração.
Morreu também precoce, aos 56, no último dia 16, em decorrência do câncer. Deixa os filhos Camila, Felipe e Tássio, a esposa Silvania, dois netos e dez irmãos.
coluna.obituario@grupofolha.com.br
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.