Descrição de chapéu Rio de Janeiro

Reforço de segurança em áreas turísticas do Rio tem impacto limitado

Programa estadual recruta policiais de folga e é pago em parte pelo Sesc-RJ

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Rio de Janeiro

​"Não tem quem não aprove", diz a diarista Maria Teixeira, 40, antes de pegar seu ônibus à beira da lagoa Rodrigo de Freitas, ponto turístico da zona sul carioca que desde o fim de 2015 é patrulhado das 6h às 22h por policiais com coletes laranjas.

Opiniões como a dela são quase onipresentes entre moradores, comerciantes e frequentadores das cinco áreas da cidade do Rio de Janeiro contempladas pelo programa Segurança Presente, coordenado pelo governador Luiz Fernando Pezão (MDB) e financiado em parte pelo Sesc-RJ.

O projeto recruta principalmente policiais de folga para reforçar a vigilância em pontos como Arcos da Lapa, Museu do Amanhã (centro), Aterro do Flamengo e lagoa (zona sul) e no Méier (zona oeste).

No dia 20 deste mês, ele deve chegar também ao Leblon, diz a associação de moradores.

Seus efeitos, porém, estão longe de resolver os problemas da segurança pública do Rio e são estritamente limitados às ruas por onde esses agentes circulam, coisa que os próprios policiais relatam.

Apesar de o governo divulgar números altos de prisões em flagrante (12 mil) e cumprimento de mandados judiciais (809) em quatro anos e meio de programa, dados mais gerais das regiões que englobam os pontos patrulhados não mostram um impacto significativo.

"Embora pontualmente você possa obter um ganho, olhando os dados mais amplos preliminarmente, não parece ser essa maravilha que diz o discurso oficial", diz Robson Rodrigues, coronel da reserva e pesquisador do Laboratório de Análise da Violência de Uerj (universidade estadual do RJ).

Quando se compara, em cada local, o número de roubos de rua (a pedestres, de celular e em ônibus) no ano anterior ao Segurança Presente e nos anos seguintes a ele, o que se vê são algumas variações.

Na maioria dos casos ocorre uma queda nos primeiros 12 meses do programa e um aumento no segundo ano. A única região que teve diminuição constante dos assaltos foi o centro —de 6% no primeiro ano e de 7% no segundo.

"Minhas hipóteses [para a não diminuição] são que talvez falte uma integração de diferentes políticas ou que haja um deslocamento das dinâmicas criminais: o que é reduzido em uma área aumenta na vizinha", pontua Rodrigues, que vai estudar o Leblon Presente quando ele for iniciado.

Outra crítica ao projeto, além de seu caráter paliativo, é o fato de ele existir apenas em locais com alto interesse comercial, porque quem cobre parte dos custos de R$ 41 milhões anuais é o Sesc-RJ.

O Segurança Presente surgiu num contexto de grave crise financeira do Rio e vácuo da presença do Estado. "Por que todo mundo está fazendo isso? Porque a segurança no RJ não está dando conta", afirma Francisco Dantas, morador de Santa Teresa, bairro da zona central que tentou implantar o programa.

O que é solução para uns, porém, é desvio de função para outros. "O programa pode até apresentar alguns resultados, mas seu problema é conceitual. A segurança pública cabe ao Estado", opina o sociólogo Michel Misse, da UFRJ.

Para o pesquisador Robson Rodrigues, o Segurança Presente deveria integrar tanto os interesses da iniciativa privada quanto os do Estado, já que há um investimento público de recursos humanos.

"Se eu fizesse um contrato com você, meio a meio, eu teria o poder de decidir 50% das ações. Na segurança é a mesma coisa: se o Estado tem prioridades na zona norte, mas a iniciativa privada quer na zona sul, poderia fazer em uma região e transferir uma parte dos recursos para a outra."

‘Terra de ninguém’

O prefeito Marcelo Crivella (PRB) causou um rebuliço em junho quando cogitou não renovar o contrato com o Sesc do Centro Presente —único local onde a prefeitura arca com metade dos custos— e trocá-lo por um programa mais barato. No fim, voltou atrás e vai mantê-lo ao menos até setembro.

"Aqui na avenida Presidente Vargas era terra de ninguém. Melhorou muito para o comércio", diz Eduardo Blumberg, presidente do conjunto de lojas Polo Saara, que organizou um "apitaço" a favor da manutenção do programa.

Ele reconhece que o Segurança Presente tem uma finalidade limitada: "Isso dá jeito no dia a dia na rua, não nas áreas conflagradas. Não pode misturar as coisas."

Toda vez que o programa ameaça acabar, o apoio da população também vem por meio de abaixo-assinados. Um recebeu em um mês 746 assinaturas. Outro, pela manutenção dos uniformes coloridos que caracterizam o policiamento de proximidade, 581.

Evelyn Rosenzweig, presidente da associação de moradores AmaLeblon, diz que o programa "caiu como uma luva" para a realidade do bairro. "É um local com concentração de renda e turismo, então ficamos vulneráveis", afirma.

O programa também é bastante defendido pelos policiais, que podem ganhar até R$ 260 adicionais por dia trabalhado, sem precisar fazer bicos ilegais.

Quanto à efetividade do programa, a Secretaria de Estado de Governo diz que os números levantados pela reportagem incluem áreas e horários em que as operações não acontecem. A Folha pediu números da redução de ocorrências, mas a pasta disse que os dados da operação são internos e divulgou apenas porcentagens de crimes e períodos aleatórios.

Entre elas estão a queda de 100% no roubo a comércios na área patrulhada do Méier entre abril e agosto de 2017 e de 50% "nos demais meses", e a diminuição de 90% "dos índices criminais" no centro.

Sem os números absolutos, porém, não é possível saber por exemplo se os roubos passaram de apenas um para zero, o que representaria uma redução de 100%.


Como o programa funciona no RJ

Como é Agentes patrulham as áreas em horários que variam conforme a região; as abordagens são filmadas

Objetivos Coibir roubos, furtos e consumo e comércio de drogas; promover o ordenamento urbano; acolher moradores de rua

Implantação Na Lapa, em jan.14; na Lagoa, Aterro e Méier, em dez.15; no Centro, em jul.16

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.