72% dos moradores do estado do Rio querem prorrogar intervenção federal

Segundo Datafolha, maioria apoia continuidade de ação na segurança, válida até dezembro

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São Paulo

A maioria da população do Rio de Janeiro defende prorrogar a intervenção federal na segurança pública, prevista para acabar em 31 de dezembro deste ano. 

Segundo pesquisa do Datafolha, 72% dos moradores do estado são a favor da continuidade da medida para além de seu prazo final. Dentre os entrevistados, 21% são contrários à prorrogação, 4% não sabiam e 4% eram indiferentes.

O levantamento foi realizado entre 4 e 6 de setembro, com 1.357 pessoas de 16 anos ou mais. A margem de erro é de 3 pontos percentuais para mais ou para menos.​

A intervenção federal na segurança pública foi decretada em fevereiro deste ano pelo presidente Michel Temer (MDB) com a justificativa de combater a escalada da violência. O general do Exército Walter Braga Netto foi nomeado interventor e assumiu controle das polícias, bombeiros e setor penitenciário do Rio.

Antes disso, desde julho de 2017, já havia presença de homens do Exército nas ruas do estado. Em meio à grave crise financeira e de segurança pública no Rio, foi decretada na época a GLO (Garantia da Lei e da Ordem), que dava aval à participação dos militares, embora as polícias ainda estivessem sob comando do governo estadual.

Nesta semana, foi assinado um plano com medidas de transição para encerrar intervenção federal no Rio (leia mais abaixo).  

Em entrevista à Folha em agosto, Raul Jungmann, ministro da Segurança Pública, afirmou que a intervenção deveria acabar no prazo inicialmente previsto, porque os responsáveis pela medida já demonstraram não querer a sua renovação.

Em junho, Jungmann chegou a defender que a intervenção fosse renovada para, pelo menos, dezembro de 2019. Mas, vencido na discussão interna, optou pelo “meio-termo”, que seria a continuidade “da reestruturação das forças de segurança” no Rio e a manutenção da operação de Garantia da Lei e da Ordem no ano que vem.

O comandante do Exército, general Eduardo Villa Bôas, chegou a declarar em discurso no mês passado que "aparentemente" apenas os militares têm se dedicado a resolver os problemas do Rio

O apoio à continuidade da intervenção na capital do Rio é um pouco menor do que no estado: 68% são favoráveis e 25%, contrários. Já no interior 75% querem prorrogar a medida, e apenas 18% são contra. Moradores de outros municípios da região metropolitana também consideram a intervenção mais positiva do que a capital: 74% são a favor da prorrogação.

As opiniões variam de acordo com a escolaridade, renda e idade do entrevistado. Entre os mais jovens, de 16 a 24 anos, há menor apoio à intervenção: 59% são favoráveis, enquanto 31% são contrários. A faixa etária que mais deseja prorrogar a medida é a de 45 a 59 anos, com 78% —apenas 16% deles querem que a intervenção acabe em dezembro.
 

Quanto mais escolarizado, menor a intenção de manter esse decreto na segurança do estado. Entre pessoas com nível superior, 63% desejam a prorrogação e 31% são contra. Já entre os entrevistados com ensino fundamental, 79% são favoráveis e 13%, contrários.

A renda também impacta a avaliação da intervenção. Os mais ricos, que ganham acima de dez salários mínimos, são os que menos apoiam: 57%. Desse grupo, 37% acham que a intervenção deve terminar em dezembro. Entre os mais pobres, que recebem até dois salários mínimos, 76% aprovam a prorrogação e 17% são contrários.

O endosso à medida na segurança tem pouca variação por gênero: a maioria tanto dos homens quanto das mulheres considera que ela deve continuar. Entre os brancos, 70% são a favor da continuidade e, entre os negros, 67%.

A intervenção federal na segurança do Rio completou seis meses em 16 de agosto. A medida ainda não conseguiu reduzir os homicídios, acumula a maior taxa de mortes por policiais desde 2008 e tem retirado menos armas das ruas.

Depois do início da intervenção, quatro militares do Exército foram mortos a tiros. Um deles foi baleado em agosto dentro de um bar, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense (RJ). No mesmo mês, outros três morreram em uma operação das forças de segurança nos complexos de favela do Alemão e Penha, zona norte no Rio.

A intervenção foi decretada às pressas e sem um plano pronto logo depois do Carnaval, quando cenas de roubos em áreas nobres da capital foram amplamente divulgadas pela imprensa e aumentaram a percepção de insegurança e vácuo no governo do estado.

Desde que chegaram ao Rio, os representantes do governo federal intensificaram as operações em favelas. Foram mais de 300 desde fevereiro, com aumento de 60% dos disparos e tiroteios registrados pela plataforma colaborativa Fogo Cruzado.

O orçamento do governo federal, de R$ 1,2 bilhão, tem sido usado majoritariamente na compra de materiais, mas nenhum centavo chegou a batalhões e delegacias. Na lista estão munições (1,1 milhão), armas (11 mil) e veículos (1.350), além de equipamentos para a polícia técnica e manutenção de blindados.

No sistema penitenciário, a principal ação foi uma operação que transferiu 5.400 presos, seguindo um decreto do interventor que permite maior fluxo de detentos. Há também a previsão de contratação de 400 PMs até 2019 e treinamento de 2.500 policiais até dezembro.

Garantia da Lei e da Ordem

O apoio dos moradores do município do Rio de Janeiro à presença do Exército em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) vem caindo nos últimos meses, apesar de ainda ser majoritário, segundo outra pesquisa do Datafolha, divulgada em agosto.

O Exército está nas ruas da cidade desde julho de 2017, quando Temer decretou a operação de GLO. Já a intervenção foi decretada em fevereiro de 2018 e ocorre em paralelo. 

O índice dos que são a favor da convocação dos militares diminuiu de 76%, em março de 2018, para 66% em agosto, enquanto aqueles que são contrários passaram de 20% para 27%.

Desde outubro de 2017, quando pesquisa do Datafolha fez essa pergunta pela primeira vez, a aprovação às Forças Armadas na capital fluminense já perdeu 17 pontos —naquele mês, eram 83% favoráveis ao emprego de militares para combater a violência no Rio.

ENTENDA O QUE É A INTERVENÇÃO FEDERAL

Afinal, o que é a intervenção federal? 
É uma medida constitucional que permite que a União interfira nos estados em alguns casos. No Rio, ela foi decretada por Temer (MDB) em 16 de fevereiro para “pôr termo a grave comprometimento da ordem pública” e só vale para a segurança pública.

Na prática, as polícias, os bombeiros e o sistema penitenciário estão sob o comando federal, que nomeou interventor o general Walter Souza Braga Netto, do Exército. A medida é inédita no país e vale até 31 de dezembro.

Ela ocorre paralelamente a uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) decretada por Temer em julho de 2017, que dá poder de polícia às Forças Armadas no estado também até o fim do ano.

A intervenção era necessária? 
Há controvérsias. Outros estados têm índices de criminalidade piores que os do Rio (em 11º lugar na taxa de mortes violentas em 2017) e não receberam ajuda federal, como Rio Grande do Norte e Acre, por exemplo.

Para o Observatório da Intervenção, grupo de pesquisadores da Universidade Cândido Mendes, a decisão teve forte cunho político e permitiu que Temer abandonasse a reforma da Previdência, já que é proibido mudar a Constituição diante de intervenções.

A medida também foi decretada (às pressas e sem um plano pronto) logo depois do Carnaval, quando cenas de roubos em áreas nobres foram amplamente divulgadas pela imprensa e aumentaram a percepção de insegurança e vácuo no governo do estado.

A intervenção tem sido transparente, como prometeu? 

O gabinete de intervenção tem divulgado informações sobre parte de suas ações e começou a fazer reuniões semanais com a imprensa para explicar aspectos técnicos. Operações policiais, porém, continuam sem justificativas e balanços satisfatórios, e pedidos de informação frequentemente não são respondidos.

O interventor Braga Netto e o general nomeado para a pasta da Segurança Pública, Richard Nunes, também evitam a imprensa. À frente da Polícia Civil, eles não comentam crimes como o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL), ocorrido em março e até hoje não esclarecido.

O que a intervenção promete até dezembro?

Em seu Plano Estratégico, divulgado quatro meses após o início da medida, cita cinco objetivos: 1. Diminuir os índices de criminalidade; 2. recuperar a capacidade operativa das polícias; 3. articular os diversos órgãos da segurança pública; 4. fortalecer o caráter técnico, e não político, desses órgãos; 5. melhorar a gestão do sistema prisional, com reestruturação.

Para isso, elenca, em 80 páginas, 66 metas e 70 ações, mas elas já estão em revisão novamente, e uma nova versão do documento deve ser divulgada em setembro.

Quanto dinheiro tem para isso?

O orçamento repassado pelo governo federal é de R$ 1,2 bilhão para investimentos, como aquisição de novos equipamentos. Salários de policiais e gastos com gasolina para viaturas, por exemplo, continuam sob responsabilidade do estado do Rio. Esses recursos não estavam previstos na Lei Orçamentária de 2018, por isso foram registrados como “crédito extraordinário”.


Governo do Rio assina plano de transição para fim de intervenção 

O plano com medidas de transição para o fim da intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro foi assinado esta semana pelo governador Luiz Fernando Pezão (MDB) e pelo interventor General Walter Braga Netto.

De acordo com o coronel Carlos Cinelli, porta-voz do Comando Militar do Leste, o documento possui diretrizes, metas e sugestões para o próximo governante do Rio de Janeiro dar continuidade a medidas que estão sendo implementadas hoje pelo Exército. 

Entre as medidas, estão a identificação de gargalos administrativos e treinamento de policiais. 

A intervenção na segurança do Estado tem término previsto para o dia 31 de dezembro deste ano. Após essa data, tropas do exército serão retiradas das funções de segurança, mas alguns cargos administrativos ainda serão mantidos por militares.

 Segundo Cinelli, a manutenção dos cargos é necessária para que a verba de R$1,2 bilhão, disponibilizada em abril pelo Governo Federal, seja aplicada em batalhões da Polícia Militar e delegacias da Polícia Civil.

"Serão poucos cargos-chave administrativos que permanecerão ativos. Se deixassem de existir, haveria um entrave na aplicação dos recursos, que são do governo Federal e destinados a intervenção", disse. 

Colaborou  Luisa Leite, do Rio de Janeiro

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