Quando alguém chamava o nome de Antônio Ferreira da Silva, ele se aprontava e respondia: "eu mesmo, parente de Lampião!".
Junto com a música de Luiz Gonzaga, era essa identidade que o ligava a Garanhuns, de onde partiu aos 17 anos, fugindo da escola e deixando a família, sem olhar para trás.
Do agreste pernambucano, seu Antônio, que era quieto, lembrava do frio e de como sua família havia dado comida e abrigo ao bando de Lampião certa vez.
De carona em carona, chegou a São Paulo no começo de 1950. Achou um viaduto para dormir até encontrar trabalho, na primeira pavimentação da rodovia Anhanguera, e ter dinheiro para pagar um quarto de pensão.
Foi ainda garçom e pizzaiolo até achar a profissão que o ocuparia por quase 60 anos. Tornou-se um dos taxistas mais antigos da praça da República. Mesmo sem saber ler, nunca errava endereços e conhecia a cidade como a palma de sua mão.
Antes do volante, porém, enquanto servia mesas no Brás, passava os dias cuidando o horário em que uma morena de olhos azuis, cabelos pretos longos e cintura fina passava. Era Maria. Dez anos mais velha, a costureira filha de família italiana também se rendeu a ele --virou sua mulher por 68 anos e a mãe do seu filho.
Para os vizinhos no Tucuruvi, era conhecido por ser generoso, mão-aberta. Para as netas, comprava montes de sorvete e se entregava a horas de maquiagem e penteados criativos nos fios brancos.
"Ao mesmo tempo que ele era alguém endurecido pela vida, tinha esse lado de ser muito carinhoso", diz a neta Marcela Polo Minghetti Silva, 32. "Vou ter saudade do jeito que ele abraçava a gente."
No dia 13 de outubro, o coração de seu Antônio parou. Morreu um dia depois do 86º aniversário, que, como ele gostava de lembrar, era a mesma data em que se comemora o Dia das Crianças.
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