Advogado de João de Deus recorre à Justiça com pedido de liberdade para médium

Defesa do médium também criticou as investigações sobre seu cliente

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Goiânia

O advogado Alberto ​Toron apresentou nesta segunda-feira (17) à Justiça de Goiás um habeas corpus para libertar o médium João de Deus. Ele pede que a prisão seja revogada ou, alternativamente, que seu cliente seja transferido do regime fechado para o domiciliar.

Nesta hipótese, se deferido o pleito, o médium seria monitorado por tornozeleira eletrônica e teria de cumprir medidas cautelares, como afastar-se do local de trabalhos. Toron visitou o médium nesta segunda e disse que ele está abatido, mas bem. 

Suspeito de cometer abuso sexual de mulheres, o médium está preso desde a véspera no núcleo de custódia do complexo penitenciário de Aparecida de Goiânia. 

Toron considerou positivo o fato de seu cliente ter sido alojado numa cela com mais três pessoas. "Não sei se vocês sabem, mas ficar sozinho numa cela é talvez o pior castigo que se possa impor a um preso. O diretor [do presídio] teve o cuidado de deixá-lo com outros presos de nível superior. Ele está bem, os presos o tratam bem. Isso até o favorece em termos de um convívio mais ameno, menos duro", comentou.

A defesa de João de Deus também criticou nesta segunda (17) as investigações sobre seu cliente e disse que há em curso um processo intimidativo indevido, "talvez para ensejar novas denúncias e declarações" sobre supostos abusos sexuais.

Em nota, o advogado Alberto Toron contestou informações das apurações conduzidas pelo Ministério Público e a Polícia Civil de Goiás.

Ele afirmou que até agora há apenas a algumas poucas declarações, todas fornecidas pela Polícia Civil de Goiânia, e que, nelas, "não há qualquer referência à participação de terceiros nos fatos narrados". 

Nesta segunda, o MP sustentou haver indícios de que mais pessoas sabiam dos supostos abusos cometidos pelo médium. O número de relatos de abusos recebidos pelas promotorias até agora é de 506 precisamente.

As mulheres que alegam ser vítimas de João de Deus são de Ceará, Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Goiás, Distrito Federal, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Pernambuco, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Pará, Santa Catarina, Piauí e Maranhão. Do exterior, são seis países diferentes com denúncias coletadas: Alemanha, Austrália, Bélgica, Bolívia, Estados Unidos e Suíça.​

"Parece estar havendo um processo intimidativo indevido, talvez para ensejar novas denúncias e declarações", protestou Toron. 

Ele afirmou que a defesa esteve diversas vezes na sede do Ministério Público de Goiânia e, até agora, teve acesso a apenas um procedimento investigativo, "o qual, para surpresa da defesa, tem apenas cópia das matérias do Fantástico, sem cópia de nenhum dos inúmeros depoimentos que estão sendo divulgados pela imprensa". 

"A complexidade das suspeitas exige serenidade e tempo para que seja realizado um julgamento justo, imparcial e válido", comentou.

Toron também refutou as suspeitas de ocultação de valores e lavagem de dinheiro atribuídas ao médium em função de o Coaf (Conselho de Atividades Financeiras) ter detectado movimentação de R$ 35 milhões em suas contas. 

"Em primeiro lugar, o relatório do Coaf descreve o resgate de aplicações financeiras, não saque. Como sabem os promotores de Justiça, não se lava dinheiro limpo, não se lava dinheiro que é seu e estava no banco." 

O criminalista alega que nem sequer está claro se houve realmente movimentação nesse valor. "Pelo que a defesa teve conhecimento, apenas uma aplicação foi resgatada e em valores menores."

SOBRENATURAL

depoimento de João de Deus, 76, prestado na noite deste domingo (16) teve uma sequência de imprevistos que deixou os investigadores desconfiados. 

Na hora de o médium falar, segundo os presentes, o computador usado para registrar as alegações do preso parecia ter vida própria. "Você apertava uma tecla e ela OOOOOOOOO...", descreveu a delegada Karla Fernandes, coordenadora da força-tarefa responsável pelo caso na Polícia Civil.

Estava calor, e a própria delegada resolveu usar uma extensão para ligar o ar-condicionado. Segundo relata a investigadora, o fio explodiu e, de quebra, queimou o frigobar. "Todo mundo gritou dentro da sala."

A oitiva com o médium estava marcada para ocorrer em Anápolis, cidade próxima à capital goiana, mas um imprevisto tirou o escrivão de circulação. Ele foi atropelado na BR-060, a caminho da delegacia, e quebrou o braço.

O depoimento foi transferido para Goiânia. Foi possível domar o teclado, todos se recuperaram do susto e o interrogatório fluiu por mais de duas horas. Para a delegada, os episódios podem não ser só obra do acaso. "Estamos diante de uma situação que envolve crenças e energias."

Questionada se estava com medo, disse: "Não, mas tenho respeito, até porque sou espiritualista". Ela classifica João de Deus como um homem que tem, de fato, "um poder". "Mas houve um desvio no meio do caminho", disse a delegada.

MÉDIUM NEGA ABUSOS

No depoimento que prestou à polícia, o médium negou qualquer tipo de culpa nos abusos sexuais dos quais é suspeito, e sua defesa tentou desqualificar as denunciantes. "Ele não admite [envolvimento]. Apresenta suas versões e cabe à polícia provar", afirmou o delegado-geral da Polícia Civil de Goiás, André Fernandes, que acompanhou a oitiva.

O médium falou por mais de duas horas a duas delegadas. Segundo a delegada Karla Fernandes, ele respondeu a todas as perguntas e se recordou de alguns atendimentos feitos a mulheres que o denunciaram

O suspeito disse que a regra era recebê-las coletivamente, e não em recintos individuais, como consta dos relatos de supostas vítimas. 

O delegado espera concluir os inquéritos sobre violências relatadas por 15 mulheres em 15 dias, quando será tomada a decisão sobre eventuais indiciamentos. Por ora, os crimes em apuração são os de estupro e violação sexual mediante fraude (no caso específico usar a fé para obter sexo).

A delegada Karla disse que a prisão poderá aumentar o número de denúncias. Além dos 15 casos sob análise da polícia, o Ministério Público recebeu centenas de relatos de abusos. "Entendemos que, com a prisão, haverá o encorajamento de vítimas e isso pode levar a um aumento da procura", declarou.

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