Brasil está entre 51 países mais suscetíveis à desnutrição, diz ONU

Países com choques climáticos e dependência da agricultura têm risco

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São Paulo

O Brasil está entre os 51 países mais suscetíveis à prevalência da desnutrição, segundo dados da nova edição do relatório anual da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre a segurança alimentar e nutricional, divulgado nesta terça-feira (11). O país figura ao lado da Etiópia, Indonésia e outros na África Oriental e na Ásia Central.

Pessoas vasculham por comida e objetos em lixão do município de Barcarena, na região metropolitana de Belém (PA) - Eduardo Anizelli/Folhapress

Isso porque o Brasil conviveu com climas extremos —de secas severas a inundações— por quatro anos entre 2011 e 2016. E, de acordo com o estudo, países que apresentaram choques climáticos por mais de três anos no período têm, em média, mais que o dobro de pessoas subnutridas.

Na lista, 15,5% dos países são da América Latina e do Caribe. A maioria, 76%, é parte da África e Ásia. Os de renda média correspondem a 76,5%, enquanto 3,5% são de baixa renda.

Em declínio constante por mais de uma década, a fome no mundo voltou a crescer em 2016 e afetou 815 milhões de pessoas. O novo relatório mostra que em 2017 o número aumentou de novo: são 821 milhões de pessoas subnutridas —cerca de uma em cada nove pessoas.   

De acordo com a ONU, a fome é significativamente pior em países com sistemas agrícolas altamente sensíveis a variabilidade de temperatura, chuva e seca, e onde o sustento de grande parte da população depende da agricultura.

E são nesses países também que os dias muito quentes estão se tornando mais quentes e mais frequentes. O calor extremo está associado com aumento da mortalidade e menor capacidade de trabalho, por exemplo.

No Brasil, um dos motivos que explica as altas temperaturas e os mais longos períodos de seca, segundo o relatório, é o fenômeno do El Niño entre 2015 e 2016.

E nesta década o país passou por dois eventos climáticos simultâneos que se mostraram devastadores para a produção de alimentos: a seca, no Nordeste, e as inundações, no Sul. 

"Acabamos de sair de uma das piores, talvez a pior seca dos tempos modernos no Brasil, na região Nordeste", diz José Graziano da Silva, diretor-geral da FAO (braço da ONU para a alimentação e a agricultura).

Apesar disso, acrescenta o diretor, o país não registrou movimentos de retirantes fugindo da seca em função de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, e a aposentadoria rural.

"A presença do Bolsa Família, que é realmente a maior fonte de renda dos mais vulneráveis, também foi instrumento fundamental para a redução dos impactos da seca nos pequenos povoados do Nordeste", afirma Graziano, que foi ministro extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome, sendo o responsável pela implementação do Programa Fome Zero, durante o primeiro mandato do ex-presidente Lula (PT).

Além das mudanças climáticas, a desaceleração econômica na América Latina também reduziu a capacidade dos governos de lidar com as consequências desses eventos climáticos, e colaborou para o agravamento da desnutrição, segundo o relatório.

"O que está acontecendo no Brasil, infelizmente, é uma crise prolongada. Não é de hoje que vem aumentando o desemprego, mas a situação dos últimos anos é ainda mais preocupante. Isso porque, segundo mostra a última pesquisa do IBGE, há um contínuo crescimento da informalidade e do número de desempregados desde 2016", diz o diretor da FAO.

A crise e a pobreza são fatores determinantes para a insegurança alimentar, mostra o estudo. Se a produtividade agrícola cai, a produção de alimentos e os padrões de cultivo também diminuem, contribuindo para déficits de disponibilidade ou gerando picos e volatilidade dos preços. 

Assim, principalmente os mais pobres, veem piorar a disponibilidade, a qualidade, a quantidade e a diversidade de alimentos consumidos.

Esta é a segunda vez que a ONU realiza uma avaliação global sobre segurança alimentar e nutricional depois da adoção da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, ratificada pelos países-membros da ONU, inclusive o Brasil. O acordo objetiva acabar com a fome e com todas as formas de subnutrição.

Números da desnutrição

- Segundo a ONU, o número de pessoas subnutridas no mundo é de 821 milhões

- 151 milhões de crianças menores de cinco anos sofrem com atraso no crescimento (estatura baixa para idade)

- Uma em cada três mulheres em idade reprodutiva é anêmica; no Brasil, são cerca de 15 milhões de mulheres 

- Um em cada oito adultos é obeso; no total, são mais de 672 milhões de pessoas (a obesidade pode estar ligadas à carência alimentar. Há chance de desnutrição mesmo com a oferta de alimentos, porém, com poucos nutrientes)

- No Brasil, são cerca de 33 milhões de adultos obesos

- Mais de 38 milhões de crianças menores de cinco anos estão acima do peso no mundo

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