'Mãe' de museu destruído pelo fogo, UFRJ tem prédio precário e improviso

Com contas no vermelho, universidade enfrenta interdições e elevadores quebrados

Estudantes em campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Estudantes em campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro - Adriano Vizoni/Folhapress
Nicola Pamplona
Rio de Janeiro

Nos pilotis do edifício da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ (Universidade Federal do Rio Janeiro), goteiras escoavam na manhã desta terça (4) a água da chuva que atingiu a cidade durante a madrugada.

Parte da área foi isolada. “Hoje está até tranquilo. Normalmente, cai muito mais água. A gente tem até medo de passar aí embaixo”, diz o estudante Antônio Braga, 20.

 

O estado precário do edifício, que já abrigou a reitoria da universidade, é um retrato do sucateamento da instituição. Responsável pela gestão do Museu Nacional, destruído por um incêndio na noite de domingo (2), ela prevê chegar ao fim do ano com déficit de R$ 160 milhões —incluindo débitos de anos anteriores.

Quatro dos oito andares estão interditados desde 2016, quando o último deles foi atingido por um incêndio. Nos outros pavimentos, há fios elétricos expostos, paredes com reboco e buracos no teto onde deveriam haver luminárias.

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Dos cinco elevadores, só um funciona. A biblioteca, que ficava acima dos pilotis, foi parcialmente destruída pelas infiltrações. A reitoria foi transferida, assim como alunos da Escola de Belas Artes, que têm aulas em espaços improvisados de outros institutos.

“Esses prédios são da década de 1960 e já deveriam ter passado por uma reforma-geral”, diz Edson Watanabe, que dirige a Coppe/UFRJ, renomado instituto de pós-graduação em engenharia. “Nosso telhado está em condições precárias e ficamos torcendo para não chover muito”, afirma.

Há um projeto orçado em R$ 3 milhões para resolver o problema nos dois blocos em situação pior, mas falta verba.

A UFRJ gere 15 prédios tombados pelo patrimônio histórico, como o palacete do Museu Nacional. Entre eles, estão o palacete de 1879, no centro da cidade, onde está o Hospital Escola São Francisco de Assis, a casa de shows abandonada Canecão, na zona sul, e edifícios da cidade universitária.

Nos últimos anos, enfrentou outros incêndios: na Capela São Pedro de Alcântara, no campus da Praia Vermelha (zona sul), em 2011; nas faculdades de letras e ciências contábeis, em 2012 e 2014; e no alojamento estudantil, em 2017.

A universidade alega que a falta de manutenção é reflexo de restrições orçamentárias.
Os gastos públicos gerais com a UFRJ, incluindo servidores, tiveram leve alta desde 2013. Mas os recursos vão cada vez mais para despesas carimbadas, como salários.

A universidade diz que, por isso, tem cada vez menos verba discricionária, tanto para custeio como investimentos.

O Ministério da Fazenda diz que os gastos com a UFRJ em 2017 chegaram a R$ 3,1 bilhões. Mas a maior parte (R$ 2,6 bilhões) foi para pagar salários dos cerca de 14 mil servidores.

A UFRJ diz que a verba que ela própria pode gerenciar este ano se limita a R$ 388 milhões, com chance de contingenciamentos. Afirma serem necessários R$ 460 milhões.

É daí que saem os recursos para a operação do Museu Nacional, que em 2017 recebeu R$ 452,5 mil da UFRJ. É também dessa rubrica que a universidade tira verba para serviços de segurança, transporte e assistência estudantil.

Para fechar as contas, a gestão da universidade propôs cortes de gastos com energia, telecomunicações e combustíveis, redução da frequência de ônibus no campus e renegociação com fornecedores.

Com a queda de investimento nos últimos anos, foram paralisadas obras de novos edifícios, hoje inacabados, na cidade universitária. A má gestão também contribuiu: planejada para receber estudantes de direito, uma das construções foi suspensa por problemas na fundação.

“As restrições orçamentárias estão afetando o cotidiano de professores, alunos e a própria estrutura física da universidade”, diz a professora Maria Lúcia Werneck Vianna, que preside a associação dos docentes da UFRJ.

Reitoria da UFRJ é comandada por filiados ao PSOL

A atual gestão da UFRJ foi nomeada em 2015, com mandato até 2019. Professor titular da faculdade de educação e filiado ao PSOL, o reitor Roberto Leher assumiu com críticas à política de educação federal.
Em 2017, chegou a ser acusado pelo Ministério Público Federal de improbidade administrativa por promover evento de caráter político-partidário na universidade, mas a ação foi rejeitada pela Justiça.

Além de Leher, outros três dos dez membros da reitoria são filiados ao PSOL: a vice-reitora Denise Fernandes da Rocha Santos, o pró-reitor de pessoal, Agnaldo Fernandes da Silva, e a pró-reitora de extensão, Maria Mello de Malta.

Nesta terça (4), ao falar de novo sobre o incêndio no museu, o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) criticou a filiação política na cúpula da universidade. “A administração toda é de gente filiada ao PSOL e ao PC do B. A indicação política leva a isso. Os partidos se aproveitam, vendem seu voto aqui dentro como regra para que a administração seja deficitária e lucrativa para eles individualmente.”

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