Doria deixou série de ações incompletas ao abandonar prefeitura

Tucano deixou cargo depois de 15 meses e quando restavam ainda 1.000 dias para concluir a gestão

Doria vestido de gari, ainda no início do mandato, para mostrar dedicação à zeladoria
Doria vestido de gari, ainda no início do mandato, para mostrar dedicação à zeladoria - Ronny Santos - 07.jan.2017/ Folhapress
Guilherme Seto
São Paulo

João Doria (PSDB) foi prefeito por 460 dias de janeiro de 2017 a abril de 2018 e ficou devendo 1.000 dias para o eleitor paulistano quando abandonou o cargo para entrar na disputa pelo governo do estado de São Paulo.

Eleito como “gestor” na esteira da renovação que surgiu do cansaço dos eleitores com os velhos políticos, Doria deixou uma longa lista de projetos não realizados e uma série de metas não cumpridas.

Além disso, quebrou a promessa que fez ao menos 43 vezes de não deixar o comando municipal para participar de eleições. A prefeitura foi herdada por Bruno Covas (PSDB), que ainda não conseguiu resolver as pendências deixadas pelo antecessor.

Pedra angular do plano anunciado por Doria para a cidade, o grande pacote de privatizações e concessões até hoje não passou nenhum equipamento à iniciativa privada.

Durante a sua passagem pelo cargo, pouco se avançou para além das autorizações dos projetos pelos vereadores.

Após a saída de Doria, o Pacaembu esteve a um dia de ser concedido, mas foi travado pelo Tribunal de Contas do Município no último momento.

O pacote de parques também esteve perto de ser concedido, mas, em julho, o governador Márcio França (PSB), hoje rival de Doria no segundo turno das eleições, disse que não havia sido consultado pela prefeitura sobre a área do parque do Ibirapuera que pertence ao estado. 

França, então, obrigou a prefeitura a reformular toda sua estratégia, atrasando a concessão pelo menos até o começo de 2019.

Em setembro, a prefeitura conseguiu realizar seu primeiro leilão, mas o mercado de Santo Amaro não encontrou nenhuma empresa interessada em administrá-lo.

Uma das maiores derrotas políticas de Doria ocorreu às vésperas de deixar o cargo, quando vereadores engavetaram o projeto de reforma da Previdência da cidade.

O então prefeito se indispôs com os servidores, que fizeram greve por semanas para impedir que o projeto avançasse. No dia para o qual estava programada a votação, Doria anunciava que já tinha acordo com um número suficiente de vereadores para ter sucesso em sua empreitada.

No entanto, diante da pressão dos professores e demais funcionários públicos, os vereadores decidiram postergar as deliberações sobre a reforma, deixando Doria sozinho com o ônus de ter tentado passar uma impopular medida e fracassado. A gestão Covas planeja retomar o projeto após as eleições deste ano.

Somaram-se aos insucessos de impacto os números decepcionantes nas áreas de educação, transporte e zeladoria.

Doria prometeu zerar a fila para creches em um ano. Essa promessa depois foi ajustada para 65 mil vagas até março, mas só 27,5 mil foram criadas.

Obras em 12 CEUs foram interrompidas em 2016, no final da gestão de Fernando Haddad (PT), e permaneceram assim durante todo o período Doria. Covas as retomou no começo deste mês.

Nessa área, Doria conseguiu alguns avanços, como a criação do currículo municipal, o fim da fila da pré-escola e a revisão do programa Leve Leite.

No transporte, só entregou 3,3 km de corredores de ônibus, que começaram a ser construídos na gestão anterior. Ele também retirou do Orçamento ao menos R$ 716 milhões que seriam destinados aos corredores.

Durante a gestão Doria foi elaborado o edital do novo sistema de ônibus, com a proposta de mudar 25% das linhas da cidade —a maior alteração em 15 anos. Publicado em abril, já sob Covas, foi barrado pelo TCM e não saiu do papel.

Na mesma seara, o aumento dos limites de velocidade das marginais Tietê e Pinheiros, promessa de campanha de Doria, levou a crescimento no número de mortes, segundo balanço da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).

O então prefeito tentou projetar imagem de que deixaria a cidade mais limpa que Haddad, que, segundo ele, havia transformado São Paulo em “lixo vivo”. Doria chegou a vestir-se de gari para propagar essa ideia de mudança.

No entanto, a prefeitura varreu em 2017 menos toneladas de lixo que a gestão Haddad —92,8 mil toneladas, ante 95,8 mil no ano anterior e 111,5 mil em 2015. 

Há, ainda, heranças de Doria que, na avaliação da atual gestão, não foram positivas e estão sendo modificadas.

Doria tirou o status de secretaria da Controladoria Geral do Município logo que assumiu o cargo. A medida gerou apreensão diante da expectativa de que o órgão perdesse autonomia. Além disso, o tucano também mudou o nome das subsecretarias para prefeituras regionais.

Em agosto, Covas desfez as medidas, restaurando os órgãos aos estados anteriores.

Por fim, o atual prefeito estuda retirar o Carnaval de rua da avenida 23 de maio em 2019. A inclusão da via foi uma bandeira de Doria, que tinha a ambição de transformar o local em algo similar ao circuito festivo de Salvador.

Projetos de Doria derrubados por Covas

Controladoria Geral do Município: Criada na gestão Haddad, a CGM havia perdido o status de secretaria e estava sob o guarda-chuva da Secretaria de Justiça. Covas derrubou as medidas, implantadas na administração Doria, e vetou iniciativa da Câmara que visava enfraquecer o poder da CGM. O órgão foi responsável por investigar a máfia do ISS

Subprefeituras: Doria havia mudado o nome das subprefeituras para prefeituras regionais. Covas reverteu a decisão

Carnaval na av. 23 de Maio: Bandeira de Doria, a festa na avenida deve ser cancelada no próximo ano. A ideia do ex-prefeito era que o local se tornasse uma espécie de circuito com potencial comercial, como acontece em Salvador

 

​Doria diz que projetos dão resultado e que Covas tem autonomia

Em nota, a assessoria de imprensa de Doria afirma que o plano de desestatizações terá lançado, em dois anos, “mais editais de concessão e parcerias com o setor privado do que em qualquer outro momento da história da prefeitura”.

Segundo o ex-prefeito, a reforma da Previdência municipal é necessária e ele fez sua parte ao defender a responsabilidade fiscal da cidade. Ele acrescenta que respeita a autonomia da Câmara Municipal.

Sobre os CEUs, diz que “a retomada das obras foi possível graças ao uso racional dos recursos públicos feito desde o início da gestão Doria”. 

A respeito da fila de creches, destaca que, de janeiro de 2017 a junho de 2018, “ampliou 44.501 vagas em creches”. 

"Também não há mais fila para matrícula na pré-escola. Em 2017, com apenas cinco meses de gestão, a Secretaria de Educação universalizou o atendimento nesta faixa etária (4 e 5 anos). A fila, que era de 10.548 crianças em fevereiro de 2017, foi zerada em maio de 2017", completa.

O edital de ônibus barrado pelo TCM, de acordo com Doria, foi revisado e aperfeiçoado em relação ao elaborado pela gestão anterior.

Em relação às mortes nas marginais devido ao aumento de velocidade, defende que “não ficou demonstrada a relação entre esses fatores”.

"O Programa Marginal Segura foi além de readequar o limite de velocidade e implantou uma série de ações de segurança, sinalização e educação no trânsito para aumentar a segurança dos motoristas, pedestres, ciclistas e usuários do transporte público", completa.

Sobre a redução nas toneladas de lixo varridas, diz que não houve redução na frequência dos serviços de varrição”. "No investimento total dos atuais contratos há uma economia de cerca de 6% em relação ao anterior, sem qualquer alteração no plano de trabalho", argumenta.

Sobre as decisões que foram desfeitas por Covas, afirma que o atual prefeito tem autonomia para “definir mudanças de acordo com o momento".  "Confio que as decisões tomadas por ele são as melhores para a prefeitura", conclui.

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