Formado sociólogo no Brasil, Marcos Romão virou jornalista na Alemanha, mas suas origens ajudam a explicar o ofício que melhor o define: o de militante pelos direitos humanos.
Nascido em Niterói, no Rio, era o único negro numa escola de classe alta --tinha bolsa de estudos.
Também costumava acompanhar os pais no manicômio judiciário, onde trabalhavam. Aprendeu cedo a se impor quando o assunto era bullying e racismo. Aos 16, já era arrimo da família.
Em 1993, participou de ações de proteção aos sobreviventes do Massacre da Candelária, no Rio. E passou ser alvo de perseguição. Aí resolveu se exilar "para não ser alvo de balas nem tão perdidas", dizia. Viveu 20 anos na Alemanha. Lá, tornou-se jornalista ao montar uma rádio online para denunciar o tráfico de mulheres, o ódio racial e outras violências.
Casou-se com a alemã Ortrun Gutke e virou também liderança na luta pela cidadania de brasileiros vivendo no exterior. Num congresso mundial, em 2003, foi porta-voz dos trabalhadores que reivindicavam contar na aposentadoria o tempo de serviço fora do país. A proposta virou parte do acordo entre o então presidente Lula (PT) e a primeira-ministra Angela Merkel.
Há cinco anos, voltou ao Brasil. Fundou aqui a rádio Mamaterra --o estúdio, na sala do seu apartamento, tem dois computadores e microfones. "Não é preciso mais do que isso. É uma volta ao passado. Foi aqui que começamos a luta contra o racismo", dizia.
Em 2017, um câncer que havia tratado anos atrás reapareceu, no fígado. Conseguiu um transplante e saiu da cirurgia com seu bom humor típico: "Alguém pode trazer um javali pra eu comer?". A doença, porém, o vitimou em 3 de agosto, aos 65 anos. O jornalista deixou quatro irmãos, a mulher, quatro filhos e um neto.
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